sábado, 3 de outubro de 2009

Ética cristã e pós-modernidade / Christian ethics and postmodernity / La ética cristiana y la postmodernidad

O maior desejo das pessoas, de um modo geral, é descobrir de que maneira é possível ser feliz. Para dar conta desse desejo pela vida feliz, surge um campo de saber que aponta para a busca do sentido da vida: é o campo da ética.
A fé cristã encontra-se diante do dilema característico da pós-modernidade. Por isso, a proposta para a reflexão ética nesse tempo não aponta para uma harmonização, mas para o conflito. A questão que se levanta é como se torna possível o diálogo entre a fé cristã e o mundo que aprendeu a viver sem a hipótese da existência de Deus.
A maneira como as pessoas orientam suas condutas brota de um desejo de encontrar explicações sobre o sentido da vida, sobre o que é bom e valioso para uma vida feliz.
A ética cristã, como um dessas reflexões sobre o caminho para a construção da felicidade, implica uma compreensão do homem enquanto ser que se relaciona com o mundo, consigo mesmo e com os outros. O principal problema do cristianismo não se restringe ao problema moral. Trata-se de uma questão ética profunda que diz respeito à maneira como se torna possível estabelecer o diálogo com um mundo arreligioso que chegou a sua maturidade. Como deve se dar o diálogo cristão com o mundo? Como se dá o discurso cristão diante das grandes questões humanas desse tempo? Como desenvolver a fé tendo em vista a questão da sustentabilidade? Qual o interesse da ética cristã em relação à bioética?
Este é o objetivo do livro Ética cristã e pós-modernidade: tomar parte de um processo de reflexão sobre a relevância da mensagem cristã para hoje, sobre como essa mesma mensagem pode fazer sentido nestes dias, principalmente no que diz respeito ao sentido da vida, à esperança de um mundo sustentável e ao tema da bioética. O livro, em sua primeira parte, analisa a dimensão da ética enquanto conhecimento humano e seu desenvolvimento como disciplina filosófica, bem como procura situar a ética cristã no contexto do pensamento humano.
Na segunda parte, procura-se apresentar uma alternativa para a reflexão ética no pensamento contemporâneo que serve como base para a construção de um diálogo entre fé cristã e mundo. Para tanto, foi escolhida a proposta do teólogo alemão Dietrich Bonhoeffer, morto pelo nazismo.
A terceira parte contém uma análise da pós-modernidade e procura entender de que maneira a mensagem cristã pode se fazer relevante em meio a um mundo fragmentado que aprendeu a construir sua compreensão da vida sem a hipótese Deus, principalmente no campo do diálogo com o mundo e das questões que envolvem sustentabilidade e bioética.

sexta-feira, 11 de setembro de 2009

Espiritualidade e aquecimento global / Spirituality and global warming / La espiritualidad y el calentamiento global

Os mais recentes relatórios que tratam do problema do aquecimento global apontam para o fato de que, caso não sejam tomadas atitudes radicais em favor da contenção das suas causas, a população mundial sofrerá por causa dos seus efeitos. A maior consequência disso é que, num futuro bem próximo, mais de um terço da humanidade não terá acesso à água por causa da urbanização maciça, a redução dos habitats animais e a concentração de rebanhos para a produção de alimentos. Esse quadro tende ainda a dar lugar a novas pandemias. Além disso, a escalada das mudanças climáticas não só afetará os padrões climáticos, como também influenciará a produção de alimentos e provocará até o desaparecimento de alguns estados. A perspectiva é que um contingente de mais da metade da população enfrentará mais violência e instabilidade social devido ao aumento do desemprego e à escassez de água, alimentos e energia.Quando o assunto é questão climática, não se trata mais de um problema social ou político, mas de definição do futuro e destino da vida humana. A compreensão é de que esse quadro dos efeitos do aquecimento global é resultado de decisões motivadas por atitudes ambiciosas e desonestas que têm afetado todos os campos da ação humana, sobretudo o da economia. É isso que tem levado à compreensão de que as soluções passam pelas relações de interdependência e pela ética. Temas como recessão global e aquecimento global estão inter-relacionados, pois têm uma causa comum. Muitos compreendem que se trata de uma oportunidade para inovar na geração de novas tecnologias ecologicamente corretas e reorientar a economia para colocar o mundo no caminho para um futuro melhor. São decisões de natureza política, que envolvem governos. Porém, o que se deseja é uma mudança de mentalidade que passa pelo abandono da lógica que fundou a sociedade da indústria de consumo – baseado em um domínio ilimitado do homem sobre a natureza – e que adote a consciência de que somos parte de uma totalidade complexa em que as coisas possuem valor em si mesmas e que dependemos delas para existir – o resgate do ideal franciscano. Uma ética da sustentabilidade atrai indivíduos, independente de suas convicções, a se filiarem a um ideal de lutar pela existência e assume o compromisso de ser a comunidade daqueles que amam a natureza porque amam a Deus que a criou.

quinta-feira, 10 de setembro de 2009

Espiritualidade e sustentabilidade / Spirituality and Sustainability / Espiritualidad y Sostenibilidad

A relação entre espiritualidade e sustentabilidade já foi apontada pela Carta da Terra: “Estamos diante de um momento crítico na história da Terra, numa época em que a humanidade deve escolher o seu futuro. [...] A escolha é nossa: formar uma aliança global para cuidar da Terra e uns dos outros, ou arriscar a nossa destruição e a da diversidade da vida.” A questão é: de que maneira podemos construir uma relação de fé que possa contribuir para somar forças em prol de uma luta universal pelo respeito à natureza e aos direitos humanos? Até que ponto somos responsáveis por isso?
O desafio que a Carta da Terra lança é constrangedor: “A escolha é nossa: formar uma aliança global para cuidar da Terra e uns dos outros, ou arriscar a nossa destruição e a da diversidade da vida.” Não é uma questão de afirmação, mas de escolha: “[...] decidir viver com um sentido de responsabilidade universal, identificando-nos com toda a comunidade terrestre bem como com nossa comunidade local.” Uma vez que somos parte de uma mesma “aldeia global”, para usar um termo de Marshal McLuhan, diz a carta que “necessitamos com urgência de uma visão de valores básicos para proporcionar um fundamento ético à emergente comunidade mundial”.
De que maneira isso é possível? A própria carta aponta o caminho: “Que o nosso tempo seja lembrado pelo despertar de uma nova reverência face à vida, pelo compromisso firme de alcançar a sustentabilidade, a intensificação da luta pela justiça e pela paz, e a alegre celebração da vida.” É nessa perspectiva que se encontra uma questão ética emergente.
Albert Schwitzer, no começo do século XX já havia comentado: “Até agora, o grande delito de todos os sistemas éticos é crer que só lhes concerne tratar da relação do homem para com o homem.” O caminho da sustentabilidade passa a ser uma necessidade para toda a humanidade nesse momento em que se pergunta sobre o seu futuro. Porém, não se pode negar que o cristianismo é um grande responsável pela mentalidade ecológica dominante que tem tratado da natureza de um modo devastador. Para a solução dos problemas ecológicos, ainda ressoa a crítica feita por Lynn White Jr.: “Pessoalmente duvido que nosso desastroso retrocesso ecológico possa ser evitado simplesmente pela aplicação de mais ciência e tecnologia a nossos problemas. [...] O que fazemos com a ecologia dependerá de nossas ideias sobre a relação homem-natureza.”
Para White Jr., a noção cristã de um Deus transcendente, separado da natureza, que se comunica com ela somente através da revelação, removeu o espírito da natureza, permitindo uma exploração mais fácil da mesma a partir de uma ideologia individualista e consumista. Toda a conquista tecnológica e científica é fruto de uma compreensão engendrada por um cristianismo arrogante que associa pecado a ignorância intelectual e entende o progresso como fruto do domínio ilimitado do homem sobre a natureza. Como justificativa de tal desastre, encontra-se uma perspectiva escatológica equivocada que condena a natureza a um fim catastrófico como resultado do juízo divino. Uma vez que a origem do problema está em uma compreensão religiosa, a solução, segundo White Jr., deve ser também religiosa.
O caminho que se pode vislumbrar está associado ao que se tem afirmado como sustentabilidade. “[Sustentabilidade é] suprir as necessidades da geração presente sem afetar a habilidade das gerações futuras de suprir as suas.” Esse conceito foi usado pela primeira vez em 1987 a partir de um relatório da Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento da ONU, conhecido pelo sugestivo título Nosso futuro comum. A preocupação é com o fato de que vivemos além de nossos recursos, de modo que a ênfase deve estar centralizada na atitude da geração atual tendo em vista a garantia de satisfação de nossas necessidades tanto agora quanto no futuro. Como afirmou o Papa João Paulo II em 1999, em seu discurso pela paz mundial: “Com efeito, a maneira mais segura de salvaguardar a criação consiste em pôr o bem-estar do ser humano no centro da solicitude pelo meio ambiente.”
Uma ética cristã que esteja comprometida com a sustentabilidade tem a ver com o modo como se entende a relação do homem com Deus. A garantia de um futuro feliz passa pela construção de um relacionamento com Deus em que o homem se reconhece como criatura. Tudo o que foi criado por Deus se reveste de um valor intrínseco, de tal modo que o valor que as coisas possuem está diretamente vinculado ao valor que atribuo para mim mesmo. O que as pessoas fazem no campo da ecologia depende do que se compreende a respeito de si mesmo e das relações que se estabelece com tudo à sua volta.

domingo, 26 de julho de 2009

Dimensão espiritual do medo / spiritual dimension of fear / dimensión espiritual del miedo

