domingo, 3 de maio de 2020

Cuidado com a família / Take care of your family / Cuida a tu familia


Em seu livro A casa e a rua, o antropólogo brasileiro Roberto DaMatta fala que há um “entre”. A casa e a rua são categorias sociológicas fundamentais onde construímos nossas relações sociais, morais e até espirituais. Não são apenas espaços geográficos, mas o lugar onde construímos nossa existência ética e cultural, onde desenvolvemos emoções e até uma estética que carregamos por toda a vida.
A casa é vista como o espaço do dever, enquanto a rua é o da liberdade. A casa corresponde à vida privada; já a rua é a esfera pública. A casa é sempre vista como um aprisionamento, lugar de reclusão, de sossego e de descanso, mas, por isso mesmo, um lugar seguro e protegido. A rua é o espaço da luta, da festa, do imprevisível, marcado pela insegurança e pela descoberta do novo. E a vida se constrói nesse entre casa e rua, entre o privado e o público, entre o que devo e o que posso, entre o permitido e o desejado.
A família vive essa tensão que envolve a circulação entre a casa e a rua. Ela é um espaço para se refugiar e para se realizar como pessoa, mas também para construir o sentido básico de vida em sociedade. Valores básicos e essenciais para a vida comum são primeiramente desenvolvidos na família, tais como o respeito, a tolerância, a generosidade, a gratidão, o perdão, o afeto e até mesmo a liberdade.
Frequentemente se diz que a família está sob ameaça, mas pouco ouvimos falar a respeito de onde vêm essas ameaças, quem são os principais responsáveis por ela. Talvez isso se deva ao fato de que os responsáveis por nossas famílias somos nós mesmos e que, muito acertadamente, somos também suas principais ameaças. Na medida em que somos dotados de necessidades e de fragilidades, nós também nos tornamos coparticipantes das deficiências e aspectos negativos que afetam a convivência familiar. Porém, somos também chamados para sermos cuidadores.
O modo com que cuidamos de nossa vida em família tem a ver com o nosso sistema de crenças e valores, com os nossos padrões de organização pessoal e até com os processos de comunicação que praticamos. Ou seja, a vida em família depende, em muito, da maneira como enfrentamos e resolvemos nossos problemas, da nossa flexibilidade em nos adaptarmos a diversas situações e da nossa capacidade de expressarmos opiniões e sentimentos. Tudo isso se reflete em nosso convívio em família, que são os nossos próximos mais próximos.
O autor de Provérbios diz que: Quem causa problemas à sua família herdará somente vento [...]” (Provérbios 11.29). Isso nos lembra uma relação de causa e efeito. A Bíblia está cheia de relatos de famílias que enfrentaram problemas causados por membros que agiram com insensatez, irresponsabilidade ou até mesmo por ignorância. Entretanto, ela nos mostra que enfrentar problemas em família não é o fim da linha. Há esperança para a família mesmo em meio aos conflitos que se enfrenta dentro dela.
Nesse tempo de quarentena e de isolamento social temos aprendido que a casa é o espaço mais seguro para estarmos e para exercermos cuidado uns dos outros, assim como encorajarmos uns aos outros. Esse tempo é de aprendizado mútuo, de nos conhecermos melhor e de construirmos relações mais sólidas.

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