“Adorem ao Senhor com
temor; exultem com tremor.” Salmos 2.11
Abraão tinha tudo para se tornar uma
pessoa feliz. Estava seguro que fizera a vontade de Deus durante toda a sua
vida: atendeu ao chamado de sair da sua terra, conduziu sua família a
reconhecer o único Deus vivo e verdadeiro e ainda tinha o filho da promessa,
que faria de sua descendência uma grande nação. Porém, Deus quis colocá-lo à
prova mais uma vez ao requerer o sacrifício de Isaque.
O que Abraão mais temia era o que o
chamava a um confronto. O poder que era incompreensível e inevitável agora lhe
exigia algo que o desestabilizava emocionalmente. Ele estava dominado pela
crença em Deus como consolador e julgador ao mesmo tempo. O que estava em jogo
naquela prova de fé? Soren Kierkegaard compreendeu que Abraão tinha uma fé
somente para esta vida. Ele confiava que isso o ajudaria a envelhecer de forma
honrada junto ao que mais amava.
Uma fé que se limita às garantias do
bem-estar e da felicidade aqui e agora é destituída de propósito. Isso até pode
ajudar a ser o sujeito ético, admirado e louvado pelos outros, mas não é
suficiente para gerar mudanças significativas que coloquem em risco a nossa
própria condição diante de Deus. É uma fé sem temor.
Uma fé que não se abre a uma relação
marcada pelo despojamento de tudo que mais amamos também é destituída de
propósito. A fé que nos mantém apegados ao que nos dá segurança (sejam relacionamentos,
bens, certezas ou crenças) não gera transformação e não serve para nada. Não
abala nossas estruturas e não nos leva a agir. É uma fé sem tremor.
Somos pessoas em busca de significados e
isso nos conduz a uma experiência religiosa que comporta uma variação entre o
medo e a esperança, entre a reverência e euforia, entre o que dá segurança e o
que se abre a uma expectativa, entre o sofrimento e a cura, entre o amor e o
juízo, entre o bem-estar no presente e a felicidade futura, entre a vida dura
na terra e a glória celeste.
Paulo afirmou que a salvação é algo que
precisa se realizar em meio a essa variação entre o temor e o tremor, ou seja, que
leve em conta esse respeito e reverência diante daquele que tudo pode, bem como
as atitudes concretas de transformação da vida. É resultado de realização do
amor de Deus em nós de maneira que nos leva a agir por amor a Deus.
Para Kierkegaard, a fé é um paradoxo: “A
fé é a mais alta paixão de todo homem”, disse. Em relação a Abraão, seria um
paradoxo assassinar um filho para agradar a Deus. Contudo, a atitude de
obedecer a isso foi resultado da fé. Não há raciocínio lógico que justifique
tal ato. A fé que se realiza entre o temor e o tremor é o que liberta da angústia,
suscita a alegria em meio às lutas e o que nos dá coragem no meio do deserto.
Temer a Deus liberta a vida. Tremer diante de Deus é experimentar
transformações que nos ajudam a superar nossas fragilidades.
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