domingo, 25 de janeiro de 2015

Palavra de vida / Word of life / Palabra de vida

Este é o meu consolo no meu sofrimento: A tua promessa dá-me vida. Salmos 119.50
A Bíblia é a palavra de Deus, aprendemos desde cedo em nosso catecismo. Ela não contém nem se parece, ela é. Isso faz toda a diferença. Isso nos lembra que Deus falou aos homens em um momento da história, e que estes homens que ouviram Deus registraram sua palavra em uma forma escrita.
O problema é que a ideia de palavra comporta duas possibilidades: uma, o ato da fala, com seu sistema de signos; a outra, seus significados. A primeira, objetiva, formal e que pode ser decodificada. A segunda, difusa, subjetiva e relacionada ao contexto. Ferdinand de Saussure as designou como língua e fala (langue e parole, em francês).
O Antigo Testamento emprega duas palavras em hebraico para se referir à palavra de Deus: uma é dabar, a palavra dita por Deus, a outra é imra, que se refere às promessas divinas. Ambas são usadas no mesmo sentido: a palavra que produz vida e serve como guia para o viver melhor.
O Novo Testamento também emprega duas palavras gregas para se referir à palavra de Deus: uma é logos, a outra é rhema. A primeira é a palavra dita, codificada, que faz parte do ato da fala. É a forma substantiva do verbo dizer. Os gregos entendiam que podíamos conhecer as coisas por aquilo que somos capazes de dizer sobre ela. A segunda é o que está implícito da palavra dita, o sentido que a palavra assume na consciência de quem a recebe.
Ao traduzir as palavras hebraicas para o grego, a Septuaginta (versão grega do Antigo Testamento elaborada no século II a.C.) empregou as palavras gregas indiscriminadamente para ambos os casos. Da mesma forma, os escritores do Novo Testamento empregaram tais palavras sem qualquer critério lógico entre elas. Tal como acontece em português, com o falou e disse.
Isso quer dizer que, para você ter acesso aos sentidos da palavra de Deus, precisa estar familiarizado com os modos de Deus falar. Para isso, há uma palavra escrita, codificada, expressa na língua comum a nós humanos. Ela remete a um implícito, que é o propósito de Deus a todos os homens em todos os tempos, que provoca um efeito na consciência de quem a conhece.

É somente neste sentido que a palavra de Deus é palavra de vida: que gera vida e aponta direção para a vida. A Bíblia é este livro de vida para quem examina. Não precisa de muito. Basta uma pequena porção, como uma semente, para produzir os frutos para os quais ela se destina.

domingo, 18 de janeiro de 2015

Deus é justo / The Lord is righteous / Justo es Jehová

O Senhor é justo em todos os seus caminhos e é bondoso em tudo o que faz. Salmos 145.17
Quem nunca se emocionou ao ver uma igreja evangélica cantar o tradicional hino “Justo és, Senhor” (Justus Dominus, de Lowell Masson)? Lembro-me de quando a congregação se esforçava para cantá-lo em todas as vozes possíveis e imagináveis. Até o mais desafinado procurava dar sua contribuição com seu tom formando, assim, o mais angelical dos coros entre os homens. E sempre acontecia desse mesmo modo, de forma muito espontânea.
No fundo, todos nós compreendemos que a única pessoa a quem podemos atribuir a definição de justo é Deus. Nenhum ser humano mereceu essa designação, nem mesmo o humano Jesus a reivindicou para si. Somente João se referiu a Jesus Cristo como “o Justo”.
E somos assim porque sabemos que nenhuma expressão humana de justiça se mostrou satisfatória até hoje. Como uma virtude humana, a justiça é sempre incompleta, ambígua e contraditória. Por isso Jesus Cristo reconheceu que são bem-aventurados os que têm fome e sede de justiça, pois é na descoberta de nossa incompletude e na nossa abertura para o único que é justo que podemos ser satisfeitos.
Esse reconhecimento, no entanto, comporta duas possibilidades de equívoco: o primeiro quando atribuímos a Deus nossa ideia racional de justiça, aquela que parte de um mediador hábil para tratar de nossas diferenças; o segundo é aquele que vê a justiça como reparadora de um dano, que exige a vingança de algo que nos ultraja, que nos atinge em nossa dignidade.
Compreender Deus como mediador em meio àquilo que causa desigualdade entre nós é o mesmo que exigir que Ele seja insensível, impessoal diante do que nos angustia. Do mesmo modo, requerer que Deus seja um reparador de nossa dignidade é considerá-lo um tirano, vingativo, iracundo. Nenhum desses dois modos são expressões do Deus que é amor, que é como a Bíblia o define. Seu critério de justiça, no entanto, é permeado pelo amor, que se manifesta como graça, misericórdia, perdão e compaixão, valores que a nossa humanidade vã tem grandes dificuldades de realizar.
O salmo que remete à ideia de um Deus justo lembra que ele é bom em tudo o que faz. Não existe melhor definição de justo do que isso: a pessoa boa é uma pessoa justa. O mesmo salmo que contém essa bela definição diz também que ele “está perto de todos os que o invocam, de todos os que o invocam com sinceridade”. Ele não é um Deus distante. Ele não é um Deus raivoso. Ele é o Deus que quer estar ao lado de gente como a gente. Isso sim é justiça.

