domingo, 30 de setembro de 2007

Descubra seu potencial / Discover yours potential

O apóstolo Paulo deixou bem claro em seus escritos que somos uma incógnita, um enigma a ser desvendado. Você é uma complexa combinação de muitos traços. Cientistas dizem que cerca de 18.000 traços diferentes de personalidade têm sido identificados.
Há mais de 2000 anos atrás, Hipócrates tinha pensado na classificação da personalidade. Ele classificou as pessoas em quatro categorias diferentes: sangüíneo, colérico, fleumático e melancólico.
A maneira número um pela qual a sua personalidade se revela é através do modo como você se relaciona com outras pessoas. Quero sugerir a você três atitudes para se relacionar com pessoas e, assim, descobrir do que você é capaz.
Primeira, esteja consciente da existência de diferentes tipos de personalidade. Você vai viver em constante conflito com as pessoas que estão à sua volta porque somos todos diferentes. Mas, quanto mais você entende a maneira como as pessoas agem e reagem, mais paciência você tem com elas. Siga o conselho do provérbio bíblico: "A sabedoria do homem lhe dá paciência; sua glória é ignorar as ofensas" (Provérbios 19.11).
Segunda, aceite as diferenças de personalidade. Aceitar as diferenças dos outros não é fácil, principalmente aquelas características reconhecidamente problemáticas. Mas a melhor forma de aceitar o outro com suas diferenças é ter a mesma atitude que Jesus teve. Se você levanta os seus olhos para Deus, você não olha com desprezo para as pessoas porque você entende que foi Ele quem fez a todos.Paulo disse: “Portanto, aceitem-se uns aos outros, da mesma forma como Cristo os aceitou, a fim de que vocês glorifiquem a Deus”. (Romanos 15.7). O que significa aceitar uns aos outros? Significa entender que as diferenças não são uma questão de certo ou errado. As pessoas são apenas diferentes e a variedade faz bem.
Terceira, aprecie as diferenças de personalidade. Aceitar as diferenças nos outros significa não criticá-los. Todos nós somos necessários. Todas as personalidades são necessárias. Se duas pessoas concordam em tudo, uma delas é desnecessária.
Pense nisso: Jesus Cristo entende, aceita e gosta de você. Ele fez você, Ele conhece você, Ele se preocupa com você, Ele aceita você, Ele valoriza você, Ele morreu por você.
Se você der sua vida a Ele, Ele ajudará você a desenvolver a personalidade que Ele deu a você no seu mais alto potencial.
Eu não tenho dito nada acerca de como Deus quer ajudar você a melhorar a sua personalidade. Digo apenas para que você faça um levantamento rápido de seus pontos fortes e de seus pontos fracos. Depois, faça a si mesmo as seguintes perguntas:
Como posso fazer com que o meu jeito de ser esteja a serviço do propósito que Ele tem para mim? Você precisa estar certo de que Deus o aceita como você é. Você é importante demais para Deus.
O que Deus pode acrescentar em minha vida para que eu tenha equilíbrio? Você precisa descobrir que Deus quer agregar valores em sua vida para fazer de você uma pessoa extremamente feliz.
Tudo isso começa com um primeiro passo. Tome a decisão de orientar a sua vida pelo projeto que Jesus deixou em seus ensinos.

sábado, 29 de setembro de 2007

Mil pessoas já passaram pelo blog

Tenho muito a agradecer pelas mais de mil pessoas que já viram o blog. Estou realmente surpreso e feliz. Não fazia idéia da velocidade dessa mídia e de seu alcance. De várias partes do mundo, pessoas acessam o blog, com certeza atraídos pelo crescente interesse pelo tema da espiritualidade. Isso em apenas duas semanas e dois dias. A maioria dos acessos são originados de buscas no Google e duram uma média de 4 minutos, o suficiente para uma rápida leitura nas postagens. Isso sem contar com os mais de 250 visitantes que acessam o blog e navegam em suas páginas. Só de curiosidade: a postagem mais visitada foi sobre ética e pós-modernidade. A gente bem que podia voltar a esse assunto... Mil agradecimentos a todos e mil convites para que voltem.
Abraços.