O medo é uma sensação natural própria de quem está vivo. Ele serve como um alerta para o organismo de algum perigo ou ameaça e provoca uma reação protetora. Sendo assim, todo mundo tem medo. Temos medo de tudo: de ser assaltado, de perder o emprego, da crise financeira, de terrorismo, de romper um relacionamento, de ser feliz, de ingerir gordura trans, de pegar gripe suína, de barata, de altura, de envelhecer, de solidão, de acidente aéreo. E o maior de todos os medos é o da morte. Isso é assim porque temos consciência de que um dia iremos morrer.
Ao contrário do que se possa pensar, o medo não é para ser vencido ou superado, mas para ser enfrentado. Uma das palavras que Jesus mais expressou foi “não temas”. Ele disse isso em várias circunstâncias. A ideia é de que não se deve permitir que o medo nos imobilize e impeça que tomemos as atitudes necessárias. O medo é uma força interior que orienta as nossas ações diante de grandes tormentas. Ele funciona como um dinamizador de nossas ações a fim de se enfrentar os desafios e superar as dificuldades. Os problemas precisam ser enfrentados, e isso não acontecerá sem medo, mas apesar do medo.
Esse é o sentido da coragem: a virtude de entender quem somos e, ainda assim, enfrentar os riscos de se atingir um objetivo maior. É uma forma de inteligência que nos ajuda a enfrentar o medo, a tomar decisões e a agir. Apesar da razão nos dizer o que devemos fazer, é a coragem que nos impulsiona a fazer. Ser corajoso não é viver sem medo nem ser ousado diante dos perigos, mas é colocar a vida em risco por uma causa que vale à pena ou mesmo tomar a decisão de se preservar. O covarde ou medroso é dependente de seu medo, mas o corajoso é aquele que orienta a sua ação entre a ousadia e a prudência. “A virtude de um homem livre se revela tão grande quanto ele evita os perigos, como quando os supera; ele escolhe com a mesma firmeza de alma, ou presença de espírito, a fuga ou o combate”, disse Espinosa.
O medo tem alcançado novas dimensões nesse tempo. Hoje, há o medo do fracasso. Em nossa cultura, aprendemos que temos o controle de nosso sucesso ou fracasso. Queremos ter o controle de tudo, do outro, dos resultados, das causas. O resultado disso é que a culpa ganhou um novo sentido, o medo de fracassar. Esse medo se justifica diante dos desafios e metas que traçamos para nós mesmos, quando nos perdemos em meio às exigências de superar as nossas deficiências em face da competitividade da vida. E é assim mesmo. As oportunidades não são iguais para todos e não há espaço para todos. Mas ninguém precisa se sentir inferior por isso. Quando o medo de fracassar impede a ação, temos aí um problema. Normalmente desenvolvemos pouca tolerância com o fracasso ou com situações adversas. Esse medo nada mais é que medo de sofrer e precisa ser enfrentado.
É isso que nos leva ao medo do futuro. Se temos medo do futuro é porque temos dificuldades de suportar o presente. Enquanto o presente é o objeto do nosso conhecimento, o futuro é o objeto de nossa esperança, assim como o passado é objeto de nossas lembranças. O presente é a realidade e o futuro é projeto, sonho, o imaginado. Enfrentar o medo no presente é a forma de encarar o futuro. Não se trata de uma superação amanhã ou depois, mas de vivenciar o agora.
Há o medo dos outros. É o sentimento que nos leva a construir muros, a classificar as pessoas entre boas e ruins, amigas ou inimigas, eleitas ou reprováveis, a adotar posturas defensivas ou agressivas, a desenvolver a desconfiança. É isso que provoca o isolamento. Nossa confiança no outro depende de nossa capacidade de perceber o caráter das pessoas. Nesse aspecto, temos a tendência de desconfiar sempre. Não damos a chance ao outro para que se aproxime até que se prove o contrário. Não que isso seja sem razão. É que as relações de amizade têm se tornado cada vez mais complicadas.
Há o medo de crescer. É o que faz a gente pular as etapas da vida. Isso prejudica o exercício do autoconhecimento, de saber quem é, de assumir responsabilidades. Em cada fase da vida temos medos que são muito próprios. Vagueamos durante a vida toda, segundo Erik Erikson, entre a confiança e a desconfiança, a autonomia e a dúvida, a iniciativa e a culpa, a construtividade e a inferioridade, a identidade e a confusão de papéis, a intimidade e o isolamento, a produtividade e a estagnação, a integridade e a desesperança.
Por fim, há o medo da mudança. Mas mudar é próprio dos seres vivos. É parte do processo da vida sair de uma condição que a gente domina para experimentar uma situação nova. O problema é que temos uma tendência de nos acomodar a uma situação que seja confortável. Estamos em busca de uma estabilidade e de certezas. E nos acostumamos em uma zona de conforto que só faz sentido para nós mesmos. Marina Colasanti disse: “A gente se acostuma para não se ralar na aspereza, para preservar a pele. Se acostuma para evitar feridas, sangramentos, para esquivar-se de faca e baioneta, para poupar o peito. A gente se acostuma para poupar a vida. Que aos poucos se gasta, e que, gasta de tanto acostumar, se perde de si mesma.”
Quando Jesus enfrentou uma situação de medo, ele tomou uma atitude: a oração. Diante do medo da morte, Jesus foi ao monte do Getsêmane para orar e criou um ambiente de oração a sua volta. Ele chamou três dos seus discípulos mais íntimos para orar, embora eles tenham dormido em todo o tempo. Dali ele saiu para suportar a traição, a tortura, o julgamento e a cruz. O que fazer diante de situações que provocam medo? Jesus Cristo é um grande exemplo de como enfrentar o medo.

sábado, 25 de julho de 2009

Max Lucado no Brasil / Max Lucado in Brazil / Max Lucado en Brazil


Fui ouvir Max Lucado na Igreja Batista do Recreio. Ele veio ao Brasil para lançar o livro Sem medo de viver. Não podia deixar de ir até lá, era a oportunidade que tinha de conhecê-lo, apertar a sua mão como gratidão pelo tanto que já abençoou a minha vida através de seus livros. Era o mais próximo que podia acontecer e não havia condições de perder.
Um ambiente acolhedor e o reencontro com amigos e pessoas da família deu o tom. Quase que ouvir Max Lucado se transformava em um pretexto para estar junto de pessoas queridas. Mas a noite tinha algo muito maior do que isso.
Leio os seus livros desde os primeiros lançamentos no Brasil. Nos momentos mais difíceis, foram seus textos que me serviram de conforto, estímulo e encorajamento. Poucos escritores sabem fazer o que ele faz: transformar em linguagem simples o que Deus sempre tem tentado nos dizer.
Lembro-me da fase mais difícil da minha vida, quando li Um amor que vale a pena. A vida estava difícil, me faltava dinheiro, tinha tantos livros do mestrado para ler, mas não podia deixar de faltar a leitura do seu mais recente livro. Emprestei aquele mesmo livro para alguém que estava passando por dias difíceis. E a gente descobriu junto que aquele que nos amava tanto não tinha desistido de nós e nos permitia construir uma relação de amor que valesse a pena. Hoje estamos casados.
O auditório estava superlotado. Uma turma inspirada promoveu instantes de profunda adoração que fez entender a todos que não seria ouvida a mera palavra de um escritor. Seria como escutar o sussurro de Deus a nos chamar a confiar mais nele e a entregar nossos temores em suas mãos. Ao final, muitas pessoas movidas por um sentimento de busca de algo mais profundo oravam com avidez, acolhidas pelas dezenas de pastores que também ali compareceram.
A igreja estava em estado de graça. Eu estava radiante. O jovem representante da editora mais ainda. Na fila para os autógrafos, os reencontros, os abraços. Na hora do autógrafo para mim, a oportunidade de um abraço afetuoso em quem marcou tanto a minha vida. Como se fosse a um irmão chegado.
Saí dali com a alma lavada. Pensei no quanto Deus precisa de pessoas assim, que transforme em linguagem simples e compreensível a mensagem que nos ajuda a viver do modo como Deus planejou, pessoas que nos ajudem a entender o que faz a vida ter sentido e a perder o medo de viver.

sexta-feira, 24 de julho de 2009

Excelência no ministério pastoral / Excellence in pastoral ministry / Excelencia en el ministerio pastoral

Acabei de preparar o livro de um grande amigo, o pastor Vanderlei Batista Marins. Chama-se Excelência no Ministério Pastoral, lançado pela editora Epígrafe.
O livro é uma reflexão sobre o exercício da função de pastor, que passa por uma fase de descrédito na sociedade em que vivemos. Enquanto preparava os originais para a publicação, lembrei-me da experiência de Spurgeon, famoso pastor e grande pregador inglês do século XIX, que, quando alguns de seus amigos tentaram promover a sua participação em um cargo político, declarou que, mesmo que se tornasse o rei da Inglaterra, esse seria um cargo inferior ao que exercia.
A função pastoral tem a ver com o cuidado de pessoas. Esse livro procura apresentar mais do que conceitos. São convicções de alguém que tem exercido o pastorado de forma intensa, não somente cuidando de pessoas, mas também gerenciando um conjunto de ações ligadas à vida de sua comunidade.
Ser pastor é algo que se reveste de grande expressividade para a vida daqueles que exercem essa função. Exatamente pelo fato de que o pastorado está relacionado a uma experiência pessoal de ter recebido um chamado especial de Deus. A vida do pastor transita entre o cortejo e a solidão, da popularidade à rejeição. Entender isso ajuda a valorizar tantas pessoas que atuam anonimamente como pastores e permite reconhecer qual o sentido de exercer o pastorado de maneira autêntica, mesmo nos dias atuais.
O autor é pastor em uma grande igreja e líder de expressividade na denominação a que pertence. Essas, ao lado de sua titularidade, são as credenciais para assumir o significado de exercer essa função num contexto pós-moderno. O grande destaque está no fato de que a vida do pastor está a serviço de uma comunidade e de um ideal. Por causa disso, é marcada muitas vezes pela rejeição e pela incompreensão.
A função pastoral envolve a proclamação de uma mensagem que desperte o interesse de um relacionamento com Deus, que seja vivenciada no contexto de uma comunidade. Ainda que para isso sua vida precise transitar entre o elogio e a solidão, seu compromisso está acima até de necessidades e interesses pessoais, quando o ministério pastoral é exercido de forma digna.
Num tempo em que a função está tão prejudicada pela atuação de muitos que a ocupam de forma equivocada, este livro tenta resgatar o sentido de ser pastor. Pastores com tais características não só são necessários, são imprescindíveis.

