quarta-feira, 27 de abril de 2011

Teologia para um tempo de incerteza: leituras necessárias 1 / Theology for a time of uncertainty / Teología para un momento de incertidumbre

Há muitos teóricos que preferem rotular esse tempo como de incertezas. O problema é que as “certezas” engendradas pela Modernidade foram todas colocadas sob suspeita. O processo de mudança de paradigma e a crise, sem precedentes por que passa a humanidade é um desafio ao fazer teológico. Exatamente porque, como campo de conhecimento, a Teologia também passa por esse mesmo processo de mudança e por essa mesma crise. Quando Fritjof Capra, em seu livro O ponto de mutação, alerta para “a real ameaça da extinção da raça humana e toda a vida no planeta”, isso afeta diretamente o fazer teológico por dois motivos. O primeiro tem a ver com o fato de que a Teologia foi tremendamente afetada pelo pensamento linear e racional engendrado pela Modernidade. O segundo se refere à realidade de que a Teologia é uma ciência que se propõe a buscar significados para as questões humanas e suas relações com o sagrado.
Olhando de outro modo, essa crise é da Teologia na medida em que ela se dirige a esse contexto em processo de mudança. Se observarmos bem, os fenômenos que podem ser assinalados que indicam um grave momento da história humana afetam diretamente não só as dimensões morais e intelectuais, mas também a espiritualidade. Quando nos referimos ao aumento da capacidade de autodestruição, dos conflitos sociais, das doenças sem controle, dos problemas de ordem emocional, estamos tratando de questões para as quais a Teologia também precisa se oferecer como caminho para a busca de respostas.
A falta de capacidade de compreensão dessa situação por parte de intelectuais afeta também a Teologia, ainda mais considerando-se o fato de que esta tem sido uma ciência que vem trabalhando a reboque dos grandes movimentos e descobertas decorrentes do racionalismo. E, ao ter tal atitude, a maioria dos teólogos também faz uso de “modelos conceituais obsoletos e variáveis irrelevantes”, para usar as palavras de Capra.
É impressionante notar que a perda da flexibilidade, característica apontada por Capra para esse tempo de mudança de paradigma e de crise, também afeta a instituição religiosa, reduzindo a capacidade de reflexão crítica e de busca de novos caminhos. Três modos de transição estão bem delineados na fase em que se encontra o cristianismo, naquilo que chamamos de declínio da cristandade. Primeiramente, verificamos uma crise de autoridade, semelhante ao que acontece com o patriarcado. O fim da era do predomínio do uso de combustíveis fósseis tem também afeta a territorialidade do domínio da Teologia, fazendo surgir novos centros de produção nunca antes imaginados, como a América Latina, a África e a Coréia do Sul. Além disso, essa mudança de paradigma tem afetado diretamente a abordagem teológica e as formas de organização da igreja, o que pode ser visto nos atuais movimentos neopentecostais.
A Teologia precisa se dar conta de que a visão de mundo cartesiana e iluminista mudou e não responde mais à expectativa de compreensão da totalidade. Isso implica o fato de que uma nova abordagem precisa ser levada em conta. O pensamento sistêmico, a concepção holística e a noção de complexidade precisam ser encaradas como possibilidades para essa nova abordagem. A Teologia precisa, no mínimo, de abertura para também tomar parte desse diálogo que envolve o contributo das ciências humanas para ampliar a esfera de compreensão do fenômeno humano.

quinta-feira, 7 de abril de 2011

Tiros em Realengo: o atentado contra crianças no Rio de Janeiro e as incertezas / Bowling for Realengo / atentado y inseguridad

A manhã do dia 7 de abril de 2011 vai ficar marcada na memória da cidade do Rio de Janeiro. É uma data para não ser esquecida. O lugar que deveria servir como espaço para a construção do futuro e para se vivenciar a esperança de melhoria de vida foi transformado no cenário de um acontecimento patético que levará muito tempo para sequer entendermos. Não podemos evitar de associar esse fato aos assassinatos provocados por francoatiradores nos Estados Unidos da América, perpetuado no conhecido documentário Tiros em Columbine, de Michael Moore. Mas a diferença é conjuntural: o atentado carioca envolve uma comunidade pobre do subúrbio e um jovem marcado por perdas e uma vida destituída dos mesmos elementos culturais. O problema não passa tão somente pelo consumo de armas, nem mesmo pelo caso de bullying. Acho também que não se está a procura de culpados. O agente dessa chacina está morto. Entendo que estamos diante de um quadro que é ao mesmo tempo aterrador e resultado desse momento que vivemos, uma combinação explosiva de circunstâncias. Alguns elementos não podem escapar de nossa atenção. O primeiro deles tem a ver com a crescente banalização do mal, que estimula a indiferença e nos empurra para um isolamento social e a perda do sentido de comunhão, que faz com que a vida do outro não tenha valor a não ser para dar vazão ao que eu sinto. Outro elemento é o fenômeno dos relacionamentos fugazes, fluidos, transitórios e fragmentados, a supervalorização do agora e do instante vivido, que não finca raízes, nem produz história. Há também o problema do fundamentalismo (seja de que religião ou ideologia for) como alternativa a esse mundo de incertezas, que afirma a necessidade de uma saída que garanta a verdade e a purificação numa perspectiva totalmente sem ética e sem sentido. O efeito da globalização bem como o surgimento da sociedade virtual e midiática tem produzido uma mentalidade que cria um mundo irreal, fundado em modelos que estão presentes nos videogames e sites de relacionamento. Some-se a isso uma personalidade psicopata e sociopata, então se tem uma bomba relógio prestes a explodir de forma imprevisível, cujas vítimas são os mais inocentes. Não. Essa não é a primeira vez que isso acontece no Brasil. Ou será que esquecemos o caso da escola de São Paulo, em 2003, e do Shopping Morumbi, em 1999? E o que falar da Candelária, em 1993, e de Vigário Geral, naquele mesmo ano? Está claro que a intenção do assassino era de chocar e chamar a atenção sobre si. Isso é típico do perfil de todos os assassinos nessa modalidade. Ele premeditou tudo para ter, de forma macabra, o seu instante de fama. Poderia ter proporções maiores, não fosse o policial que o interceptou. A dor que essas famílias sentem e a perda de meninos e meninas de 12 a 14 anos de idade não podem ser consolados com uma explicação dessa. Isso pode até nos ajudar a entender um pouco esse mundo que geme, mas não apaga a marca que fica. Não há como enxugar lágrimas nessa hora. O momento é de choro copioso, sentido, que se transforme em grito de socorro a fim de que outras vidas sejam poupadas, principalmente de crianças... Porque essa doeu demais! O que nos consola é saber que há um Deus que se importa, exatamente porque ele percebe toda essa maldade e se oferece como caminho, por meio de Jesus Cristo, e nos acolhe como filhos que precisam de cuidado. É a ele que devemos orar: "livra-nos também desse mal".

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