sexta-feira, 28 de setembro de 2007

Gestão e espiritualidade / Management and spirituality

Para muitas pessoas, o tema gestão não combina com espiritualidade. Para pessoas que pensam assim, gestão é uma atividade ligada a negócios e diz respeito a uma forma materialista de pensar, enquanto que a espiritualidade tem a ver com uma atividade mais contemplativa, ligada à religiosidade.
A princípio, percebemos que a gestão trata de questões relacionada à eficiência, da produtividade, de resultados, de competição, de negociação. Mas trata também de inovação, mudança e empreendedorismo. O que todos esses temas têm em comum é que eles abordam as condições de realização do presente e da projeção para um futuro melhor.
A espiritualidade, por sua vez, trata de questões ligadas à postura que devemos assumir visando à felicidade, à busca de sentido para a nossa existência, à aquisição de valores que nutrem relacionamentos mais consistentes, ao cultivo de atitudes voltadas para a sustentabilidade do meio ambiente, à adoção de hábitos de vida saudável, ao amadurecimento pessoal.
A espiritualidade, nesse sentido, tem vários pontos de interesse com a gestão. Diria até que não há gestão autêntica se não houver cuidado com a questão da espiritualidade dentro do ambiente corporativo, levando em consideração é claro, dos fatores que acabei de mencionar.
É um equívoco relegar a espiritualidade a um plano meramente religioso., conquanto a religião seja uma expressão humana de relacionamento com aquilo que atribuímos o valor de sagrado. Religião é uma atitude de encontro de fé com a divindade e seu projeto regenerador. Ela se manifesta sob a forma de conhecimento e ética e atribui sentido à existência.
A espiritualidade cristão, que é o objeto de nossa atenção, diz respeito ao modo de viver como ser humano ao atender o chamado de Jesus para segui-lo. Essa vida que acontece em fé é o que motiva a prosseguir e nutre convicções. Nesse sentido, firmado na fé em Jesus Cristo e seu projeto de vida, a espiritualidade cristã possibilita um conjunto de valores que dão novo entendimento e nova perspectiva para a organização da vida humana, inclusive a empresa.
O capitalismo selvagem que se viu surgir no final do século XIX e começo do século XX deu lugar a corporações humanas destituídas de valores éticos, visando ao lucro sem medir os impactos sociais e ambientais. Hoje, diante dos desencantos gerados pela indústria de consumo, se vê emergir uma nova dimensão da capacidade de gestão que priorize mais os valores e a dignidade humanos.
Várias correntes teóricas na área de gestão tem se levantado, notadamente após a década de 1970, propondo uma reviravolta no mundo corporativo. Resultado disso é o crescimento do número de empresas ligadas ao terceiro setor e a valorização de empresas preocupadas com questões sociais e ambientais. É nesse espaço que a espiritualidade cristã se insere, propondo alternativas viáveis e saudáveis para transformar a realidade da atividade gestora neste tempo.

