sábado, 9 de setembro de 2023

Justiça Ambiental: desigualdade, desproporcionalidade e responsabilidade dos riscos / Environmental Justice: inequality, disproportionality and responsibility for risks / Justicia Ambiental: desigualdad, desproporcionalidad y responsabilidad por los riesgos

Nos dias atuais, assistimos a biodiversidade ser perdida em velocidade nunca vista antes. O futuro de nossas crianças e jovens está ameaçado pelas consequências das mudanças climáticas. É urgente que haja uma mudança de mentalidade a fim de que haja tratamento justo na distribuição de oportunidades entre todas as criaturas. A Justiça nos chama a uma conversão de natureza ecológica. À medida que nos juntarmos a esse rio poderoso de Justiça e Paz criamos esperança de um mundo melhor para todos e todas.

Para reverter o atual cenário da crise ambiental, as ações individuais não são suficientes, embora imprescindíveis. Precisamos de um poderoso movimento de Justiça, aliada à Paz, a fim de cobrar as ações de governos e do setor produtivo por mudanças. Esses são os principais responsáveis pela emissão dos gases poluentes e de resíduos que são lançados na natureza, bem como pelas políticas públicas que envolvem a preservação do meio ambiente.

A Justiça ambiental, que também é social, climática, hídrica e alimentar, envolve o pagamento de dívidas históricas. As conferências do clima promovidas pela ONU já reconheceram que, em nível global, as nações com mais poder e controle da riqueza têm o dever de lidar de forma justa e honesta em favor das comunidades que mais sofrem com os fenômenos ambientais e climáticos.

Preservar a biodiversidade, manter a expectativa de aumento do clima do planeta abaixo de 1,5° C de aquecimento global, promover responsabilização dos danos ecológicos, garantir acesso a direitos às comunidades mais afetadas pelos fenômenos climáticos e ambientais, buscar soluções justas e urgentes para acesso à água e à alimentação para todos e todas. Essas são ações que reacendem a esperança de um mundo melhor para todos e todas, para que um rio poderoso de justiça e paz inunde a vida no planeta.

O profeta Isaías anunciou no passado que Deus estava realizando uma grande obra de Justiça para toda a humanidade: “Pois estou prestes a realizar algo novo. Vejam, já comecei! Não percebem? Abrirei um caminho no meio do deserto, farei rios na terra seca” (Isaías 43.19). Sua misericórdia, bondade e amor, que são os Seus modos fazer Justiça, iriam fluir em abundância até nos desertos. Nos lugares onde há desigualdade e onde os riscos recaem mais sobre os oprimidos e carentes, ali vai jorrar o manancial de Justiça e de Paz que vêm do Senhor.

Somos convidados a nos juntarmos a esse rio de justiça e de paz em favor da criação e fazer convergir todos os nossos esforços em favor de uma nova mentalidade em que todos e todas tenham direito à Justiça ambiental, à Justiça climática, à Justiça hídrica e à Justiça alimentar. Como os afluentes se unem para formar um caudaloso rio, assim devemos agir juntos para que a Justiça e a paz fluam de forma poderosa.

quinta-feira, 29 de junho de 2023

Diante da finitude / Facing finitude / Frente a la finitud

Lembra-te de como é passageira a minha vida. Terás criado em vão todos os homens?” (Salmos 89.47).

Em pleno século 21, a humanidade ainda não aprendeu a lidar com a morte, embora seja uma realidade tão presente na vida de nossas famílias e de nossa sociedade, seja pela sua chegada lenta ou sorrateira, seja pelo seu acometimento súbito. As novas tecnologias podem até ajudar a controlar sua proximidade, mas não podem evitar que ela aconteça.

A morte não pode ser tratada como uma mera separação entre corpo e mente ou alma. Ela marca o fim de uma existência. Todos nós sabemos que a vida não dura para sempre, porém temos muita dificuldade para lidar com a proximidade da morte. O limite da vida do de ser é conhecido em filosofia e psicologia como finitude. É a característica do que é finito. O sentido de finitude nos ajuda a compreender melhor o valor da vida e a aprender a como aproveitar as oportunidades que ela os traz. Encarar a finitude é enfrentar a realidade da vida sem ilusões.

Freud argumenta que o modo civilizado com que temos tratado a morte tem dado lugar a um sentimento e a uma necessidade de vivermos além dos nossos recursos. A nossa vida é única e breve e, por mais que possamos tentar evitar a proximidade do seu fim, precisamos aproveitar melhor o nosso tempo de vida. Quando passamos a olhar a vida e a morte com mais naturalidade e admitimos a transitoriedade e a brevidade da vida, podemos agir com mais autenticidade, mais amor e mais coragem.

