Miqueias foi um profeta que viveu cerca de 2 mil e 800 anos
antes de nós. Embora tenha vivido um tempo tão distante, ele testemunhou um
cenário de injustiça, de violação de direitos sobre a terra e do uso político
da religião para a exploração dos mais pobres que se parece muito com o que
acontece em nosso tempo.
A origem e a formação de Miqueias dão conta de que ele foi
um homem que experimentou na sua própria pele os efeitos daquilo que
testemunhou. Ele era um homem do campo, que viveu numa cidade interiorana e que
assistiu a muitos atos de injustiça e de exploração. Ele ouviu as histórias da
sua gente, seus relatos de fé, suas crenças, seus temores e esperanças. Foi o
que o ajudou a ter uma ideia clara do estado de coisas que a sociedade vivia.
Embora não tenhamos muita informação a respeito de sua vocação
profética ou até mesmo de sua trajetória de vida. Temos sua profecia, que nasce
de uma visão e que aponta para o curso da história. Por conta de sua
experiência com Deus e de sua vida comunitária com aqueles que creem, podemos
afirmar que Miqueias lançou um olhar sobre o mundo e sobre a vida como se Deus
mesmo estivesse vendo com os olhos do seu profeta.
Há três sentidos desse olhar. O primeiro é o sentido
histórico. Deus não está indiferente ao curso da história. Antes, ele lida com
a história humana a partir de dois princípios: o da liberdade, na medida em que
respeita as escolhas humanas, e o da responsabilidade, visto que Ele não age
como um controlador do tempo e das circunstâncias. Entretanto, Deus intervém
historicamente através da vida de seus profetas, de homens e mulheres a quem
usa para sinalizar sua justiça, graça, amor e misericórdia.
O segundo é o do comprometimento com os mais vulneráveis,
com as vítimas e com os espoliados, e não com os poderosos e vitoriosos. Deus
também levanta quem defenda a luta dos mais fracos, dos pobres deste mundo. Ele
conclama seu povo para ser a comunidade que está a serviço dos que sofrem
violência, exploração e perda de liberdade e direitos, daqueles que não têm voz.
O terceiro é o da esperança. Deus está cuidando do futuro da
criação. A obra da redenção tem uma finalidade, que é a de restaurar o que está
perdido. A esperança é esse princípio que orienta nossa fé e ação no mundo em
todo tempo, desde a esperança de superação do que nos causa dor até mesmo a
esperança de novos céus e nova terra.
Miqueias se levanta como um anunciador do Deus da vida, que
proclama libertação e esperança para todos e todas. Anunciar o Deus da vida é
proclamar justiça social, propor uma economia em que pobres e excluídos tenham
direito a uma vida digna, que luta em defesa da criação e que celebra a alegria
de viver de forma livre neste mundo.
Deus vê o mundo através dos olhares daqueles que sofrem. O
profeta precisava exercitar o seu olhar para ver o mundo como Deus vê. Ele
teria que ser o portador de uma mensagem de vida para aquela sociedade. Porém,
não poderia ignorar as causas das profundas desigualdades que havia nela. Da
mesma forma, não poderia deixar de declarar o que deveria acontecer para que os
rumos fossem corrigidos. Com Miqueias aprendemos como é possível marcarmos
nossa conduta de tal modo que não sejamos coniventes com aquilo que causa dor
no mundo.
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