Para Paul Tillich, a realidade
que configura o movimento protestante está ligada a um dado poder, a um
dinamismo que perpassa esse acontecimento histórico, ao qual denominou de
“princípio protestante”. Diz ele, em A
Era Protestante: “O princípio protestante é o juiz de qualquer realidade
religiosa e cultural, incluindo a religião e a cultura que se chamem
‘protestantes’” (TILLICH, 1992, p. 183). E mais: “É o julgamento profético contra
o orgulho religioso, a arrogância eclesiástica, e a autossuficiência
secularizada com suas consequências destruidoras” (TILLICH, 1992, p. 183).
“O princípio protestante pode
ser proclamado por movimentos pertencentes tanto ao domínio religioso como ao
secular, mas sem qualquer filiação eclesiástica ou institucional, bem como por
grupos ou indivíduos que, por meio de símbolos cristãos ou protestantes, ou sem
eles, expressam a verdadeira situação humana em face do absoluto e do
incondicional. Se nessas situações proclamam-se e vive-se melhor e com mais
autoridade o princípio protestante do que nas igrejas oficiais, então é aí e
não nas igrejas que o protestantismo se torna vivo no mundo atual” (TILLICH,
1992, p. 221).
A realidade que envolve a
pluralidade da igreja protestante se apresenta de forma paradoxal na medida em
que contrasta com o discurso de afirmação da unidade da fé cristã e se lança
como um desafio para repensar os rumos do movimento nos dias atuais. Para
Tillich, “[no poder da cruz, a] igreja protestante haverá de se manter na
medida em que tiver consciência do significado de sua existência” (TILLICH,
1992, p. 216).
A própria dinâmica da proposta
inicial do protestantismo, de uma igreja em reforma, já é em si um projeto arriscado.
“A igreja protestante corre permanentemente o risco de se esquecer do seu
sentido. Sua grande tragédia tem sido a insistência em possuir a ‘pura
doutrina’, como se possuísse a verdade invulneravelmente” (TILLICH, 1992, p. 216).
Contudo, essa é a sua principal característica: comportar em si a pluralidade
que envolve a experiência de Deus no mundo.
“A Reforma deve continuar”,
disse certa vez Friedrich Schleiermacher ao se rebelar contra a mentalidade
dominante do protestantismo de sua época (apud
James Luther Adams In: TILLICH, 1992, p. 285). Os primeiros cinco séculos de
protestantismo – que Paul Tillich chamou de “era protestante” – foi marcado por
transformações e contradições. Começou com a Reforma dialogando com o
Humanismo, evoluiu através do diálogo com o pensamento liberal e o Iluminismo,
acompanhou o período da revolução industrial e a consolidação do capitalismo,
atravessou o século XX em meio a lutas e incertezas e chegou ao século XXI com
o desafio de repensar sua continuidade.
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