A Bíblia afirma que a pessoa sábia pensa na morte. “Quem só pensa em se divertir é tolo; quem é sábio pensa também na morte” (Eclesiastes 7.4 NTLH). O princípio bíblico apresentado por Jesus é: morra para viver, e não apenas viva para morrer. Disse Jesus: Pois quem quiser salvar a sua vida, a perderá, mas quem perder a vida por minha causa, a encontrará” (Mateus 16.25). Pensar na morte é compreender que a vida é muito mais do que uma questão de temporalidade.

Sêneca afirmou, em Sobre a brevidade da vida, que “não é da morte que temos medo, mas de pensar nela”. Esse medo de pensar na morte tem mobilizado a vida da humanidade e alimentado o sonho pela imortalidade. “De todas as coisas que movem o homem, uma das principais é o terror da morte”, disse Ernest Becker, no livro A negação da morte.

A questão que se levanta é: como conduziríamos nossa vida se soubéssemos o dia em que ela irá terminar? Quanto tempo ainda temos aqui para realizarmos tudo aquilo que desejamos de bom para as pessoas que amamos? Manuel Bandeira escreveu no poema Consoada: Quando a Indesejada das gentes chegar / (Não sei se dura ou caroável), / Talvez eu tenha medo, / Talvez sorria, ou diga: / – Alô, iniludível! / O meu dia foi bom, pode a noite descer. / (A noite com os seus sortilégios.) / Encontrará lavrado o campo, a casa limpa, / A mesa posta, Com cada coisa em seu lugar”.

Diante da certeza da finitude, a melhor decisão que podemos tomar é investir no que vai durar para sempre. Uma vez que não ficaremos aqui de forma permanente, muitas preocupações que temos se mostram desnecessárias, principalmente em relação ao futuro. “Nunca tenha medo de confiar um futuro desconhecido a um Deus conhecido”. Essa frase é de Corie Ten Boom, uma sobrevivente do Nazismo.

O ciclo vida e morte é um duro aprendizado. Nós, maus alunos”, argumenta Lya Luft, no artigo O ciclo da vida, publicado na Revista Veja de 27 de agosto de 2014. Temos em nós mesmos o desejo pela eternidade. Ao comentar essa constatação, C.S. Lewis argumenta: “Eu descobri em mim mesmo desejos os quais nada nesta Terra pode satisfazer. A única explicação lógica é que eu fui feito para outro mundo”.

A sensação de que aqui não é o nosso lugar só pode ter uma explicação: fomos gerados por um amor eterno e para desejarmos a eternidade. Uma vida que anseia pela eternidade encara as circunstâncias da vida com maior esperança. E isso conduz a um modo de vida que possa fazer valer a penas desfrutarmos do tempo que temos aqui.

Não podemos viver o quanto queremos, e morreremos mesmo se não quisermos”, afirmou Santo Agostinho. Foi ele mesmo que fez a conhecida oração sobre a morte: “A morte não é nada. Apenas fiz a passagem para o outro lado: é como se estivesse escondido no quarto ao lado. Eu sempre serei eu e tu serás sempre tu. O que éramos antes um para o outro o somos ainda”. Diante da realidade da morte, só nos resta viver de modo digno enquanto ela não chega.

No livro Um mês para viver, os autores Kerry e Chris Shook propõem um exercício prático durante 30 dias para refletir sobre como poderíamos viver de forma apaixonada, completamente amorosa, aprendendo humildemente e agindo corajosamente. A ideia é viver de tal modo como se cada momento fosse o último da vida. Isso implica uma nova atitude marcada pelo amor, pelo perdão, pela integridade e pelo ensusiasmo. Essa reflexão sobre a finitude tem o poder de gerar mais vida.

terça-feira, 6 de junho de 2023

Desafio para a obra missionária: o lugar do outro / Challenge for missionary work: the place of the other / Desafío para la obra misionera: el lugar del otro

A obra missionária, tal como a conhecemos hoje, é resultado de estratégias que o cristianismo desenvolveu a partir da colonização. As atividades missionárias, via de regra, são definidas com termos retirados das práticas de intervenção desenvolvidas pelo colonialismo ocidental. Expressões como cruzada, conquista e campo missionário são representativas dessa forma de lidar com a evangelização mundial.

O maior desafio da obra missionária em pleno século 21 é resgatar o sentido do envio que está presente no discurso de Jesus e dos primeiros cristãos. Não se tratava de implantar um domínio ou um novo princípio moral, mas de se viver o evangelho da graça de forma plena no contexto de uma nova cultura como testemunhas do amor de Deus. Por essa razão, os primeiros seguidores de Jesus foram chamados de cristãos, por serem as melhores representações de Cristo no mundo.

