sábado, 17 de julho de 2010

Religiosidade e consumo / Religiosity and consumption / La religiosidad y el consumo

Um amigo compartilhou comigo o relatório O estado do mundo 2010, do Worldwatch Institute, lançado no Brasil pelo Instituto Akatu em 1º de julho deste ano. O fato que mais me chamou a atenção foi que o consumo cresceu seis vezes mais que a população nos últimos 50 anos. Para dar conta disso, o mundo extrai da natureza o equivalente a 112 Empires States por dia.
Isso significa que a natureza não dará conta desse consumo, uma vez que o uso dos recursos naturais está ultrapassando a capacidade que o planeta tem de provê-los. Achei também curioso que, para a solução do problema, o primeiro artigo apresenta a necessidade de mudança de mentalidade. E isso é muito mais uma questão de espiritualidade do que de qualquer outra área.
Logo no artigo seguinte – o segundo, portanto –, o documento aponta para o envolvimento das religiões nesse processo de mudança de mentalidade. Segundo Gary Gardner, o autor, de cada cinco habitantes do mundo, quatro pessoas professam uma religião e isso pode ser um grande fator de mudança, pois podem se tornar agentes na criação de novas culturas de sustentabilidade. Destaca-se o fato de que universidades de natureza confessionais têm se preocupado em formação que relacionem práticas religiosas e sustentabilidade, inclusive o surgimento de atividades religiosas voltadas para a defesa do meio ambiente, notadamente nas esferas da conservação da água, de preservação de florestas, da energia limpa e do clima.
Entretanto, o mesmo não se pode dizer no que diz respeito aos padrões de consumo. A maneira como as religiões tem tratado a questão do consumismo tem sido paradoxal: Embora elas tenham referencial teórico para abordar a questão, e sua ajuda seja extremamente necessária, o envolvimento religioso no consumismo está basicamente restrito a declarações ocasionais e exporádicas de líderes religiosos.
O que as religiões podem oferecer em termos de formação de uma cultura de sustentabilidade? O documento do Worldwatch Institute sugere algumas diretrizes: educação sobre meio ambiente; educação sobre consumo; educação sobre investimentos; expressão do sagrado na natureza durante as liturgias; resgate de valores tradicionais. “Ironicamente,” diz Gardner, “a maior contribuição que as religiões em todo o mundo poderiam fazer ao desafio da sustentabilidade seria a de levar a sério sua própria sabedoria antiga sobre materialismo.”
Ao analisar a maneira como a Igreja Católica, por exemplo, tem tratado a questão do paradigma contemporâneo de democracia, verifica-se que houve um caminho, desde o Papa Leão XXIII, para a compreensão de que o bem comum é a meta da sociedade. As encíclicas papais e documentos episcopais, bem como o Concílio Vaticano II, afirmam que as economias devem estar voltadas para servir ao bem comum e criticam o capitalismo desenfreado que enfatiza o lucro a todo custo, com ênfase na caridade e na justiça.
Mas tudo isso é pouco, ainda mais quando se verifica o crescente apelo dos movimentos carismáticos e neopentecostais de associar prosperidade espiritual com consumo em excesso. Num mundo que avalia seus gurus pela quantidade de bens que o mesmo possui, a solução ainda se encontra distante do paradigma religioso.

sexta-feira, 9 de julho de 2010

Espiritualidade e cultura de consumo / Spirituality and consumer culture / La espiritualidad y la cultura de consumo

As questões que envolvem cultura de consumo e sustentabilidade têm sido alvo de preocupações das entidades ligadas a meio ambiente e cuidado com o clima. Nas últimas décadas, o mundo tem experimentado mudanças de ordem estrutural que têm provocado, tanto no campo econômico quanto no social, uma transformação significativa, principalmente a partir de 1980.
As sociedades humanas são marcadas por sistemas culturais. O homem é moldado e refreado pela cultura e orienta suas ações de acordo com as normas, símbolos, valores e tradições que acompanham o seu desenvolvimento e sua vida em sociedade. É isso que faz com que a humanidade viva cada momento como sendo de profundas transformações. A sociedade contemporânea tem se caracterizado como uma sociedade consumista e isso tem afetado as relações humanas, o que nos permite falar em novos paradigmas da moral social.
Hoje, esperar que as pessoas que vivem em sociedades de consumo venham restringir o consumo é algo não imaginável e até utópico. Como seria possível viver sem carro, tecnologia, avião, conforto doméstico, ar condicionado, geladeira? E cada vez esses bens de consumo tornam-se mais sofisticados atendendo a uma demanda desenfreada. Esses chamados “luxos” fazem parte da vida das pessoas e estão cada vez mais presentes na cultura de consumo de todo o mundo.
Embora, seja uma característica da sociedade contemporânea, a cultura de consumo é resultado de séculos de desenvolvimento e que hoje é ampliada e difundida nos países emergentes. A preocupação com o quadro em que se encontra o mundo atual evidencia uma falta de cuidado com o conceito de sustentabilidade no comportamento consumista das sociedades, principalmente das ocidentais. Daí a ênfase que tem sido dada na necessidade de uma mudança radical nos padrões culturais de consumo dominantes. Uma nova atitude de rejeitar o consumismo e adotar uma nova consciência voltada para uma cultura de sustentabilidade.
Por consumismo, entende-se como uma orientação cultural que visa à busca de satisfação e de significado através da aquisição de bens e serviços de forma excessiva. A mudança no padrão de consumo atual envolve muito mais do que a adoção de novas tecnologias ou de políticas governamentais. O que se deseja é uma mudança de mentalidade que passa pelo abandono da lógica que fundou a sociedade da indústria de consumo – baseada em um domínio ilimitado do homem sobre a natureza – e que adote a consciência de que somos parte de uma totalidade complexa em que as coisas possuem valor em si mesmas e que dependemos delas para existir – o resgate do ideal franciscano. Uma consciência de sustentabilidade que atraia indivíduos, independente de suas convicções, a se filiarem a um ideal de lutar pela existência e assumam o compromisso de ser a comunidade daqueles que amam a natureza porque amam a Deus que a criou.

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