Um pensador que precisa ser lido e atualizado nesse tempo é Dietrich Bonhoeffer, teólogo alemão morto pelo nazismo. Principalmente porque sua teologia aponta para a ética. Ele considerava que somente pelo fato de saber que Deus se tornou humano é possível compreender e não desprezar o ser humano. Essa é a motivação para a formulação do conceito de ação responsável.
A ação responsável deve ser empreendida em nome destes seres humanos reais a quem Deus ama, e não para reivindicar sobre eles superioridade, retidão ou sabedoria própria. A ação responsável ganha agora alguma profundidade teológica. Não é simplesmente um gesto nobre de uma pessoa responsável, nem um serviço paternalista oferecido por alguém que faz o bem para aqueles que estão desprovidos de algo. A ação responsável é uma verdadeira imitação de Cristo, uma disposição de se tornar desprezado e de se colocar a serviço daqueles que por si mesmos se fizeram desprezíveis. A prontidão para a morte está presente em cada página do manuscrito, não como um ato da coragem pessoal, mas como uma afirmação teológica.
A ação responsável não é somente responsável perante Deus. É responsável naqueles lugares específicos onde a vida é moldada para uma sociedade inteira. Não se pode ser responsável por si mesmo, sem viver em solidariedade com pessoas que compartilham do mundo uns com os outros. Não se pode ser responsável somente por ser a igreja.
Bonhoeffer não estava preocupado em formular uma teologia a respeito da salvação. Os princípios protestantes de sola fide e sola gratia precisavam de uma realização concreta na vida cristã, uma vez que sua formulação ética consiste no fato de que vida cristã é vida para o outro. Para o pensamento de Lutero, a salvação do homem depende totalmente da atividade divina e não é condicionada, de modo algum por qualquer ação humana.
Nessa concepção, Deus tomou a iniciativa de restituir, por meio da obediência de Cristo, a humanidade a sua dignidade e imputou a justiça de Cristo aos que crêem. Ao contrário do pelagianismo, que defendia a necessidade de uma ação humana na justificação, a reforma protestante enfatiza que a salvação é um dom da graça de Deus que é comunicado ao homem. O perdão, a redenção, a salvação, a justificação, termos que caracterizam a experiência inicial cristã na teologia, são conferidos ao homem somente pela graça mediante a fé. Porém, a preocupação de Bonhoeffer não é desenvolver essa teologia, mas saber quais são as suas implicações para a vida cristã no mundo. Em sua Ética, ele vai indagar sobre o modo como Cristo toma forma no mundo através daqueles que passaram pela experiência da regeneração pela fé no próprio Cristo, conforme a concepção luterana. Essa preocupação começa com o Discipulado, quando aborda sobre o modo como se dá a conformidade de Cristo:
"Conseguir a conformidade da imagem de Jesus Cristo não é uma tarefa que consistisse na realização de uma imagem de Cristo que se nos exigisse. Não somos nós que nos transformamos em imagem de Cristo; é a própria imagem de Deus, a do próprio Cristo que quer se formar em nós (Gl 4.19). É a sua própria estatura que quer revelar-se através de nós. [...]
[...] Na encarnação de Cristo em forma humana, toda a humanidade reencontra a dignidade da semelhança de Deus. [...] Na comunhão com o encarnado é nos restituída a nossa verdadeira natureza humana. Somos arrancados do isolamento gerado pelo pecado, e devolvidos à humanidade toda" (BONHOEFFER, 1989, p. 191).
A prática da vida cristã pode ser aprendida somente sob os quatro mandatos divinos: família, trabalho, autoridade e igreja. Para Bonhoeffer, Deus colocou os seres humanos sob todos os quatro mandatos, não somente cada indivíduo sobre cada um ou outro, mas todas as pessoas sob todos os mandatos. Não pode haver um recuo, de um domínio “espiritual” para um domínio “mundano”. “Deixe a igreja ser a igreja”, então, como queria Karl Barth. Mas deixe também a família, o governo e as instituições econômicas e sociais que realizam a cultura serem eles mesmos.
A sociedade boa em termos teológicos não é, então, aquela que se conforma a este ou aquele padrão da legislação ou de organização econômica, mas a que se constitui em um lugar onde a pessoa possa ser responsável em todos os aspectos do mandato ao mesmo tempo. Um modo de reconhecer se um governo ou um sistema político está sendo conduzido de forma equivocada ou injusta é quando este tenta negar a autoridade dos outros mandatos, reivindicando toda a lealdade para si e redefinindo o critério de responsabilidade, de tal modo que a pessoa considerada responsável é aquela que serve ao estado ou ao partido político, traindo, assim, a família, a igreja ou a cultura.