quarta-feira, 22 de julho de 2009

Viver é correr riscos / Living is take risks / La vida es asumir riesgos

Danuza Leão certa vez disse que “a vida é difícil; para não correr nenhum tipo de risco, o lance é aprender a trancar o coração, o que, aliás, nem é tão difícil assim.” Viver é correr riscos. O tempo todo, para todo mundo, sem exceções. Deus mesmo deu o exemplo quando preferiu correr o risco de conceder ao homem a liberdade de escolher e, assim, pudéssemos fazer a opção de amá-lo como expressão da nossa vontade e não como marionetes. Jesus também correu o risco de enfrentar a cruz e a morte, para oferecer a salvação a todo o que crê.
Se quisermos uma mudança de fato na vida, precisamos correr o risco de andar com Deus e construir a nossa história de acordo com os propósitos de Deus. Você precisa conhecer expressões de Jesus que confrontaram seus ouvintes com decisões que apontavam para mudanças radicais.
Corra o risco de amar. Para C.S. Lewis, “não existe investimento seguro. Amar é ser vulnerável... Ame qualquer coisa e seu coração irá certamente ser expremido e possivelmente partido. Se quiser ter certeza de mantê-lo intacto, não deve dá-lo a ninguém... Evite todos os envolvimentos, feche-o com segurança no esquife ou no caixão de seu egoísmo. Mas nesse esquife seguro, sombrio, imóvel, sufocante, ele irá mudar. Não será quebrado, mas vai se tornar inquebrável, impenetrável, irredimível... O único lugar fora do céu onde você pode se manter perfeitamente seguro contra todos os perigos e perturbações do amor é o inferno.” Foi por isso que Jesus disse: “Vocês ouviram o que foi dito: ‘Ame o seu próximo e odeie o seu inimigo’. Mas eu lhes digo: Amem os seus inimigos e orem por aqueles que os perseguem, para que vocês venham a ser filhos de seu Pai que está nos céus. Porque ele faz raiar o seu sol sobre maus e bons e derrama chuva sobre justos e injustos. Se vocês amarem aqueles que os amam, que recompensa vocês receberão? Até os publicanos fazem isso!” Mateus 5.43-46.
Corra o risco de perdoar. Lembra-se da pergunta de Pedro a Jesus? “‘Senhor, quantas vezes deverei perdoar a meu irmão quando ele pecar contra mim? Até sete vezes?’Jesus respondeu: ‘Eu lhe digo: Não até sete, mas até setenta vezes sete’”. Mateus 18.21-22.
Corra o risco de caminhar com Deus. Isso também não é fácil ou simples. Até os discípulos tiveram dúvidas. “Ao ouvirem isso, os discípulos ficaram perplexos e perguntaram: ‘Neste caso, quem pode ser salvo?’ Jesus olhou para eles e respondeu: ‘Para o homem é impossível, mas para Deus todas as coisas são possíveis’. Então Pedro lhe respondeu: ‘Nós deixamos tudo para seguir-te! Que será de nós?’ Jesus lhes disse: ‘Digo-lhes a verdade: Por ocasião da regeneração de todas as coisas, quando o Filho do homem se assentar em seu trono glorioso, vocês que me seguiram também se assentarão em doze tronos, para julgar as doze tribos de Israel. E todos os que tiverem deixado casas, irmãos, irmãs, pai, mãe, filhos ou campos, por minha causa, receberão cem vezes mais e herdarão a vida eterna. Contudo, muitos primeiros serão últimos, e muitos últimos serão primeiros’”. Mateus 19.25-30.
Corra o risco de renunciar ao eu. Esse é o grande desafio da fé. Lembrando uma poesia de Clarice Lispector: “Só o que está morto não muda! / Repito por pura alegria de viver: / A salvação é pelo risco, / Sem o qual a vida não vale a pena!!!” Jesus disse: “Quem ama seu pai ou sua mãe mais do que a mim não é digno de mim; quem ama seu filho ou sua filha mais do que a mim não é digno de mim; e quem não toma a sua cruz e não me segue, não é digno de mim. Quem acha a sua vida a perderá, e quem perde a sua vida por minha causa a encontrará”. Mateus 10.37-39.
Corra o risco de entregar a vida inteira para Deus. O chamado de Jesus tem exigências muito difíceis, mas ao mesmo tempo abençoadoras: “Entrem pela porta estreita, pois larga é a porta e amplo o caminho que leva à perdição, e são muitos os que entram por ela. Como é estreita a porta, e apertado o caminho que leva à vida! São poucos os que a encontram”. Mateus 7.13-14.
Para terminar, anote essa recomendação atribuída a Sêneca, que viveu entre os anos 55 a.C. e 39 d.C.:“Rir é correr o risco de parecer tolo. Chorar é correr o risco de parecer sentimental. Estender a mão é correr o risco de se envolver. Expor seus sentimentos é correr o risco de mostrar seu verdadeiro eu. Defender seus sonhos e idéias diante da multidão é correr o risco de perder as pessoas. Amar é correr o risco de não ser correspondido. Viver é correr o risco de morrer. Confiar é correr o risco de se decepcionar. Tentar é correr o risco de fracassar. Mas devemos correr riscos, porque o maior perigo é não arriscar nada. Há pessoas que não correm nenhum risco, não fazem nada, não têm nada e não são nada. Elas podem até evitar sofrimentos e desilusões, mas não conseguem nada, não sentem nada, não mudam, não crescem, não amam, não vivem. Acorrentadas por suas atitudes, elas viram escravas, privam-se de sua liberdade. Somente a pessoa que corre riscos é livre!”

quinta-feira, 16 de julho de 2009

Como dizer a Deus que você o ama / How do you say to God that loves him? / ¿Cómo se dice a Dios que lo ama?

A essência da vida cristã consiste, na verdade, em um caso de amor. A Bíblia diz que fomos criados para sermos amados por Deus. Somos, de fato, objetos do amor de Deus. Por isso que ele deseja se relacionar conosco.
Sendo assim, a coisa mais importante que temos a fazer é retribuir o amor que ele tem por nós. Foi isso que Jesus propôs: “Ame o Senhor, o seu Deus de todo o seu coração, de toda a sua alma e de todo o seu entendimento’ Este é o primeiro e maior mandamento.” Mateus 22:37-38.
Como em toda a relação amorosa, expressamos nosso amor a Deus através de expressões bem simples, como o simples gesto de dizer “eu te amo”, até mesmo à atitude de dedicar a vida inteira para ele. O problema é que tem se tornado cada vez mais difícil aferir o quanto amamos alguém ou o quanto somos amados. Até mesmo tem sido cada vez mais difícil expressar isso através de palavras. Algumas vezes sentimos que amamos, mas não sabemos como expressar, como dizer.
Quero sugerir algumas maneiras para você expressar seu amor a Deus. A primeira delas tem a ver com comunicação. Foi preciso que eu passasse por uma séria ruptura em minha vida conjugal para entender que casamento é comunicação. Quanto mais profunda e consistente for a comunicação, mais o relacionamento cresce. Quando a comunicação falha, o relacionamento enfraquece. É assim porque a vida é dinâmica demais. Quanto mais significativo for o seu diálogo, seu processo de comunicação – seja com Deus, cônjuge, amigos, grupo – mais o seu relacionamento cresce. E o inverso também é verdadeiro. Quanto mais você se descuida, mais enfraquece.
Quando você ama alguém, não basta passar um tempo ao seu lado. Quando comecei a namorar a minha esposa, gastávamos horas ao telefone. Hoje, precisamos muito conversar. Isso nutre a nossa relação. Você acha que com Deus deveria ser diferente? Se ele é alguém que você ama, você precisa conversar sobre tudo com ele, seus problemas, suas expectativas, seus medos, suas ansiedades, as coisas das quais você tem orgulho, as coisas das quais você tem vergonha... Veja o que o salmista disse sobre sua conversa com Deus: "Eu amo o Senhor, porque ele me ouviu quando lhe fiz a minha súplica. Ele inclinou os seus ouvidos para mim; eu o invocarei toda a minha vida.” Salmo 116.1-2.
Isso é o que poderíamos chamar de oração. Mas oração não é apenas um dever religioso. É uma conversa com alguém que nos ama profundamente, que nos entende e nos aceita como somos. Alguém que está muito interessado em nos ouvir e que nos convida a conversar com ele.

quarta-feira, 8 de julho de 2009

Transformado pela glória divina / transformed by divine glory / transformado por la gloria divina

Uma das características da ação de Deus que a Bíblia apresenta é que ele se manifesta em glória. Ter contato com a glória divina traz consequências inesquecíveis. Paulo teve o seu primeiro contato com o esplendor da presença de Deus no caminho de Damasco. A Bíblia registra esse fato assim: “Seguindo ele estrada fora, ao aproximar-se de Damasco, subitamente uma luz do céu brilhou ao seu redor” (Atos 9.3)
Até então, Paulo tinha sido um religioso sincero, crente que estava agradando a Deus ao perseguir cristãos por causa de seu zelo. Em sua formação, ouviu falar muitas vezes do Deus que se manifesta em glória. A história de seu povo foi marcada por inúmeras manifestações da glória divina. Homens foram transformados pela manifestação majestosa de um Deus presente e se tornaram grandes instrumentos de mudanças na vida nacional. Ele ouviu falar muitas vezes da promessa de que um dia essa glória tão falada seria vista de forma real, encarnada.
Mas ele ainda não tinha experimentado o que João também já havia testificado: “e vimos a sua glória como a glória do unigênito do Pai, cheio de graça e de verdade” (João 1.14). Paulo, naquela ocasião conhecido como Saulo, precisava ter um encontro real com o Senhor da glória, o que acabou por acontecer no caminho de Damasco. O homem que era chamado “grande” – esse era o sentido hebraico do seu nome – foi surpreendido pela glória divina. O tamanho do tombo foi proporcionalmente inverso ao tamanho de sua arrogância. Prostrado ao chão, ouve o chamado divino que o intimava a servir e a testemunhar de Jesus Cristo.
Veja o que Paulo disse sobre aquela experiência com Deus: “[...] não fui desobediente à visão celestial” (Atos 26.19). Assumiu o custo de uma vida transformada por Cristo, rendida totalmente ao Senhor. Vida que não tem nada de preciosa a não ser quando a serviço de Jesus. Vida que só tem sentido quando é vivida na fé do Filho de Deus. Vida que se completa em Cristo. Vida que se gasta no bom combate, no cumprimento da carreira e no guardar a fé.
Você pode se lembrar quando foi que teve o contato com o primeiro vislumbre da glória divina? Para Paulo, foi o dia da sua conversão, que foi também o mesmo dia de sua chamada para servir. Para você, pode ser ainda hoje, a partir do momento que você se der conta que a sua vida só terá algum significado quando estiver totalmente transformada por ter um primeiro contato com a glória de Deus.

segunda-feira, 6 de julho de 2009

Como ter relacionamentos saudáveis / How to have healthy relationships / ¿Cómo tener relaciones sanas?