Fazer missão é fazer um movimento na direção do outro, para dentro de sua realidade concreta de vida no mundo. A principal tarefa da obra missionária, que é evangelizar, não se restringe a conquistar novos adeptos para a religião cristã. Evangelizar é anunciar a boa notícia de que uma nova vida é possível.

O mundo em que a igreja está inserida é completamente diferente tanto dos cristãos primitivos quanto da época das conquistas territoriais do Ocidente e do desenvolvimento das estratégias de missões modernas. Entretanto, a demanda por uma igreja que esteja em sintonia com as necessidades das pessoas permanece como um incômodo chamado para repensar o modo como realizamos a obra missionária hoje.

A igreja é a comunidade dos que são chamados a sair de sua posição de conforto e fazer um movimento para dentro do mundo, não para fora ou para longe dele. A palavra grega ekklesia lembra isso. Ela é iniciada com a preposição ek-, que tem o sentido de um movimento para fora.

A igreja se reúne para orar uns pelos outros, para cuidar uns dos outros, para encorajar uns aos outros e para instruir uns aos outros. Mas o espaço de reunião não é seu local de permanência. A igreja não existe para viver enclausurada num lugar sagrado. Ela existe para fazer diferença no mundo. A igreja só é igreja quando faz o movimento em direção ao outro em suas condições concretas de vida no mundo.

Quais são os desafios para a evangelização mundial e para a obra missionária no mundo atual? Podemos alistar algumas:

- Restaurar a dignidade humana.

- Promover justiça.

- Semear a paz.

- Reacender a esperança.

- Praticar o amor fraternal.

- Cuidar da vida em todas as suas formas e expressões.

Em resumo, o maior desafio da obra missionária em pleno século 21 é levar paz, consolo e esperança para quem enfrenta situações que colocam a vida em risco. Temas como mudanças climática, ameaças de guerra, fome e crise migratória demandam atitudes que emanam do evangelho da graça.

Quem almeja realizar a obra missionária tem o dever de estar antenado e bem informado sobre o que faz o outro sofrer. As causas do sofrimento não são apenas circunstanciais, mas também estruturais. O chamado de Jesus para missões implica levantar os olhos e ver os campos prontos para a colheita, sentir compaixão das pessoas que andam errantes como ovelhas sem pastor, ir às cidades pregar a boa nova do Reino de Deus. O mundo mudou, mas o chamado continua o mesmo.

sexta-feira, 5 de maio de 2023

O que fazer quando falta respeito em família? / What to do when there is no respect in the family? / ¿Qué hacer cuando no hay respeto en la familia?

O que fazer quando o conflito se aloja na família e se torna um problema permanente?

Famílias podem passar por conflitos por vários motivos e esses mesmos conflitos podem ser intensificados por vários fatores. Podem ser incompatibilidades de temperamento, questões financeiras, aspectos econômicos, comportamento crítico, injustiças, divergências de opinião e até interesses e formas de manipular o outro. Nenhuma família está livre de passar por essas situações.

A maneira como a família enfrenta seus conflitos pode também variar. Algumas situações podem ser toleradas, outras podem ser resolvidas a partir da negociação e do diálogo, mas há aquelas que podem persistir por muito tempo. Quando se procura investigar a causa de um conflito, invariavelmente se descobre que a raiz do problema se encontra no fato de que alguém se sente desrespeitado.

O desrespeito é a principal causa de desentendimento em família. Principalmente quando envolve negócios em família ou atividades que envolvem a todos, as possibilidades de que alguém venha decepcionar, incomodar ou até provocar mágoas e ressentimentos são enormes.

O que pode fazer com que alguém se sinta desrespeitado em família? Veja alguns fatores:

a) Quando suas ideias, opiniões e conselhos não são reconhecidos.

b) Quando os membros de menor status social são desprezados pelos de maior status.

c) Quando não recebem apoio ou empatia nas horas de dificuldade.

d) Quando seus esforços não são recompensados.

e) Quando são criticados ou humilhados em público.

f) Quando não se tem acesso às informações mais comuns.

g) Quando são comparados de forma inferior a outros membros da família.

h) Quando são tratados com indiferença e preconceito.

Todos nós podemos tanto incorrer nessas condutas como também podemos ser desrespeitados. Até mesmos nossas atitudes desrespeitosas podem passar despercebidas por algum tempo. Isso pode desencadear atitudes que provocam problemas emocionais e de saúde mental, como mágoas, ressentimentos e agressividades que vão requerer muito esforço para serem superados. Quanto mais rápido os problemas forem identificados, melhores são as chances de se resolvê-los antes que o ambiente piore e se torne insuportável a convivência.