sábado, 10 de janeiro de 2015

Se não há Deus... / If God does not exist... / Si no hay Dios...

O meu povo cometeu dois crimes: eles me abandonaram, a mim, a fonte de água viva; e cavaram as suas próprias cisternas, cisternas rachadas que não retêm água.” Jeremias 2.13
Dostoiévski, em sua célebre obra Irmãos Karamazov, diz: “Se Deus não existe e a alma é mortal, tudo é permitido”. Essa frase lembra a condição humana a que a cultura ocidental foi submetida a partir da Modernidade ao lançar Deus para fora do mundo.
As charges da revista francesa Charlie Hebdo, que sofreu um ataque terrorista na última quarta-feira, 7/1, são apenas reflexos de um quadro maior de rejeição ao religioso e o estágio de absoluta indiferença a respeito de Deus. O Ocidente aprendeu a não considerar Deus como uma hipótese de conhecimento.
Essa condição cultural, niilista, interfere na maneira de ver o mundo, nas artes e até nas ciências. Todas as verdades são colocadas sob suspensão e até mesmo o senso de humor cede lugar ao deboche, ao grotesco, ao escracho. O conteúdo das charges que despertaram a fúria de terroristas é constrangedor, chega a ser vergonhoso de se mencionar.
A afirmação de autonomia do homem moderno, no entanto, depende da afirmação da liberdade. A máxima de Voltaire torna-se uma bandeira para a defesa do direito de expressar livremente o pensamento: “Posso não concordar com nenhuma palavra que você disser, mas defenderei até a morte o direito de você dizê-las.
O mundo desencantado e secularizado perdeu-se de si mesmo e rejeita toda forma de crença ou discurso de verdade que lhe aponte o caminho de volta para um tempo de engano e de trevas, como foi definido o período medieval, dominado pela relação entre fé e razão.
A atitude crítica para com o fenômeno religioso conduz a um temor de retorno ao estágio pré-moderno, que lembra a inquisição e o discurso de culpabilização e medo. Mas remete também para um sentimento pós-moderno que reacende as muitas formas de fundamentalismo construídas a partir do século XX, seja ele protestante, de esquerda, de extrema direita, ateísta e até mesmo islâmico. Um mundo de extremos, marcado pela intolerância, que não conhece limites, que prega a absolutização do eu, que exige a relativização de toda a forma de poder e de verdade.
Esse mundo que se perdeu de si mesmo carece de uma voz que lhe aponte o caminho. Contudo, a única voz possível nesse momento de angústia é: até quando? Até quando teremos que assistir indefesos os muitos cerceamentos de liberdade, de tratamento desigual e de opressão num mundo que se afastou de Deus?
Aquele que tem o controle da história, porém, ainda repete chorando o seu discurso na cruz: “Pai, perdoa-lhes, pois não sabem o que estão fazendo” (Lucas 23.34).
(Extraído do informativo de domingo, 11/1/2015, da Igreja Batista da Orla Oceânica)

quinta-feira, 8 de janeiro de 2015

Liberdade de expressão sob ameaça: reflexão a partir do ataque a Charlie Hebdo / Freedom of expression under attack: “Je Suis Charlie” / Libertad de expresión amenazada