Quero sugerir três ingredientes para que possamos avaliar o quanto estamos envolvidos na tarefa de estabelecer relacionamentos saudáveis. O primeiro diz respeito à restauração de nossa dignidade como seres humanos. Temos muito valor para Deus e o que impede que compreendamos isso de forma adequada tem a ver com o pecado. Podemos ter ideias equivocadas a respeito de nós mesmos por causa do pecado. Podemos ir de um extremo ao outro atribuindo a nós mesmos um valor mais elevado ou muito inferior ao que de fato representamos para Deus.
O nosso valor para Deus pode ser medido pelo amor que ele demonstrou ao enviar Jesus. O quanto Deus nos ama? O suficiente para aniquilar-se a si mesmo, tomar a forma de servo, ser obediente até a morte, suportar a cruz e romper os limites da vida para nos alcançar. Deus realizou essa obra para restaurar a dignidade de sermos humanos.
A maior expressão de nossa condição humana é a capacidade que temos de dar e receber relacionamentos. Isso está bem no âmago de nossa personalidade. O problema é que estamos perdidos, desorientados e cegos. José Saramago, em seu Ensaio sobre a cegueira fala da maneira como estamos enganados sobre a nossa condição. Ele chega a dizer que se pudéssemos realmente ver a perdição em que estamos envolvidos desejaríamos ser verdadeiramente cegos.
O segundo é descobrir que somos aceitos por alguém. Jesus descobriu coisas boas em meio às ruins. Apesar de estarmos perdidos, ele vem ao nosso encontro. Ele nos ama como nós somos, mas se recusa a nos deixar do mesmo jeito. Ele quer sejamos exatamente como ele é. O mais importante é que ele nos dá o curso de uma vida inteira para construir o seu caráter em nós. E mesmo que venhamos falhar nessa tentativa, ele não nos rejeita.
E o terceiro é celebrar a alegria de sermos alcançados pela graça. Existem duas razões para que haja uma grande festa quando somos alcançados pela graça. A primeira é a alegria da chegada. O retorno ao lar é um motivo de grande recompensa. Não há nada mais gratificante para um sequestrado do que a alegria de ser encontrado e restituído à convivência das pessoas mais queridas. A segunda é a alegria da entrega. Deus vê o quanto a gente sofre por viver um engano. Nossa atitude se assemelha muito mais a um menino teimoso que não quer aceitar o conselho de seus pais para que faça a escolha pelo que é melhor para a sua vida. A Bíblia diz que Deus observa a humanidade de forma muito atenta de tal forma que chega a gemer em Espírito por causa dessa atitude humana. Mas quando alguém se rende e se quebranta diante dele, há grande manifestação de alegria.

sexta-feira, 3 de julho de 2009

Dawkins na Flip / Dawkins on Flip / Dawkins en Flip

Li a reportagem sobre a visita de Richard Dawkins ao Brasil, na Feira Literária Internacional de Paraty. Senti-me identificado com uma das expressões de sua fala: “É um desperdício terrível viver a sua vida pensando no que vem depois (...) Não desperdice a única vida que você tem.” Esse é o ponto em que penso ser o centro da questão humana. Dawkins é um biólogo e o maior equívoco de toda a ciência natural é acreditar que uma ciência por si só pode dar conta de toda a condição humana.
É exatamente por isso que somos humanos. O que nos humaniza não é apenas uma vida transitória, ainda que parta de um processo vital, reprodutivo e evolutivo, mas que tem apenas começo, meio e fim. A grande luta de toda a humanidade é a superação de sua própria finitude. A religião é uma das muitas tentativas dessa superação. Procura-se fazer isso através da busca de sentido.
O problema não é esperar pelo que vem depois, mas é passar uma vida inteira sem a perspectiva de que sua vida vai além de um processo finalístico. Tenho para mim que a vida termina de fato quando ninguém mais se lembra de quem você foi, quais as marcas que você deixou durante sua existência, o quanto a sua personalidade contribuiu decisivamente para a melhoria da humanidade.
Imagino que uma vida que se limita pela finitude é centrada tão somente no eu, na expressão do indivíduo que precisa tirar o melhor proveito para si, uma vez que essa é a sua única chance. Ao contrário, de fato só temos essa vida, mas que não se limita a uma expressão biológica, terrena. Uma vida que não é só “bio” e que não é baseada numa lógica natural.
Preciso agradecer a Dawkins por ter lido isso. De fato, em termos biológicos, sua especialidade, a vida-bio não passa de um complexo processo químico-orgânico que tem começo, meio e fim. Isso é tão lógico que chega a ser terrível. O homem é mais do que isso, é um animal em busca de significados, que luta para não ser só “bio”. Verdadeiro desperdício é passar por essa experiência biológica inteira sem ter encontrado sentido e sem ter descoberto o valor de existir. Viver assim é viver perdido de si mesmo, do valor mais intrínseco que a vida humana tem. Valor esse que ficou perdido em algum lugar escondido de nossa alma.
Por isso que Jesus Cristo veio trazer um sentido para a vida, o sentido de vida eterna, uma vida que não se esgota em meio a esse caos de nossa perdição. Uma vida que salte para além da vida, que se constitui no agora e no ainda não, que é marcada por realização e esperança, de conquistas e expectativas.
Faz-me lembrar que a Bíblia diz que aqueles que têm uma expectativa somente para esta vida são os mais miseráveis de todos os homens. São aqueles que não levam em consideração que a vida também é delírio e devaneio. Em absoluto, não dá para olhar para a complexidade da vida humana e simplesmente acreditar que não faça parte de um processo muito mais amplo, que a nossa mera razão não consegue alcançar. Não dá pra deixar de acreditar que haja um projeto divino para resgatar o nosso valor como humanos e nos traga de volta para a nossa dignidade. Até porque penso que a descrença nada mais é do que a tentiva de ter o controle e buscar superar algo que está além de nós mesmos. E o mais legal é que, nesse campo, a vida e a mensagem de Cristo fazem todo sentido.
Você tem razão, Dawkins. E por favor, não desperdice a única e preciosa vida que você tem.

domingo, 28 de junho de 2009

O cuidado com o outro / The care with other / El cuidado con otros

O mesmo poder que Jesus operou ao cuidar de vidas e transformá-las está a nossa disposição para que possamos fazer o mesmo com outros. Jesus não só foi um mestre em fazer conexões, mas nos chamou para tomar parte dessa tarefa com ele. E a maior descoberta que podemos fazer é a de que pessoas comuns como nós somos têm um poder extraordinário para transformar a vida dos outros.
Esse poder está no encontro daquilo que a gente tem de melhor na nossa personalidade com aquilo que está nos recantos mais íntimos da vida do outro e ali faz diferença, influenciando vida.
A capacidade para mudar a vida de uma pessoa não está nos conselhos que damos nem nas nossas boas intenções em ajudar, mas está em algo que une duas pessoas na experiência de partilhar vida.
As causas de todas as nossas dificuldades emocionais e de relacionamento está na falta dessa ponte que nos une ao outro. Isso nos impede de receber vida e de transbordar para o outro a vida que há em nós.
Uma pessoa que sabe fazer conexões é alguém que assume para si esse movimento expressivo e significativo na direção do outro. Pessoas conectadas acreditam no que o outro pode vir a ser porque acreditam que há algo de bom e de divino nela que precisa ser restaurado. Pessoas conectadas aceitam o desafio de partilhar com o outro a vida que experimentam.
Normalmente, na relação com o outro, somos tentados a assumir uma atitude moralista que tenta estabelecer controles do que é certo e errado, do que pode e do que não pode. De um lado, assumimos o papel de exortar e cobrar atitudes; de outro, agimos na tentativa de adaptar a uma situação que seja confortável. A consequência disso é tremendamente desastrosa e nociva. Isso desperta sentimentos de culpa, de vergonha, de ameaça, de medo, de manipulação.
A minha preocupação é que possamos assumir um compromisso de nos constituirmos como uma comunidade terapêutica que sabe inovar no cuidado com o outro. Podemos encontrar sugestões para isso na parábola que Jesus contou sobre a ovelha perdida. Ela se encontra registrada em Lucas 15.1-7. O guardador de rebanhos tinha 100 ovelhas, mas uma se perdeu no meio do caminho.
Quando Jesus contou essa parábola, ele estava sendo acusado de se unir a pecadores. A história que ele contou apresenta o que pode acontecer quando estabelecemos conexões que sejam significativas e restauradoras de vida: aquilo que estava perdido – nosso valor mais intrínseco, nossa dignidade como pessoas – pode ser resgatado.
O sentido de estarmos perdidos para Deus é que estamos perdidos de nós mesmos. E o grande sentido do resgate de Deus é que ele vem ao nosso encontro para restaurar aquilo que há de melhor em nós e que ficou escondido em algum lugar secreto, para sermos exatamente aquilo para o qual ele mesmo nos criou. É esse gesto de Deus que está ao nosso alcance. Pessoas que agem assim não só são necessárias. São imprescindíveis

sexta-feira, 26 de junho de 2009

A maior flor do mundo / The largest flower in the world / la flor más grande del mundo

Baseado em um conto de José Saramago. Está em espanhol, mas é perfeitamente compreensível para falantes do português. Uma lição de humildade e de como podemos construir melhor nossas relações com o mundo em que vivemos.

quinta-feira, 25 de junho de 2009

Conexões / connections / conexiones

Em 1961, em pleno domingo, Berlim foi invadida por mais de 40.000 homens – construtores, policiais e soldados – que ergueram uma cerca de arame farpado ao longo da cidade em apenas 1 hora. De repente, as pessoas estavam separadas de seus parentes, irmãos, pais, filhos e amigos. O objetivo era impedir que cidadãos da Alemanha Oriental passassem para a Alemanha Ocidental. Durante o tempo em que o muro existiu perto de 200 pessoas morreram, 2000 foram feridas e 3200 detidas tentando ultrapassar o muro. Somente em 9 de novembro de 1989, o muro de Berlin foi derrubado.
De forma curiosa, por volta dessa mesma época, Brasil e Paraguai, dois países que no século XIX já tinham travado um conflito sangrento que se estendeu por quase 5 anos, assinavam o acordo de construção da Ponte da Amizade no mesmo lugar onde se travou a maior das batalhas, a batalha de Riachuelo, que os uniria. Uma ponte com a extensão de 552,40 metros, com vão livre de 305 metros e altura de 78 metros. A Ponte da Amizade foi concluída em 1962.
Isto é apenas um retrato de como age a humanidade. Assim, cheia de muros e de pontes. Muros que separam pessoas por questões de raça, religião ou costumes diferentes. E pontes que não conhecem desafios naturais, rios, mares ou até mesmo distâncias, para tentar unir mais as pessoas. No que diz respeito à atitude humana, podemos dizer que só existem dois tipos de pessoas no mundo: aquelas que constroem muros e aquelas que constroem pontes. Alguns de nós passamos a vida construindo muros. Outros constroem pontes.
Jesus Cristo optou por construir pontes. Ele veio ao mundo, nasceu de forma humilde, cresceu, andou pelas vilas e cidades de seu país ensinando, curando e restaurando vidas com esse objetivo: derrubar muros e construir pontes.
A Bíblia diz que ele mesmo veio para destruir o muro de separação e de inimizade entre os homens: “[...] destruiu a barreira, o muro de inimizade”.
Com certeza, muitos muros caíram ante a presença de Jesus: muros de discórdia, muros de intolerância, muros de preconceitos, muros de indiferença, muros da falta de perdão. Muros, que são verdadeiras muralhas intransponíveis.
Contudo, Ele foi um construtor de pontes por excelência. Entre o duras exigências de uma sociedade injusta e a multidão que andava perdida nas cidades, ele foi a ponte da misericórdia por onde passam todos cansados e sobrecarregados a procura de um descanso para as suas almas aflitas – “vinde a mim todos os que estais cansados e sobrecarregados...” Entre os acusadores moralistas e a mulher pecadora arrependida, ele foi a ponte do perdão – “nem eu te condeno, vai e não peques mais”. Entre o coração aflito de um pai esmagado pela perda de sua filhinha, e a incredulidade da massa circundante ele foi a ponte da esperança – “somente crê”.
Cristo, foi o grande construtor de pontes porque permitiu que pessoas comuns como nós encontrassem um valor mais verdadeiro em nossa própria vida que resultasse em um sentido maior da vida. A maior expressão dessa capacidade de Jesus em construir pontes é a restauração de nossa conexão com Deus. Em Jesus Cristo, podemos descobrir que há vida e que essa vida tem maior sentido porque está conectada em Deus.