Precisamos conversar mais sobre a construção de uma cultura familiar de respeito mútuo. Quando as pessoas se sentem respeitadas e acolhidas em sua própria família, elas têm melhores condições de lidar com seus conflitos pessoais. Conviver em um ambiente dominando por fatores conflitantes é extremamente estressante e pode provocar sintomas de ansiedade. Por isso, é fundamental a prática do diálogo e a abertura de canais de comunicação em que os membros da família se sintam a vontade para falar dos problemas que enfrentam.

A Bíblia está repleta de história de famílias que passaram por conflitos que se tornaram permanentes, alguns com resultados desastrosos. É o caso da família de Adão e Eva, de Noé, de Abraão, de Jacó, de Davi e tantos outros que, apesar de serem reconhecidos como heróis da fé, não ficaram imunes aos conflitos familiares.

Salomão é um dos personagens bíblicos que tiveram uma família que enfrentou muitos conflitos. A maneira que ele encontrou para lidar com seus problemas ficou registrada no livro de Provérbios. Nele, Salomão abordou diversas situações que envolvem a vida em família que precisam ser revistas à luz das abordagens terapêuticas contemporâneas.

Ao ler algumas passagens do livro de Provérbios, podemos encontrar diretrizes que nos ajudam a lidar com nossos próprios problemas. Ele foi escrito como se um pai amoroso estivesse cuidando das relações familiares a fim de formar uma cultura de respeito mútuo. suas considerações valem como conselhos úteis para os nossos dias.

segunda-feira, 3 de abril de 2023

Dimensão comunitária do discipulado: O que faz diferença no seguimento de Jesus / Community Dimension of Discipleship: What Makes a Difference in Following Jesus / Dimensión comunitaria del discipulado: lo que marca la diferencia en el seguimiento de Jesús

Discipulado é o modo como fazemos o seguimento de Jesus. Ser discípulo de Jesus não é uma aventura solitária, embora sejamos responsáveis pela maneira como seguimos Jesus. Não é ser um autodidata, embora envolva um aprendizado. Não é ser um aluno receptor de informações, embora haja um Mestre.

Na verdade, ser discípulo é ser imitador de Jesus, alguém que assume reproduzir em sua vida o caráter e o ensino de Jesus. Isso implica tomar parte da comunidade daqueles e daquelas que seguem Jesus e se ajudam mutuamente a se aperfeiçoar nisso a cada dia. Além disso, o discípulo é o melhor exemplo de vida transformada pela graça que as pessoas à sua volta podem ter.

Os primeiros discípulos viviam em comunidade. Jesus apresentou durante seus discursos dois tipos de convite: ele disse para alguns “segue-me” e disse para uma multidão “vide a mim”. O convite “segue-me” exigia mudanças no modo de viver e de orientar a vida. Tanto que muitos largaram tudo o que faziam para seguir Jesus. Não era só uma mudança de hábitos ou costumes, mas de valores e de estratégias de vida como a profissão e os relacionamentos.

O convite “vinde a mim” foi dirigido a pessoas cansadas de uma vida marcada pela opressão. Àqueles que andavam errantes como ovelhas sem pastor, perdidas de si mesmo, agora poderiam aprender um novo modo de orientar a vida com quem exercitava a humildade e a mansidão.

Nunca foi fácil seguir Jesus, nem para os primeiros discípulos, nem para nós nesses tempos. Entretanto, Jesus sempre procurou educar seus discípulos sobre o que significa segui-lo. E o fez ao longo da caminhada realizada junto com eles. Jesus foi um mestre por excelência, fazendo com que seus seguidores reproduzissem em suas vidas o seu próprio modo de viver.

O discipulado envolve novos hábitos, novo estilo de vida, novos interesses, novas perspectivas, novo modo de pensar, nova forma de compreender a vida, enfim, nova forma de ver o mundo. Não é um programa ou estratégia para se fazer novos adeptos, mas um novo modo de ser e de agir no mundo.

Envolve um aprendizado que requer mudança de mentalidade. Isso implica abandonar hábitos e concepções influenciados pela religião e pela ideologia dominantes para dar lugar aos valores do Reino de Deus. Exige de cada um o compromisso de ser a melhor expressão da graça de do amor de Deus por toda a criação.

O discípulo aprende em comunidade a dar novos significados a práticas essenciais como a oração, o conhecimento das Escrituras, a vida em comunhão, o testemunho público da fé e o cuidado uns com os outros. Normalmente, aprendemos que a oração, a leitura da Bíblia, o compromisso com a igreja, o testemunho e a prática do bem são atitudes individuais apenas. Mas elas precisam ser compreendidas a partir de uma ótica comunitária, como ações que visam o bem comum.

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