O 7 de janeiro vai ficar marcado como mais uma data divisora neste começo de século XXI. O terror vai impondo a nós uma agenda em que o calendário vai se enchendo de datas que nos fazem chorar por causa da intolerância. Tal como o 11 de setembro, que atentou contra os símbolos econômicos e políticos do ocidente, agora o que está em questão é a liberdade de expressão, cara conquista da cultura ocidental.
Quando a liberdade de imprensa é atacada, estamos todos vulneráveis. O atentado contra a equipe da revista Charlie Hebdo foi um golpe contra a liberdade de expressão, um ato de intolerância, uma violência contra a democracia, além de ser uma grande perda para imprensa internacional, uma vez que ceifou a vida de seus principais articulistas.
Alguém pode argumentar que o jornal pecou pela irreverência, exagerou na dose com seu humor ácido. Nada justifica tal atrocidade, que, pelo requinte de crueldade e eficiência, foi sucintamente planejada e friamente realizada. Duas realidades estão em questão nisso tudo: primeira, o quanto estamos vulneráveis quando o assunto é respeito à liberdade e aos direitos individuais; a segunda é que este atentado na França é uma prova do que pode fazer uma espiritualidade sem compromisso com a humanidade.
Se uma ideologia, sentimento religioso ou mesmo uma convicção política é capaz de atacar a imprensa, que tem a arte e a palavra como defesa, o que fará de nós, mortais, que pensamos diferente? O conceito de liberdade, engendrado pelo liberalismo moderno, vai aos poucos sendo colocado sob ameaça. Essa tal noção, além de ser uma abstração, está longe de ser um direito desfrutado pela maioria. Dá a entender que liberdade como um bem comum será sempre um estado de permanente confrontação.
Além do mais, a ideia agir de tal modo para vingar um deus ofendido parece algo surreal, que nem mesmo nas histórias medievais mais espúrias daria para ser imaginada. Afinal, um Deus que precisa de quem o defenda ou de advogados é um deus fraco. O Deus vivo e verdadeiro é aquele que se deixa morrer pela ignorância dos homens, e não aquele que precisa ter sua ira aplacada por causa de ofensas, principalmente pela ação intolerante, sem compaixão, revoltada e violenta de quem o diz seguir.
Uma religião que não desenvolve nos seus seguidores a capacidade de autocrítica e que não permite rir de si mesmo é uma religião desprezível, desumana, risível e esquizofrênica. Seja ela qual for. Vale para fundamentalistas que há em todas elas. Vale também para a cultura. Ao que tudo indica, um mundo que se secularizou tanto, perdeu a capacidade de rir de si mesmo, de enxergar suas próprias incoerências. Um mundo tão sério assim é incapaz de pensar outros caminhos possíveis. Nesse mundo sem imaginação, fazer humor tornou-se uma atividade de risco.

segunda-feira, 5 de janeiro de 2015

Novos começos / New beginnings / Un nuevo comienzo

“[...] As coisas antigas já passaram; eis que surgiram coisas novas!" 2 Coríntios 5.17
Um dia, o cantor e compositor jamaicano Bob Marley afirmou: “Ninguém pode voltar no tempo e fazer um novo começo. Mas podemos começar agora a fazer um novo fim”. Foi o que Jesus deixou como essência da mensagem para aqueles que o seguem.
Jesus disse para seus discípulos que, para segui-lo, era preciso deixar para trás toda a vida distante de sua presença. Olhar para o passado pode ser um risco muito grande para quem quer dar um novo fim para a sua vida.
Para entendermos bem isso, é preciso deixar claro que o passado é muito importante. Foi nele que fomos construídos. Tudo o que somos e o que temos foi plantado lá atrás. Jesus não quer que você negue ou  mude o seu passado. Ele apenas deseja que você não seja mais orientado pelos mesmos valores que o prendem ao passado.
Não importa o que aconteceu em sua vida anteriormente. Para os seus erros cometidos, Jesus perdoa. Para quem está desamparado, Jesus acolhe. Para quem está perdido, Jesus dá um novo caminho. Para quem perdeu a esperança, Jesus restaura. Para quem não sabe mais o caminho, Jesus orienta. Para quem está preso no passado, Jesus liberta.
Seguir a Jesus é um projeto de vida em que, deixando para trás as coisas que nos oprimem, prosseguimos para o alvo novo que ele mesmo nos aponta. São novos começos, novas oportunidades de seguir em frente. Quanto ao passado, não dá para corrigi-lo. Mas dá para interromper a caminhada errante e redefinir os rumos.
Nesse projeto de vida, não somos desafiados a termos um passado diferente, mas a construirmos um novo futuro. Tanto é que Jesus não tem vergonha de você pelo que fez, pois ele sabe que sua vida pode ser transformada pela presença e direção dele. Jesus não se importa com a maneira como você viveu até aqui, mas não deseja que você continue vivendo do mesmo modo daqui por diante.

Não queira corrigir o seu passado para seguir a Jesus. Você não precisa fazer isso e nem vai conseguir. Agora é a chance que temos de fazer um novo começo na direção da vontade de Deus para nós, tendo Jesus como guia.

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