quinta-feira, 11 de junho de 2009

Igreja emergente: como ser uma igreja contemporânea? / Emerging Church: how to be a contemporary church? / Iglesia emergente: ¿cómo ser una iglesia co

A questão que tem tomado conta das lideranças cristãs atualmente é: como ser igreja nos dias de hoje? Como falar de Cristo a um mundo que se tornou menos religioso? Além disso, vivemos em um tempo marcado por um descrédito nas instituições e uma valorização da diversidade e de alternativas. Alguns o chamam de pós-modernidade. O fato é que a condição contemporânea da cultura tem sido um tema que vem sendo tratado há algum tempo, notadamente a partir da obra de Richard Niebuhr, Cristo e cultura, um dos livros de maior influência sobre o assunto.
Para pensar nisso, é preciso levar em conta a mensagem que a igreja precisa apresentar, principalmente quantos aos métodos, em uma época em constante evolução. Isso pode trazer à luz ideias que nos confrontam acerca da relação que pode ser estabelecida entre evangelho e cultura, igreja e mundo, mesmo nesse tempo, sem perder a essência. O que precisa estar em evidência é: como ser uma igreja relevante?
Numa reflexão como essa, a preocupação central deve ser a respeito da necessidade que a igreja tem de vivenciar a mensagem cristã como o conjunto de seguidores de Cristo que é, num contexto sociocultural que passa por mudanças. A base para isso é a concepção de que é possível afirmar as distinções entre igreja e mundo sem estabelecer uma separação entre os dois, uma vez que ela existe para o mundo, não para promover uma cultura distinta de seu contexto. É dessa maneira que a igreja pode tornar-se mais relevante para esse tempo. Ter relevância não é ter a concordância de todos a sua volta, mas fazer com que nossas expressões de fé sejam como um maná fresco e doador de vida para hoje.
Ao contrário da compreensão engendrada pelo cristianismo na Modernidade, baseado na confiança do poder do conhecimento para transformar o indivíduo, é necessário redescobrir a possibilidade da revelação de um Deus que se relaciona conosco através de uma mensagem que deve ser compartilhada com pessoas que sofrem. A descoberta de um Deus que fala hoje só é possível pela inserção das pessoas que confiam e acreditam nessa possibilidade em sua própria cultura. Foi isso que Jesus fez. Ele foi uma pessoa do seu tempo. E Deus nos chama para viver essa tenção de viver a fé em nosso tempo.
Surge, com isso, uma tendência e uma necessidade de se dar mais ênfase às palavras e à vida de Jesus conforme se encontra nos evangelhos, mas na perspectiva de que Jesus foi uma pessoa inserida na cultura e que valem para hoje. É preciso descobrir que Deus age mesmo em meio a situações que não são tidas como espirituais. A espiritualidade não está dissociada da arte, da cultura, da música, do teatro, da economia, da política. Ela é a maneira como vivemos no mundo, da qual participamos ativamente. Isso não tem nada a ver com as formas como nos constituímos como igreja, mas com a maneira como nos tornamos participantes do reino de Deus, o que se manifesta através dos relacionamos que construímos, e não nas práticas religiosas e manutenção das tradições. A vida comunitária nasce espontaneamente a partir de valores e ações que são compartilhados, na medida em que as pessoas são encorajadas a conviverem e a cooperarem entre si.
Esse é um grande desafio. Boudrillard denominou essa época de “a sociedade do espetáculo”. Na medida em que somos seduzidos pela aparência, somos chamados a um compromisso de sermos agentes para derrubar as barreiras que têm separado as pessoas de um Deus que as ama, pessoas sensíveis à espiritualidade, mas indiferentes à religião sistematizada.

terça-feira, 9 de junho de 2009

Bioética e espiritualidade / bioethics and spirituality / la bioética y la espiritualidad

Quando se fala de bioética, logo vem à mente questões relacionadas à pesquisa de células tronco, aborto, eutanásia e manipulação genética. Mas a principal questão que a ser levantada deve ser relativa ao sentido da existência humana diante dos avanços tecnológicos. Exatamente pelo fato de que tais avanços dão a falsa ideia de que a humanidade melhorou por causa das recentes descobertas.
Desde a década de 1950, é possível perceber que cada vez mais precisamos de uma ciência que nos proteja da ciência, e a bioética é uma resposta interdisciplinar às grandes mudanças que, de um modo geral, se tem experimentado em relação à vida humana. E, dentro da reflexão bioética, permitir uma abordagem que seja fruto de uma reflexão bíblico-teológica – e por que não dizer espiritual – a respeito do tema. A preocupação deve ser de abordar os fatos que envolvem os novos procedimentos médicos e científicos à luz de compreensões que nascem da fé e que estão ligadas ao significado da vida, principalmente em relação ao sofrimento e à morte.
Uma vez que a bioética se constitui em um discurso sobre direito e dignidade humanos, o assunto precisa ser tratado na perspectiva da proteção da pessoa. Ser pessoa é a base para se ter direitos. A perspectiva adotada deve ser a da valorização da identidade individual, que não é resultado de uma conquista pessoal, mas de um relacionamento mais amplo: o da comunhão com Deus, que é marcado pelo reconhecimento de que, como pessoas, somos constituídos de liberdade e de finitude. Essa condição aponta para uma visão moral que habilita a dizer não para algumas práticas que são motivadas pela liberdade humana.
Nesse sentido, a medicina e as ciências que tratam da vida humana devem ser entendidas como cuidados dispensados a seres humanos que sofrem. Uma ética assim submete os cuidados com a vida a vínculos mais afetivos, que são regidos por uma moral fundada na Bíblia, como expressão de um Deus que fala e conhece as nossas dores.
Um exemplo disso é a substituição da noção de procriação para a de reprodução. A questão é: quando o ser humano passa a existir? A resposta a essa pergunta define o rumo da abordagem sobre reprodução assistida, aborto, pesquisa com células-tronco e manipulação genética. São temas que têm sido tratados com base na ideia de privacidade e pessoalidade que dominam a sociedade contemporânea. Em lugar disso, é preciso dar ênfase à procriação como resultado de vínculos mais expressivos, de amor. Uma vez que não temos o controle da criação da vida, é preciso exercitar o direito de dizer não quando a humanidade está na condição de paciente.
Até mesmo as questões relativas à eutanásia, ao suicídio e ao uso de embriões devem ser entendidas não como tentativas de amenizar o sofrimento, mas na perspectiva de otimizar e maximizar o cuidado com o outro. Quando se trata do cuidado com o ser humano, seja como um embrião seja no fim da vida, não se está simplesmente diante de cobaias. O que deve estar em jogo é a tentativa de salvar a sociedade e a nós mesmos, e não somente a melhoria da vida natural. Por outro lado, não é também correto rejeitar os recursos que a medicina e as ciências oferecem. O que se deseja é que sejamos capazes de reencontrar a alegria de existir mesmo em meio a circunstâncias que são desesperadoras.

terça-feira, 5 de maio de 2009

Crescer e aparecer / Grow and appear / Crecen y aparecen

Crescer e aparecer têm mais a ver com a maneira como você vê a si mesmo, pois é isso que você está mostrando de si para os outros. Se você quer dar um incentivo à sua carreira ou aos seus relacionamentos e, ao mesmo tempo, estar diante dos holofotes, você precisa pensar sobre esse tema.
Todos nós queremos melhorar em alguma coisa. E nada impede que desejemos progredir. O problema é que existem muitas barreiras que atravessam o nosso caminho e, por conta disso, muita gente acaba desistindo. Neste livro você encontra orientações para tomar algumas atitudes que podem ajudá-lo no processo de crescimento pessoal e espiritual, tudo para ajudá-lo a se tornar a pessoa que você foi formada para ser.
Se você está preocupado com a sua qualidade de vida e com o seu futuro, você precisa saber mais sobre isso. Crescimento pessoal e sucesso estão inter-relacionados quando o assunto é espiritualidade.
Crescer é próprio dos seres vivos. E nós, seres humanos, somos os únicos capazes de interferir intencionalmente em nosso processo de crescimento. De que maneira você responderia a essas perguntas?
- Se você tivesse o conhecimento que tem hoje, faria do mesmo jeito o que você fez naquela época do começo de sua carreira ou de seus relacionamentos?
- Que tipo de pessoa você tem se tornado ao longo da vida?
- Quais as orientações que regem as suas escolhas?
- Se sua vida continuar como está, você pode ter um futuro melhor?
A maneira como você responde a essas perguntas demonstra o quanto o tema deste livro é interessante para a sua vida.
Crescimento pessoal não é um tema que atrai muitas pessoas nem está na pauta dos livros de autoajuda de grande procura. As pessoas estão mais interessadas em descobrir qual é o segredo para o sucesso, a fórmula mágica para a grande virada de uma hora para outra. Mas crescimento e sucesso são temas que estão inter-relacionados, um não acontece sem o outro.
Até que ponto você precisa crescer? Como é possível crescer? Como saber se você está realmente crescendo? Essas e outras perguntas são respondidas ao longo do texto que explora abordagens filosóficas e procura uma aproximação com a Bíblia como um texto que tem influenciado três grandes religiões mundiais: o cristianismo, o islamismo e o judaísmo.
Algumas atitudes são recomendadas a cada capítulo: tenha um alvo determinado; não tenha pressa; evite o orgulho; cuide bem de si mesmo; não desista; enfrente as pressões do dia a dia com sabedoria; evite os excessos; reorganize as suas prioridades; tenha fé; influencie pessoas; seja obediente; desenvolva a sua espiritualidade.
Cada uma dessas atitudes é acompanhada de reflexões e recomendações de práticas que podem ajudá-lo a ser uma pessoa melhor do que já é. São atitudes que estão voltadas para a melhoria de sua qualidade de vida e com o seu futuro. Ao final do livro, você encontra um guia de estudo para sua meditação pessoal ou para a atividade em um pequeno grupo.

quinta-feira, 9 de abril de 2009

O significado contemporâneo da Páscoa / The contemporary meaning of Easter / El sentido contemporáneo de la Pascua

