sábado, 16 de janeiro de 2021

A essência da santidade: a profecia de Amós / The essence of holiness: Amos' prophecy / La esencia de la santidade: La profecía de Amós

 

“[...] A nação não suportará as suas palavras” (Amós 7.10) 

Amós foi um profeta divisor de águas no profetismo do Antigo Testamento. Sua profecia revela que Deus está ao lado dos mais pobres, das vítimas de uma sociedade injusta. Ele declara a santidade divina e conclama o povo de Israel a restaurar sua aliança com Deus. Essa é a essência da proposta de santidade: a proximidade a Deus restaura as nossas relações humanas.

Amós não era um profeta profissional e não pertencia a nenhuma ordem religiosa. Era um homem simples que vivia a realidade social do seu tempo. Ela sabia na prática dos problemas enfrentados pelas pessoas das classes dominadas, os trabalhadores e os mais pobres. Ele percebia as injustiças cometidas pelas autoridades religiosas, jurídicas e políticas. E ele verificava como as classes superiores ostentavam a riqueza obtida pela exploração dos mais pobres.

Amós não profetizou a partir dos palácios. Ele falou com base em sua vivência cotidiana. Esse é um novo modo de fazer profecia, que não se dá a partir da vida palaciana. Os governos de Judá e Israel experimentavam um período de expansão territorial e econômica, mas ao mesmo tempo se distanciavam das necessidades das populações mais carentes, retirando direitos dos trabalhadores e dos mais pobres. Ele enfrentou um poder político consolidado, forte e centralizador, que associava política e religião. Os ricos e poderosos desse tempo viviam uma religiosidade aparente, praticantes que eram de uma religião com um discurso que agradava à elite dominante. A religião era usada para justificar os atos de injustiça, de opressão e de extorsão.

A profecia de Amós denunciava a religiosidade hipócrita, a prosperidade social e econômica construída a custa dos mais pobres e a falta de justiça no cuidado com os direitos dos mais vulneráveis. Essa forma de profetizar propunha uma nova ética baseada no amor de Deus. Na sua mensagem, ele proclamou um Deus que se opõe ao sistema opressor dominante, que viola direitos, que cerceia a liberdade e oprime o outro. Esse Deus está disposto a destronar os poderosos, a aniquilar toda trama sórdida que destrói esperanças e permite toda sorte de pecados sociais. Amós declarou: “[...] Mas vocês transformaram o direito em veneno, e o fruto da justiça em amargura” (Amós 6.12).

Amós é o modelo de santo para esses tempos de avanço do neoliberalismo e das forças extremistas que tentam impor regimes de exceção, que viola direitos, que promove o ódio contra os opositores e pratica atos de preconceito e de injustiça. Milton Schwantes diz, em seu livro A terra não pode suportar suas palavras, que o modo de vida de Amós possui relevância sobre sua conduta como profeta. Ele era alguém que se sustentava com os recursos obtidos em seu próprio trabalho. “[...] Seu trabalho dá autenticidade a suas palavras. Entre o Amós trabalhador e sua profecia radical contra os totalitários deve haver uma relação. O trabalhador e o ‘profetizador’ se correlacionam, embora este não dependa daquele” (p. 43-44).

Por conta dessa relação entre modo de vida e conteúdo da mensagem, o povo foi lembrado que Deus não pede para que sejamos perfeitos. O que Ele espera de nós é que assumamos o risco de buscarmos uma vida mais justa e sejamos sinceros para reconhecermos nossos erros. O santo não é aquele que faz tudo de acordo com um paradigma moral que é imposto, mas que sabe que não dá para viver de forma tranquila quando sabemos que nosso próximo carece de dignidade, de alimento, de teto, de segurança e de trabalho.

Ser santo é saber quem é. Deus é santo porque Ele é o que é. E Ele nos chama para vivermos nossa humanidade perante ele como somos. A todo aquele que ouve seu chamado, Deus constitui como seu povo e Reino. O povo de Deus é chamado a reconhecer quem ele é: um povo separado para ser uma expressão de quem Deus é. Deus faz uma aliança com seu povo para uma vida santa no mundo.

Um povo santo precisa se dedicar mais à justiça social como expressão da santidade divina. O profeta anuncia que Deus tem lado, que é o do mais pobre. Como povo santo, cabe a si a tarefa de denunciar tudo aquilo que fere a dignidade humana e anunciar a bondade, a justiça e o amor de Deus pelas vítimas.

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