quinta-feira, 27 de setembro de 2007

Espiritualidade e cuidado de si / Spirituality and care of himself

Na passagem da modernidade para a atualidade, houve um abandono tanto das descrições ontológicas da realidade como da idéia de que existe algo que transcende e que está presente na própria realidade para se afirmar que tudo o que há é inerente à própria realidade, uma vez que é a perspectiva do eu que interpreta a realidade.
Daí o mundo não é mais compreendido a partir de uma objetividade do conhecimento por um sujeito autônomo e desapaixonado, mas condicionado histórica e culturalmente, o que faz com que o conhecimento seja sempre relativo e incompleto. Essa é a principal característica da pós-modernidade.
Michel Foucault chamou essa fragmentação e descontinuidade do pensamento contemporâneo de “heterotopias” que é a coexistência num mesmo espaço impossível de uma diversidade de mundos possíveis.
A necessidade de legitimação do saber faz surgir um novo modelo de espiritualidade que é ambíguo e ambivalente, visto que, ao rejeitar o ideal de um sujeito auto-suficiente (a desconstrução da individualidade), confronta-se com a finitude e resiste a ter que decidir entre o desespero e a fé.
Foucault, em seu A hermenêutica do sujeito, faz uma análise da expressão “tem cuidado de ti mesmo” para a filosofia como possibilidade dialógica de intersubjetividade e de autoconsciência. O que Foucault chama de espiritualidade corresponde a um conjunto de práticas que visam, não ao conhecimento, mas ao acesso à verdade, de tal maneira que não pode haver verdade sem que haja conversão ao sujeito.
A espiritualidade postula que a verdade jamais é dada de pleno direito ao sujeito. A espiritualidade postula que o sujeito, enquanto tal, não tem direito, não possui capacidade de ter acesso à verdade. Postula que a espiritualidade jamais é dada ao sujeito por um simples ato do conhecimento, ato que seria fundamentado e legitimado por ser ele o sujeito e por ter tal e qual estrutura de sujeito. Postula a necessidade de que o sujeito se modifique, se transforme, se desloque, torne-se, em certa medida e até certo ponto, outro que não ele mesmo, para ter direito o acesso à verdade. A verdade só é dada ao sujeito a um preço que põe em jogo o ser mesmo do sujeito (FOUCAULT, 2004, p. 19 e 20).
Foucault procura mostrar que, se a filosofia é a interrogação sobre os caminhos que permitem ao sujeito ter acesso à verdade, a espiritualidade, por sua vez, é “a busca, a prática, a experiência pelas quais o sujeito opera sobre si mesmo as transformações necessária para ter acesso à verdade”. A exigência da preocupação de si, mobilizando as práticas de si, é a expressão dessa natureza espiritual da filosofia. A espiritualidade implica, então a transformação do sujeito.
O pensamento de Descartes, no início da modernidade, pôs fim, na filosofia, a essa preocupação de si. Para ter acesso à verdade, para a qual o sujeito por natureza é capaz, basta aplicar bem o método, sem a necessidade de uma conversão. Foi o começo do fim da metafísica, rejeitada finalmente pelo Iluminismo.
Esse repensar contemporâneo da espiritualidade resulta em uma questão ética que, para Foucault, é a possibilidade de apontar o sujeito que constitui a si próprio como sujeito das práticas sociais.

quarta-feira, 26 de setembro de 2007

Espiritualidade e Felicidade / Spirituality and Happiness

Desde a Antiguidade se tem a compreensão de que o maior desejo humano é o da felicidade. Não importa o que as pessoas digam. Você pode até dizer que o que todo mundo quer é dinheiro, fama e poder. Mas o que está por de traz disso é a crença de que essas coisas possam trazer a tão desejada felicidade.
A pergunta que deve ser feita nesse sentido é: o que realmente produz satisfação ao ser humano? O problema para responder a essa pergunta é que não sabemos corretamente que felicidade é essa que possa alcançar o homem, motivando-o a ações dinâmicas para desvendar o segredo de um sucesso duradouro.
Ao longo da história do pensamento humano, a felicidade pôde ser vista por três modos diferentes. O primeiro entende a felicidade como prazer. O segundo entende a felicidade como uma paz interior. O terceiro entende a felicidade como uma ação.
Ainda que vivamos um tempo em que se valoriza o princípio hedonista, felicidade não é sinônimo de prazer. Felicidade não é prazer, mas não há felicidade sem prezar. Assim como felicidade não é alegria, mas não há felicidade sem alegria. A noção de prazer acontece quando há recompensa, principalmente quando esta é representada pelo dinheiro, pelo status e pelo reconhecimento que nossas realizações possam produzir. Mas, no processo em que esses prazeres acontecem, a felicidade encontra-se muito além desses fatores. Se você quiser que as pessoas que convivem com você experimentem a felicidade ou se você quer ser feliz com aquilo que faz, precisa ir além da noção de remuneração, de poder e de reconhecimento.
Ainda que vivamos um tempo de vida agitada, em que a tecnologia que deveria gerar tranqüilidade acaba gerando estresse, felicidade não é sinônimo de paz interior. É certo que não podemos viver felizes com os nervos à flor da pele. Pessoas a beira de um ataque de nervos não são pessoas felizes. Essa realidade, porém, gera a ilusão de que podemos adquirir um estado de calma e paz interior livre das tensões da vida. Mas a vida é estar constantemente sob tensão. O que o homem precisa não é de se livrar da tensão, mas de atribuir sentido para o conflito, uma razão para poder continuar na luta. Na verdade, não nos desenvolvemos em meio à tranqüilidade, mas em meio à mudança constante. Para crescermos, precisamos da tensão, dos problemas, e isso é saudável.
Uma outra constatação é que a felicidade não existe no meio da passividade. Ela não acontece por acaso. O homem realiza seus sonhos e planos por meio do trabalho. Você já deve ter ouvido falar que trabalho não traz felicidade. Mas pense o quanto uma ação em favor de algum projeto pode trazer realização para a sua vida. Se você está angustiado por causa de suas perdas e fracassos, vá a um hospital que cuida de pacientes com câncer em estado terminal. Você vai se sentir motivado a fazer algo. E o mínimo que você fizer vai trazer para você prazer e paz interior.