Durante estes dias você vai ouvir em algum lugar alguém contar a história da morte e ressurreição de Jesus. Quando eu era criança, os cinemas mudavam sua programação para apresentar os filmes clássicos da paixão de Jesus, os religiosos faziam procissões, autos e encenações pelas ruas, uma tentativa de reproduzir a via crucis. Já na minha juventude, a semana santa era tempo de ouvir os sermões e assistir as cantatas dentro dos templos que recontavam a mesma história. Não sei quantas vezes já a ouvi ao longo dessa minha vida. Creio que foram tantas vezes quantas eu precisei relembrar que houve um momento único na história da humanidade em que alguém de fato se importou com a minha condição humana.
Talvez você se surpreenda com o que vou afirmar: Jesus foi único que de fato se importou com o homem e com sua condição humana a ponto de lhe apontar uma alternativa, uma saída, um caminho para a realização plena. Ele foi o maior ser humano que já viveu e o maior mestre sobre nós mesmos que já existiu. E o que ele fez e o que ele ensinou não perdeu seu prazo de validade. Por isso que sua história precisa ser contada e recontada. Nunca será demais repeti-la.
Quando Jesus viveu, ele não pediu aos seus discípulos para que comemorassem o seu nascimento. Isso o fazemos porque nos alegra contar o tempo e relembrar aqueles momento em que nos achávamos mais felizes. Mas ele pediu que fizéssemos de sua morte um memorial. Isso precisamos fazer como um exercício de encontro com a nossa própria realidade.
A história da crucificação nos constrange porque nos vemos nela. Ela é uma denúncia daquilo que como humanos somos capazes de fazer. Ela nos traz de volta à nossa realidade e nos lembra que não temos condição nenhuma de dar conta de nós mesmos. Mas a história da ressurreição nos impulsiona a seguir adiante, ela nos aponta para um futuro e para uma esperança. Crucificação e ressurreição fazem parte de um jogo que envolve memória e imaginário. É a dupla expressão que nos leva para dentro de nós mesmos. A memória de que somos criaturas e que caminhamos fatalmente para o fim. O imaginário de que temos a possibilidade de construir uma vida melhor com Deus. Memória que nos confronta com o fato de que somos falhos. Imaginário que nos acende a fé para ser aquilo para o qual Deus nos criou.
Poderíamos dizer isso de outro modo. A Páscoa traz em sua forma a expressão de nossa própria contradição, a de que vivemos a tensão entre determinismo e liberdade, entre o já e o ainda não. É por causa dessa história que podemos entender melhor o quanto Deus se importa conosco e como foi intenso o seu esforço em nos proporcionar um encontro com sua graça.
Para os cristãos, Páscoa é paixão de um Deus que nos ama loucamente e nos chama para desfrutar do seu amor. Amor que se doa a ponto de se fazer morte, morte de cruz. Para os judeus, Páscoa é a festa da passagem, da mudança, da transitoriedade. Lembrança de um Deus que se faz caminho e nos chama para seguir por ele. Para nós precisa ser o encontro com Deus, que se fez homem, que se foz morte, que se fez ressurreição, que se fez vida nova pela fé em Jesus Cristo. Eu não posso me esquecer que isso se deu em um momento muito especial de nossa história.

quarta-feira, 8 de abril de 2009

O que é sacrifício? / What is sacrifice? / ¿Lo que es sacrificio?

A páscoa é uma festa que remonta a idéia do sacrifício como uma atitude interior de busca, reconciliação e apaziguamento diante de algo que nos inquieta. A festa, de origem judaica, está associada à saída do povo hebreu do Egito para a terra da promessa. É a festa da passagem, a transição entre o inverno e a primavera, do tempo de trevas para um tempo de luz, da época de escravidão para a liberdade. Durante essa festa, o sacrifício de um cordeiro era o ato central. Foi num tempo de Páscoa que o judeu Jesus foi crucificado como um cordeiro expiatório.
Diante disso, surge a pergunta: o que é sacrifício? A noção de sacrifício está situada entre as noções de redenção e de pecado. A palavra vem do latim sacrificium, que está relacionada ao ato de fazer com que alguma coisa se torne sagrada. Sacrificar é converter em sagrado o objeto que será dado em oferta.
Existem diversas formas de sacrifício, umas ligadas a alguma expressão religiosa, outras associadas a algum desejo altruísta de reparação. Está na dimensão do sagrado, pois aproxima os homens de esferas desconhecidas, normalmente entendidas como divinas, por meio da aniquilação, literal ou figuradamente, de um animal, planta, objeto ou mesmo um ser humano.
O sacrifício primitivo está associado a uma troca para aplacar a ira dos deuses e para purgar um sentimento de insegurança ou culpa que possa existir. Embora a palavra possa ter origem nos rituais religiosos, o sacrifício é uma grande metáfora que lembra a ação altruísta, de renúncia, de abnegação e desprovida de interesses pessoais em favor do outro.
A essência do sacrifício é atribuir honras a Deus, a maior homenagem que a criatura pode prestar ao seu criador. Mas, ao contrário do que a narrativa do Antigo Testamento possa aparentar, Deus não se agrada de qualquer tipo de sacrifício ritual. “Acaso como carne de touros ou bebo sangue de bodes? Ofereça a Deus em sacrifício a sua gratidão, cumpra os seus votos para com o Altíssimo, e clame a mim no dia da angústia; eu o livrarei, e você me honrará.” Salmos 50.13-15.
A Bíblia nos diz qual é o tipo de sacrifício que agrada a Deus: “Os sacrifícios que agradam a Deus são um espírito quebrantado; um coração quebrantado e contrito, ó Deus, não desprezarás.” Salmos 50.17. E mais: “Pois desejo misericórdia, e não sacrifícios; conhecimento de Deus em vez de holocaustos.” Oséias 6.6.
Se fôssemos desenvolver uma teologia bíblica do sacrifício, teríamos que começar com o convite: “[...] se ofereçam em sacrifício vivo, santo e agradável a Deus; este é o culto racional de vocês.” Romanos 12.1. Exatamente pelo fato de que essa foi a atitude de Jesus: “... assim também Cristo foi oferecido em sacrifício uma única vez, para tirar os pecados de muitos [...].” Hebreus 9.28. No que diz respeito a esse aspecto, a Bíblia é insistente: “[...] ofereçamos continuamente a Deus um sacrifício de louvor, que é fruto de lábios que confessam o seu nome. Não se esqueçam de fazer o bem e de repartir com os outros o que vocês têm, pois de tais sacrifícios Deus se agrada.” Hebreus 13.15-16.
Agostinho afirmou que o sacrifício nada mais é senão o amor. Hegel compreendeu que o cristianismo não é uma religião de sacrifício material, uma vez que sua compreensão não está associada a um abandono de uma posse imediata ou de uma existência natural, mas de um ato simbólico mediante o qual submeto a Deus toda a minha existência. É como Goethe certa vez afirmou: “Um grande sacrifício é fácil, os pequenos sacrifícios contínuos é que custam.”

segunda-feira, 6 de abril de 2009

Dimensão espiritual da violência / Spiritual dynamics of violence / La dinámica espiritual de la violencia

Começo a segunda-feira com a notícia trágica da morte do professor Almir, que teve sua vida interrompida pela violência. Não quero estabelecer juízo sobre a ação de quem atuou como franco-atirador. Mas preciso entender como que nos permitimos como sociedade construir quadros como esse e que nos deixam perplexos diante do drama humano. Para isso, quero adotar aqui alguns conceitos do livro A violência e o sagrado, de René Girard (publicado no Brasil pela Editora da Unesp e Paz e Terra), que desenvolve um modo de compreender que a vítima da violência hoje tem as mesmas características dos atos sacrificiais primitivos.
Para Girard, a violência está fundamentada no caráter mimético do desejo, em que um sujeito estabelece uma relação assimétrica de discípulo e modelo com outro sujeito, de tal modo que um deseja imitar o outro e, diante da impossibilidade de o fazer, o vê como um rival. O sentido dos sacrifícios nas sociedades primitivas era fundado nessa concepção. A própria palavra sacrifício significa tornar-se sagrado. Diante de uma situação de crise, é necessário encontrar uma vítima, personificado em idéias como de um bode expiatório, que absorva todo o mal enfrentado pelo grupo e que passe ser a fonte de realização para o grupo que o vitima. Essa experiência é fundadora de uma dimensão sagrada da violência e que se constitui também como fundadora de cultura.
A violência que ameaça a sociedade é transferida para uma vítima. Essa é uma solução pacificadora que racionaliza e equaciona o problema da violência. Em lugar da violência de um contra o outro, adota-se a violência de todos contra um como efeito preventivo. Desse modo, a vítima escolhida não tem o direito de vingar-se exatamente porque vive à margem da sociedade. Por isso, deve ser eliminada. E aí que se estabelece a distinção entre o mesmo e o outro, a base da diferenciação. O grande problema está no risco da indiferença, quando não se consegue identificar a vítima para se transferir a culpa.
É dentro da esfera da indiferença que está a violência generalizada, que cada vez mais se instala na sociedade contemporânea. As pessoas hoje precisam encontrar culpados pelos seus fracassos, de tal modo que a ação de franco-atiradores tem se constituído em uma paranóia desse tempo. É o mesmo problema que constitui o poder paralelo do tráfico e do crime organizado, através dos “tribunais” que julgam os traidores e os condenam ao extermínio.
Mas também está a banalização do mal, aquilo que Hanna Arendt se referiu a Eichmann, quando de seu julgamento pelos crimes praticados em nome do nazismo: um homem horrivelmente comum e normal, que era capaz de cumprir ordens, mas não conseguia estabelecer uma diferença entre bem e mal, incapaz de pensar por si mesmo. Essa atitude faz parte da complexidade da condição humana e emerge quando se compactua com o sofrimento, a tortura e a própria prática do mal como parte de nossa rotina, quando os fatos violentos já não nos chocam mais, a menos que se tornem hediondos.
Diante das muitas formas que a face da violência se apresenta, surge a pergunta: de que forma podemos lidar espiritualmente com o problema da violência? Cabe, então, a afirmação de Martin Luther King: “Hoje não temos mais a opção entre violência e não-violência. É somente a escolha entre não-violência ou não-existência.”

sexta-feira, 3 de abril de 2009

quarta-feira, 1 de abril de 2009

Dimensão espiritual do sofrimento / Spiritual dimension of suffering / Dimensión espiritual del sufrimiento