(Extraído e adaptado de minha dissertação de Mestrado em Filosofia: Ética protestante e pós-modernidade)
A ação responsável deve ser empreendida em nome destes seres humanos reais a quem Deus ama, e não para reivindicar sobre eles superioridade, retidão ou sabedoria própria. A ação responsável ganha agora alguma profundidade teológica. Não é simplesmente um gesto nobre de uma pessoa responsável, nem um serviço paternalista oferecido por alguém que faz o bem para aqueles que estão desprovidos de algo. A ação responsável é uma verdadeira imitação de Cristo, uma disposição de se tornar desprezado e de se colocar a serviço daqueles que por si mesmos se fizeram desprezíveis. A prontidão para a morte está presente em cada página do manuscrito, não como um ato da coragem pessoal, mas como uma afirmação teológica.
A ação responsável não é somente responsável perante Deus. É responsável naqueles lugares específicos onde a vida é moldada para uma sociedade inteira. Não se pode ser responsável por si mesmo, sem viver em solidariedade com pessoas que compartilham do mundo uns com os outros. Não se pode ser responsável somente por ser a igreja.
Bonhoeffer não estava preocupado em formular uma teologia a respeito da salvação. Os princípios protestantes de sola fide e sola gratia precisavam de uma realização concreta na vida cristã, uma vez que sua formulação ética consiste no fato de que vida cristã é vida para o outro. Para o pensamento de Lutero, a salvação do homem depende totalmente da atividade divina e não é condicionada, de modo algum por qualquer ação humana.
Nessa concepção, Deus tomou a iniciativa de restituir, por meio da obediência de Cristo, a humanidade a sua dignidade e imputou a justiça de Cristo aos que crêem. Ao contrário do pelagianismo, que defendia a necessidade de uma ação humana na justificação, a reforma protestante enfatiza que a salvação é um dom da graça de Deus que é comunicado ao homem. O perdão, a redenção, a salvação, a justificação, termos que caracterizam a experiência inicial cristã na teologia, são conferidos ao homem somente pela graça mediante a fé. Porém, a preocupação de Bonhoeffer não é desenvolver essa teologia, mas saber quais são as suas implicações para a vida cristã no mundo. Em sua Ética, ele vai indagar sobre o modo como Cristo toma forma no mundo através daqueles que passaram pela experiência da regeneração pela fé no próprio Cristo, conforme a concepção luterana. Essa preocupação começa com o Discipulado, quando aborda sobre o modo como se dá a conformidade de Cristo:
"Conseguir a conformidade da imagem de Jesus Cristo não é uma tarefa que consistisse na realização de uma imagem de Cristo que se nos exigisse. Não somos nós que nos transformamos em imagem de Cristo; é a própria imagem de Deus, a do próprio Cristo que quer se formar em nós (Gl 4.19). É a sua própria estatura que quer revelar-se através de nós. [...]
[...] Na encarnação de Cristo em forma humana, toda a humanidade reencontra a dignidade da semelhança de Deus. [...] Na comunhão com o encarnado é nos restituída a nossa verdadeira natureza humana. Somos arrancados do isolamento gerado pelo pecado, e devolvidos à humanidade toda" (BONHOEFFER, 1989, p. 191).
A prática da vida cristã pode ser aprendida somente sob os quatro mandatos divinos: família, trabalho, autoridade e igreja. Para Bonhoeffer, Deus colocou os seres humanos sob todos os quatro mandatos, não somente cada indivíduo sobre cada um ou outro, mas todas as pessoas sob todos os mandatos. Não pode haver um recuo, de um domínio “espiritual” para um domínio “mundano”. “Deixe a igreja ser a igreja”, então, como queria Karl Barth. Mas deixe também a família, o governo e as instituições econômicas e sociais que realizam a cultura serem eles mesmos.
A sociedade boa em termos teológicos não é, então, aquela que se conforma a este ou aquele padrão da legislação ou de organização econômica, mas a que se constitui em um lugar onde a pessoa possa ser responsável em todos os aspectos do mandato ao mesmo tempo. Um modo de reconhecer se um governo ou um sistema político está sendo conduzido de forma equivocada ou injusta é quando este tenta negar a autoridade dos outros mandatos, reivindicando toda a lealdade para si e redefinindo o critério de responsabilidade, de tal modo que a pessoa considerada responsável é aquela que serve ao estado ou ao partido político, traindo, assim, a família, a igreja ou a cultura.
(Extraído e adaptado de minha dissertação de Mestrado em Filosofia: Ética protestante e pós-modernidade)
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