terça-feira, 25 de setembro de 2007

Resultado da última enquete: Violência e Espiritualidade


A nossa última enquete tratava da relação da violência/espiritualidade e a maioria esmagadora concordou que a disseminação da violência está ligada a fatores espirituais. Embora a gente saiba que existem vários fatores que causam a violência , a gente não pode negar que a questão espiritual ou o modo como desenvolvemos a nossa espiritualidade afeta a nossa atitude. O problema é que não estamos acostumados a ver a espiritualidade como caminho para a solução de qualquer problema. O apelo imediato para a solução do problema da violência aponta para intolerância (ou "tolerância zero"), mas a espiritualidade aponta para um exame de si mesmo. Aí podemos descobrir que a causa da violência não está no outro, mas nos valores que adotamos como válidos para a construção de nossa identidade. Eu sei que isso dá um bocado de questionamentos. Vamos tratar disso numa outra hora. Continue participando de nossas enquetes. É um bom começo de conversa.

A espiritualidade do líder / The spiritual leader's

“[...] e dissestes: Eis aqui o SENHOR, nosso Deus, nos fez ver a sua glória e a sua grandeza, e ouvimos a sua voz do meio do fogo; hoje, vimos que Deus fala com o homem, e este permanece vivo”. Deuteronômio 5:24

Líderes espirituais fazem diferença em seu tempo porque têm sensibilidade para ver além das circunstâncias e para desenvolver habilidades além das suas possibilidades.
O livro de Deuteronômio, na Bíblia, é constituído dos três últimos grandes discursos de Moisés: a) um retrospecto do que Deus fez com Israel desde o monte Horebe até a chegada ao Jordão (1.6-4-40); b) um discurso sobre a importância e característica da lei (5.1-28.68); c) um apelo a Israel para que aceite a aliança com o Senhor (capítulos 29-30).
O povo estava acampado na região de Moabe, próximo ao Rio Jordão. Já havia se passado 40 anos. Moisés relembra a experiência anterior em Horebe e orienta o povo a firmar um novo pacto. Ali, ele deixa a sua marca de um líder autenticamente espiritual.
Um líder espiritual está preocupado com uma coisa só: a manifestação da glória divina no meio dos homens. Ele enfatiza que a experiência marcante com a glória de Deus é uma prova da compaixão e da misericórdia divina. O que caracteriza a liderança espiritual não são os resultados, mas o foco.
O povo tinha perdido a perspectiva da glória de Deus. Acampado naquele lugar, parecia que o sonho estava para ser realizado. Muito esforço fora gasto para chegar até ali. O povo foi motivado para isso. Mas sem a glória de Deus aquela conquista toda não faria muito sentido.
Quando falo da glória de Deus falo da manifestação do que Deus é em sua essência. Não é nada mágico. É a percepção de que Deus está presente, acompanhando e dando direção à vida. O povo já tinha passado por uma experiência marcante com a presença de Deus. Era preciso que alguém tomasse a iniciativa de dirigir um movimento de restauração. Para que a glória de Deus fosse restaurada no meio de povo, algumas atitudes precisariam acontecer.
Primeiramente, era preciso atender ao chamado para ouvir o que Deus tem pra falar. “Ouve Israel” é uma frase que se repete constantemente no livro. Essa era uma condição para que fossem bem sucedidos.
Em segundo lugar, apresentar-se perante Deus com o coração cheio de temor. Moisés lembra que Deus gostaria que aquele povo fosse mais constante no relacionamento com o próprio Deus (5.29). Seria necessário nutrir um relacionamento mais duradouro. Uma das condições para uma experiência profunda com Deus é a perseverança. Relacionamentos duradouros só prevalecem quando há uma disposição sincera de suportar todas as circunstâncias.
Terceiro, valorizar cada instante gasto na presença de Deus. Nossas experiências com Deus são únicas e devem ser sempre renovadas. “Quem há de toda a carne, que ouviu a voz do Deus vivente falando do meio do fogo, como nós, e ficou vivo?” (5.26). Essa é uma descoberta que você precisa fazer: Deus fala conosco e isso gera vida.
Quarto, restaurar o pacto feito com o Senhor. Moisés relembra o compromisso inicial: “Andareis em todo o caminho que vos manda o Senhor vosso Deus” (5.33).
Aquele momento era de restauração dos compromissos anteriormente assumidos. Se quisermos restaurar o nosso relacionamento com Deus, devemos restaurar os pactos que fizemos com Ele. Líderes espirituais assumem compromissos espirituais.
No seu último discurso, Moisés conduz o povo a uma escolha decisiva e final: “Os céus e a terra tomo, hoje, por testemunhas contra ti, que te propus a vida e a morte, a bênção e a maldição; escolhe, pois, a vida, para que vivas, tu e a tua descendência” (30.20).
Líderes espirituais são necessários hoje ainda. São líderes que vão para além da esfera de sua corporação e que, por isso mesmo, são capazes de apontar caminhos. Tudo começa com uma atitude de aprofundar sua experiência com Deus.