Qual o sentido do sofrimento para a condição humana? Se Deus é tão bom e amoroso, por que ele permite que as pessoas a quem tanto ama sofram? Você já ouviu essa pergunta alguma vez. Até mesmo os discípulos de Jesus, quando se depararam com uma pessoa que nasceu cega, perguntaram por que era assim.
O sofrimento não é algo que Deus determina para nós. Ele é parte de nossa condição humana, de tal maneira que vivenciar o sofrimento nos aproxima de nós mesmos e nos ajuda a construir uma compreensão de quem de fato nós somos e qual o sentido de nossa vida. O sofrimento pode despertar a culpa, a ansiedade e o medo. Pode resultar em sintomas físicos e pode nos afastar do convívio social. Ele desorganiza o nosso mundo interior. Mas pode ser também o início de uma grande mudança.
Nós construímos com muita facilidade o sonho de uma vida melhor. Chegamos a almejar o céu, melhores condições de vida, reconhecimento, realização no amor etc. Mas nos esquecemos com a mesma facilidade que tudo isso são conquistas que exigem muito esforço pessoal, que não dependem tão-somente de nós mesmos e que implicam uma trajetória até a satisfação de nossos desejos.
Não há nada de errado em desejar dias melhores. De fato, o melhor que Deus tem preparado para a nossa vida ainda está por acontecer. Ele não acabou de escrever a nossa história nem abriu mão de quem quer seja. Faz parte também de nossa condição humana construir uma compreensão da realidade a partir do simbólico e do imaginário. O que você precisa aprender é a conviver com a ideia de que transformar sonhos em realidade envolve uma trajetória que pode ser na maioria das vezes longa e penosa. E quanto mais significativo forem seus ideais, projetos de vida, sonhos e perspectiva, mais você encontrará forças para enfrentar o sofrimento.
O sofrimento é um sentimento resultante da dor. Ele será tão prejudicial quanto maior for a expectativa da dor. Toda dor é real, contingente. Mas a intensidade do sofrimento que a dor causa varia em relação ao quanto desejamos superá-la. Um atleta é capaz de superar a dor física para poder superar as suas próprias marcas. O esforço para superar o sofrimento causado pela dor está ligado ao sentimento da agonia, palavra que vem do grego agon, que quer dizer combate. Jesus experimentou essa agonia no Getsêmini. Em sua experiência de oração, ele já podia sentir a proximidade da dor da cruz.
Com o sofrimento, vem o choro, que nada mais é do que o alívio que encontramos para desabafar e gritar que está doendo. É a expressão mais íntima de quanto estamos sofrendo. Chorar alivia, é terapêutico: “Bem-aventurados os que choram...” É a maneira que o organismo tem para criar as condições para reencontrar a alegria perdida: “... o choro pode persistir uma noite, mas de manhã irrompe a alegria” (Salmos 30.5).
É mais simples transferir a responsabilidade pelo sofrimento humano a Satanás. É mais cômodo entender o sofrimento como resultado de uma reação de um deus irado. Mas o sofrimento é humano. Que fique claro que o Diabo pode se valer do sofrimento para confundir. Esse é o trabalho dele. E que fique mais do que claro que Deus pode se valer do sofrimento para abrir portas, apontar caminhos, refazer as forças, restaurar as forças e curar feridas. Essa é a sua natureza.
Nesse tempo de uma busca incontrolável pelo prazer pessoal, nos deparamos com as muitas razões de sofrimento e nos fazemos perplexos. É nessa hora que Deus estende a mão e diz de forma terna que se importa com a nossa dor e que está profundamente interessado em transformar as razões de nosso sofrimento em motivos de alegria.

quinta-feira, 26 de março de 2009

Ética / Ethic / Etica


Queria falar de ética. Tenho refletido muito sobre isso porque estou preparando os originais de minha dissertação para a publicação em livro. Mas preferi apresentar uma tirinha que resume bem o que me inquieta.

quarta-feira, 25 de março de 2009

Jesus e a transformação de indivíduos em pessoas / Jesus and the transformation of individuals in person / Jesús y la transformación de los individuos

É possível aplicar os ensinos de Jesus em um contexto tão ambíguo como tem se caracterizado o comportamento do mundo corporativo nesse estágio em que o capitalismo chegou? A resposta é positiva, embora deva ficar bem claro que o pensamento desenvolvido por Jesus Cristo está voltado para uma preocupação que está na contramão da mentalidade contemporânea.
Alguns livros têm surgido nessa área que servem de bons referenciais teóricos a fim de promover uma aproximação entre os princípios cristãos e uma práxis de mercado que leve em consideração muito mais a realização pessoal do que a conquista de lucro. É o caso de Mentoria Espiritual: O desafio de transformar indivíduos em pessoas, de James M. Houston (Ed. Mundo Cristão). Há também: Jesus Coach, de Laurie Beth Jones (Ed. Mundo Cristão), e Jesus CEO, da mesma autora (Ed. Ediouro), que procuram apresentar o estilo de Jesus em treinar os seus discípulos de tal forma que os transformou em líderes eficazes, em relação à missão para a qual foram designados.
A preocupação desses autores é de mostrar que o que orientou as atitudes de Jesus como um mentor espiritual foi a perspectiva de resgatar a condição humana e fazer com que indivíduos até então com vidas inexpressivas experimentassem uma transformação significativa. Para isso, Jesus se utilizou de três estratégias: o ensino voltado para as habilidades, a ação efetiva e responsável comprometida com o outro e os relacionamentos movidos pela compaixão.
Foi assim que ele treinou doze homens oriundos de experiências tão diversas e ao mesmo tempo tão comuns. A força com que os chamou fez com que aqueles seus colaboradores tivessem a vida modificada de repente, de modo que nunca mais foram os mesmos. Esse grupo não era formado por pessoas extraordinárias ou sobrenaturais. Eles eram humanos, demasiadamente humanos, passíveis de um questionamento, cheios de temores, mas que foram conduzidos a se tornarem líderes capazes de levar a cabo a missão que lhes fora entregue como se fosse a sua própria missão de vida.
Para entender esse aspecto, é preciso analisar o papel de Jesus Cristo destituído daquilo que a teologia lhe atribui. Uma compreensão de Cristo que não seja meramente histórica, mas que também não esteja vinculada a uma doutrina. Um Jesus que atue muito mais como um homem que tomou as decisões acertadas e que serviu de fonte de inspiração para outros, no sentido de que seu exemplo fosse imitado.
Um líder que esteja para além do Messias, pois foi isso que ele foi enquanto aqui viveu. Ele abriu mão de sua glória para que pudesse ser absolutamente homem, e que deve ser visto como tal em sua função de líder, professor e chefe. Foi isso que o fez motivar sua equipe e tornar efetiva a relação com seus colaboradores. Sua capacidade de gerenciar pessoas e situações de conflito, associada a uma mensagem confrontadora aos padrões da época, fez dele o maior exemplo de espiritualidade que já existiu.
Mesmo que não se aceite a pessoa de Jesus Cristo como o Filho de Deus, senhor e salvador de todos os que creem, não se pode discordar de que seus ensinos e seu exemplo constituem-se um forte argumento em favor de uma reavaliação sobre o modo como temos conduzido nossas ações e para apontar caminhos para a reconstrução de uma vida que possa fazer sentido.

terça-feira, 24 de março de 2009

Exemplo de mentoria espiritual / Example of spiritual mentoring / Ejemplo de mentores espirituales

Um dos exemplos de mentoria espiritual que encontramos na Bíblia é Barnabé. Você já ouviu falar de alguma procissão em devoção a São Barnabé? Já leu algum livro, carta, bilhete ou quem sabe um “scrap” escrito por Barnabé? Conhece algum grande feito que ele realizou ou algum grande movimento que liderou? Eu também não. Apesar disso, ele é o maior exemplo de prática da mentoria espiritual que podemos encontrar na Bíblia depois de Jesus Cristo.
A história de Barnabé é relatada no livro de Atos dos apóstolos. Ele mesmo não era um apóstolo. Era um membro comum da comunidade de cristãos de Jerusalém. Sua vida é conhecida por causa das atitudes que tomou em meio a situações de tensão experimentadas pela igreja. Essas atitudes evidenciavam marcas inconfundíveis de seu caráter. Pelo menos algumas dessas situações podem ser alistadas como definidoras dos grandes valores que orientavam a sua vida.
O primeiro valor era a generosidade. Logo no começo, quando a igreja ainda dava os seus primeiros passos, os cristãos desenvolveram o hábito de fazer doações para ajuda mútua. E um dos exemplos expressivos, que mereceu o registro histórico foi o de Barnabé. “José, um levita de Chipre a quem os apóstolos deram o nome de Barnabé, que significa ‘encorajador’, vendeu um campo que possuía, trouxe o dinheiro e o colocou aos pés dos apóstolos”. Atos 4.36-37.
O segundo valor era investir em pessoas. Assim que o temível Saulo se converteu, a presença dele assustava a igreja e até incomodava. Mas Barnabé acreditou na conversão dele e “lhes contou como, no caminho, Saulo vira o Senhor, que lhe falara, e como em Damasco ele havia pregado corajosamente em nome de Jesus”. Atos 9.27. Depois, quando precisou de um companheiro, “Barnabé foi a Tarso procurar Saulo e, quando o encontrou, levou-o para Antioquia. Assim, durante um ano inteiro Barnabé e Saulo se reuniram com a igreja e ensinaram a muitos. Em Antioquia, os discípulos foram pela primeira vez chamados cristãos”. Atos 11.25-26. Se Paulo foi o que se tornou, agradeça a Barnabé.
O terceiro valor era o compartilhamento. Quando os irmãos em Antioquia começaram a se reunir, Barnabé foi até lá para ajudá-los: “Este, ali chegando e vendo a graça de Deus, ficou alegre e os animou a permanecerem fiéis ao Senhor, de todo o coração.” Atos 11.23. E quando a própria igreja de Antioquia quis enviar missionários, não teve dúvidas: “Enquanto adoravam o Senhor e jejuavam, disse o Espírito Santo: ‘Separem-me Barnabé e Saulo para a obra a que os tenho chamado’. Assim, depois de jejuar e orar, impuseram-lhes as mãos e os enviaram”. Atos 13.2-3.
O quarto valor era a cooperação. O ministério de Barnabé era: “fortalecendo os discípulos e encorajando-os a permanecer na fé, dizendo: ‘É necessário que passemos por muitas tribulações para entrarmos no Reino de Deus’.” Atos 14.22. E quando tinha que partir para outra cidade: “Paulo e Barnabé designaram-lhes presbíteros em cada igreja; tendo orado e jejuado, eles os encomendaram ao Senhor, em quem haviam confiado”. Atos 11.23.
Mas o irremediável Barnabé não parou quando Paulo resolveu seguir seu próprio rumo. Lá estava ele de novo apostando tudo na formação de João Marcos: “Tiveram um desentendimento tão sério que se separaram. Barnabé, levando consigo Marcos, navegou para Chipre.” Atos 15.39

segunda-feira, 23 de março de 2009

O que é mentoria espiritual? / What is spiritual coaching? / Que és tutoria espiritual?

