Na tarde deste dia 9 de maio de 2025, o Conclave elegeu, em
seu segundo dia, o norte-americano Robert Francis Prevost como o 267° Papa da
Igreja Católica Apostólica Romana. Uma surpresa para os melhores vaticanistas,
que apostavam em nomes mais conservadores. O Cardeal Prevost não constava da
lista dos principais prováveis sucessores de Francisco. Eleito Papa, adotou o
nome de Leão XIV e tornou-se o primeiro papa americano e o primeiro
agostiniano.
Embora pouco conhecido nos meios eclesiástico, Prevost tem
um passado marcado por uma atuação pastoral significativa. Serviu como religioso
na América Latina, especialmente no Peru. Considerado jovem para o pontificado
(tem 69 anos), é também visto como um conciliador moderado e apoiador dos
princípios reformistas de Francisco.
Ouvi com atenção seu primeiro discurso na sacada da basílica
de São Pedro. Alguns pontos me chamaram muito a atenção pelo fato de serem
indicadores de como deverá ser seu pontificado. O primeiro deles foi o desejo
pela paz, num tempo em que o mundo enfrenta dois conflitos graves (a guerra da
Ucrânia e a destruição do povo palestino na guerra de Israel contra o Hamas),
além da ameaça de uma nova guerra de proporções mundiais. Ele frisou que deseja
uma paz “desarmada e desarmante”, na contramão da corrida armamentista das
nações do mundo.
O novo Papa também apontou seu desejo de dar continuidade à
construção do caminho da sinodalidade e de uma igreja de portas abertas, dois
legados de Francisco. O seu discurso lembrou bastante as orientações que
emanaram da Conferência Episcopal de Aparecida, em 2007, com a ênfase à ação
missionária, comprometida com as condições concretas de vida das comunidades
locais. Demonstrou claramente que deseja uma igreja que seja capaz de diálogo,
que construa pontes, e não muros, que esteja sempre próxima aos que sofrem.
Leão XIV também fez questão de afirmar sua condição de um
agostiniano, como “filho de Santo Agostinho”. O lema dessa ordem religiosa,
criada no século XIII, se baseia na declaração: “No Único, somos um só”,
expressão do ideal de ser uma igreja com um só coração e uma só alma, como a
Bíblia registra sobre a vida dos primeiros cristãos: “Da multidão dos que
creram, uma era a mente e um o coração [...]” (Atos 4.32). É bom ressaltar que
as regras de vida monástica escritas por Santo Agostinho enfatizavam a pobreza,
a comunhão, a oração e o silêncio.
O nome Leão não é uma escolha de pouca importância. Lembra o
pontificado de Leão XIII, no final do século XIX, quando foi estabelecida a
Doutrina Social da Igreja, com ênfase no bem comum, na solidariedade, na
Justiça e na dignidade da pessoa humana. Ao expor a proposta de uma sociedade
mais justa, a encíclica Rerum
Novarum rejeitou as doutrinas marxistas e condenou o capitalismo
explorador. Mas o nome lembra também o primeiro Leão, o Magno, no século V, que
ampliou o poder do Bispo de Roma e atuou para a afirmação da Cristologia ocidental
com base na teologia de Santo Agostinho.
Diante do cenário geopolítico mundial, não há como falar da
eleição de um papa americano sem mencionar a figura do atual presidente dos
Estados Unidos, Donald Trump. Leão XIV deixou implícito em sua fala que não
apoia a atual política norte-americana em relação aos imigrantes, à construção
de muros nas fronteiras e à imposição de barreiras tarifárias que afetam a
economia mundial. O novo Papa demonstrou que está muito mais próximo da
realidade latino-americana do que do imperialismo estadunidense.
É um sinal claro de que a Igreja de Roma se voltou para a
América Latina e que consolida a influência do Sul Global. Parte do seu
discurso foi em espanhol, inclusive. A teologia latino-americana já vem
ganhando força com o pontificado de Francisco, apontando para o cuidado da
criação e para a abertura aos mais vulneráveis. Que novos ventos soprem e
continuem a soprar para que tenhamos um cristianismo de mente e coração mais
abertos para as aflições humanas.