Ao contrário do que possa parecer, a mentoria espiritual está mais para um exercício de vida simples e de amizade cristã, do que uma atividade profissional baseada em fórmulas que só servem para distanciar as pessoas umas das outras. A mentoria espiritual tem por princípio o relacionamento com o outro, mas de tal modo que se torna resultante de um primeiro e grande relacionamento que se dá entre o mentor e mentoreado com Deus como o grande Outro.
Somente a partir do estabelecimento de uma relação com Deus é que o indivíduo consegue superar os limites de uma existência autocentrada, egoísta e manipuladora. É isso que tornará possível uma aproximação do outro de forma amorosa e dentro dos princípios ensinados por Jesus Cristo.
Até mesmo no campo da mentoria profissional, um mentor, tutor ou coach não é um mero treinador. Seu trabalho não se resume em oferecer instrução particular, ensino e supervisão em uma determinada área de atividade. Há que se compartilhar também a vida.
Mentoria espiritual exige uma sensibilidade para entender o modo de Deus agir, uma atitude de respeito e de compaixão para com aqueles com quem convivemos a fim de desenvolvermos juntamente a habilidade de aprender com as situações mais comuns da vida. É como a reconstrução de uma casa após uma grande enchente. Não basta restaurar a aparência da casa. Tem que se limpar por dentro, reorganizar a vida, recompor os móveis. Para esse recomeço, a solidariedade, a generosidade e a gratidão são os valores mais importantes a serem cultivados.
Lembro-me do vizinho de meu cunhado. Ele tinha uma linda casa de madeira toda envernizada. Era a casa mais linda do bairro. Um dia, um incêndio consumiu toda a casa. O casal de proprietários perdeu tudo. Não deu tempo de salvar nada. Não tinham nem roupa mais para se vestir. Foi aí que funcionou a solidariedade. Hoje, uma outra casa está reconstruída no terreno. Mas o casal jamais será o mesmo.
No que diz respeito à mentoria espiritual, a casa somos nós mesmos, em nossa integridade. Isso tem a ver com a nossa identidade. As transformações culturais que acontecem na sociedade têm devastado o universo de nossos valores e também a maneira como compreendemos a nós mesmos. É preciso revirar os escombros e refazer as fundações para reconstruir uma vida tal como ela foi criada para ser. É disso que trata a mentoria espiritual.
Nessa condição, somos todos mentoreados e Jesus Cristo é o único e verdadeiro mentor capaz de nos ajudar a reconstruir uma vida que possa fazer sentido. A mentoria espiritual tem, então, um grande fundamento teórico: os ensinos deixados por Jesus Cristo, conforme está registrado na Bíblia. Só que esses estudos devem ser analisados à luz da história, da filosofia e da psicanálise para se chegar a uma compreensão mais adequada de quem somos.
É nesse sentido que Jesus Cristo pode ser considerado o mentor mais hábil e mais eficiente que já se conheceu. Durante seu ministério, ele aconselhou, exortou, motivou e orientou seus discípulos, de tal forma que transformou a vida de pessoas simples. O método que Jesus usou pode ser comparado ao que atualmente é conhecido como life coaching, cujos conceitos podem ser aplicados à atividade executiva tanto nas grandes corporações quanto em pequenas empresas.
O grande desafio da mentoria espiritual é, portanto, fazer de Jesus o grande coach da nossa vida pessoal e de aprofundar esse relacionamento no sentido de fazer com que a vida e os ensinos dele sejam reproduzidos em nós.

sexta-feira, 20 de março de 2009

Quando a mentoria espiritual é necessária / When the spiritual mentoring is needed / Cuando la mentoria espiritual és necessaria

Em que medida a mentoria pode ser considerada como uma atividade espiritual? Na medida em que ela nos remete a uma compreensão de nós mesmos como humanos. E isso vale para o mentor e para o mentoreado. A mentoria como atividade humana surge da necessidade de encontrar sentido para as coisas que fazemos em um contexto de trabalho dominado pela mentalidade engendrada pelo capitalismo. Empresas, na maioria das vezes, adotam programas de mentoria e coach porque estão preocupadas em aumentar sua competitividade e fazer com que os membros da equipe aumentem a sua capacidade de produção.
Mas a mentoria vai além disso. E será tão eficaz quanto necessária na medida em que estiver vinculada a uma noção de espiritualidade. Quando uma empresa começar a se preocupar com a questão da espiritualidade aplicada ao mentoreamento, deve se preparar para uma reviravolta no mundo interior de seus colaboradores. O que vai passar a orientar a vida das pessoas que se interrelacionam são novos valores, novos princípios, novas conquistas que vão sendo consolidadas ao longo das descobertas que serão feitas.
Defendo uma espiritualidade que seja expressão humana, uma atitude em face dos conflitos constitutivos de nossa condição humana. Atitude essa que tem a ver com a nossa necessidade de sermos felizes e de encontrar sentido para a nossa vida. Para esse modo de compreender, tenho como pressuposto o fato de que essa espiritualidade se dá a partir de um relacionamento pessoal com Jesus Cristo e pela formação de seu caráter em nós.
Não se justifica uma mentoria que seja espiritual que não tenha como princípio a formação do caráter de Cristo. De um lado, é preciso que o mentor ou coucher tenha um comprometimento pessoal de construir uma identidade que se aproxime da pessoa de Jesus, que assuma a sua forma, que se torne conforme a imagem de Cristo. De outro, que o objetivo seja o de fazer com que a pessoa mentoreada assuma o compromisso de também construir sua identidade conforme a mesma imagem de Cristo.
Assumir a forma de Cristo ou reproduzir o caráter de Cristo só se torna possível a partir da análise e vivência dos seus ensinamentos, que estão contidos na Bíblia. Considero que Jesus Cristo foi o maior mestre de espiritualidade que já viveu e que a Bíblia, onde estão registrados seus ensinos, o maior manual de orientação espiritual que já se produziu – tanto que tem influenciado centenas de gerações há mais de três mil anos, abrangendo três grandes religiões mundiais: o cristianismo, o islamismo e o judaísmo.
O que se faz necessário, portanto, é desenvolver um programa de mentoria que leve em consideração a espiritualidade como expressão humana e que, ao mesmo tempo, se preocupe com a construção de identidade à semelhança de Jesus Cristo conforme o que se depreende nas Escrituras. Isso não significa repetir os modelos que foram construídos ao longo da história do cristianismo, nem mesmo formatar as descobertas aos padrões de uma religiosidade. Há que se inovar na busca de novos caminhos para a interpretação e para a descoberta de formas de se aplicar os valores e princípios à vida.
Uma mentoria nesses termos é um grande desafio porque é inovadora. Implica mudanças de comportamento das pessoas a partir da constatação de sua necessidade. Por que sua empresa precisa de um programa de mentoria? Para aumentar sua competitividade e eficiência ou para fazer com que as pessoas sejam felizes e encontrem sentido para a sua vida? Se for o primeiro caso, mentoria não passa de uma estratégia para fazer com que seus colaboradores deem mais de si do que eles já estão dando, e isso soa para eles como exploração, em última análise. Mas se é o segundo caso, a mentoria espiritual é o caminho.

quinta-feira, 19 de março de 2009

Mentoria, coaching e espiritualidade / Mentoring, coaching and spirituality / tutoría, entrenamiento y la espiritualidad

Você certamente já ouviu falar que liderar é executar as tarefas enquanto se constroem relacionamentos. Esta é a ideia defendida por escritores como James Hunter. Nos dias de hoje, você não consegue legitimidade da sua atuação como líder se não for através da construção do relacionamentos com seus companheiros de equipe. O que você descobre hoje é que os líderes bem sucedidos ajudam seus colaboradores a crescer e se adaptarem através de um programa de relacionamentos conhecido como mentoria. O nível de envolvimento do líder em desenvolver mentoria demonstra o quanto ele se preocupa com sua equipe e isso encoraja a todos os envolvidos para a mudança e para a inovação. Até mesmo os conflitos são mais bem trabalhados por valorizar os relacionamentos interpessoais e a comunicação.
A grande razão para a existência desse tipo de atividade é o fato de que não há formas de organização humana sem conflito. Não podemos ignorar o fato de que as nossas interações formam uma rede, um tecido social que influencia a conduta humana. As pessoas normalmente aprendem através das ações intencionais, das crises e também dos relacionamentos. As ações intencionais nos remetem ao saber fazer, o tipo de conhecimento que está em alta em nossos dias. As crises nos estimulam a uma reflexão sobre o melhor aproveitamento dos recursos e das oportunidades a fim de construir uma condição melhor. Mas é nos relacionamentos que identificamos nossos pontos fracos e fortes e podemos encontrar caminhos para a realização pessoal.
Como uma atividade voltada para o mundo corporativo, a mentoria tem assumido pelo menos duas formas distintas, mas muito próximas entre si. Quando a mentoria é praticada por um nível hierárquico superior, com a finalidade de orientar o subordinado e de fazer com que as intenções da liderança sejam transformadas em ação, tem sido chamada de coaching.
Quando a preocupação está voltada para a vida como um todo, não só para as questões ligadas à carreira e à organização, tem sido chamada de mentoring. Nesse nível de mentoria, o que prevalece é o valor da pessoa como ela é, sem a preocupação com superação ou com tomadas de decisões, mas com o real interesse de aprofundar relacionamentos, realçar valores humanos e aumentar o nível de comprometimento com as pessoas.
A mentoria é uma estratégia muito antiga. Para alguns, ela foi pela primeira vez registrada na literatura na obra de Homero. A Bíblia tem relatos de atividade de mentoria bastante curiosos. Os profetas bíblicos desenvolviam seus discípulos através de um relacionamento muito próximo. Foi o caso do profeta Elias com o seu auxiliar Eliseu, que por sua vez, quando se tornou profeta, teve como auxiliar o jovem Jeazi. Jesus teve doze discípulos que foram treinados para o apostolado, mas ele escolheu três – Pedro, Tiago e João – para serem os mais próximos.
A mentoria é baseada na vivência, no caminhar junto, no compartilhar a vida. Poucos mentores profissionais sabem que seu principal papel não é ter todas as respostas, mas construir juntos o caminho para uma relação amigável, justa, equilibrada. É claro que o maior beneficiado de um ambiente em que as pessoas se respeitam e reconhecem o seu valor é a própria organização. Por isso que mais de um terço das grandes empresas nos Estados Unidos desenvolvem programas de mentoria, segundo as pesquisas por entidades ligadas à área de recursos humanos.
Quando é a hora de se preocupar com isso? (a) Quando a situação de crise externa exige flexibilização das ações; (b) quando a competitividade aumenta; (c) quando os conflitos internos atrapalham os relacionamentos; (d) quando se torna necessária a busca de novas ideias.
Mas você não precisa esperar ficar doente para poder ir ao médico. Você pode adotar um estilo de vida saudável e periodicamente procurar o médico para os exames preventivos e de rotina. Esse é o papel da mentoria na vida da organização: promover um ambiente saudável para os relacionamentos, viabilizar a comunicação interpessoal de forma eficaz, prevenir as possibilidades de conflito e valorizar as pessoas pelo que de fato elas são. Quem precisa disso? Todos. Famílias, empresas, escolas, igrejas, organizações, sindicatos, partidos políticos, órgãos públicos. É preciso redescobrir um modo para humanizar as relações a fim de tornar a vida mais significativa. O grande desafio da mentoria é verdadeiramente transformar indivíduos em pessoas.

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