segunda-feira, 24 de setembro de 2007

O caminho para a felicidade passa pelo deserto / The way to happiness is the desert

“Portanto, agora vou atraí-la; vou levá-la para o deserto e falar-lhe com carinho”. Oséias 2.14

Oséias foi o profeta que Deus usou para falar ao povo do norte (Israel) sobre as conseqüências de uma vida distante de Deus. A atitude de Israel foi simbolizada em termos de uma esposa infiel que voltou as costas para seu marido para ir atrás de amantes. Só que a visão profética de Oséias ia para além do exílio.
A profecia de Oséias nos ajuda a entender que existe vida depois da perda.
A liberdade significa depender e seguir a Deus sem garantias. O caminho da escravidão para a liberdade passa pelo deserto. Quer dizer, há um tempo de preparativo e de redimensionamento da vida para que se descubram verdadeiros valores.
Passar pelo deserto não é fácil. É preciso porém que se descubra que há vida depois dele.
"Amados, não se surpreendam com o fogo que surge entre vocês para os provar, como se algo estranho lhes estivesse acontecendo”. I Pedro 4.12
Livre-se da expectativa de recompensas. Antes de experimentar o deserto, na experiência anterior de Isarel, o povo tinha aprendido a lógica da retribuição pela lealdade. O opressor recompensava o trabalho escravo com comida. No deserto, embora experimentasse a liberdade, Israel teve que depender de Deus.
Assuma que você precisa de um tempo de aprendizado. No deserto, o povo viveria um tempo de compartilhamento. Eles teriam que viver em comunidade, governarem a si mesmos. Era um processo que envolvia montar e levantar acampamento, armar e desarmar tenda, levar as cargas, solidarizar-se na hora dos perigos, lutar junto na defesa contra o inimigo.
Desvie os seus olhos dos grandes marcos seculares e fixe seus olhos em Jesus. No cativeiro, o povo contempla os grandes feitos dos conquistadores, suas edificações, sua cultura. Mas no deserta o povo tinha que se contentar em ver a natureza e os grandes feitos de Deus.
Adote um estilo de vida simples. O tempo no deserto seria marcado por um período de limitações, muitas vezes de escassez. Mas não nos esqueçamos que é Deus quem nos conduz para o deserto para nos falar com intimidade. A nossa vitória não está no deserto, mas na redenção que vem depois do deserto, quando Deus restaura nossa vida e a nossa relação com Ele. Deus nos prometeu vida em abundância, mas seu preâmbulo é marcado por uma vida de simplicidade.
O caminho para um novo tempo de alegria e felicidade passa pelo deserto. Ali aprendemos a viver com gratidão e humildade. É ali que aprendemos a ser generosos. É ali que aprendemos a suportar as aflições. É ali que aprendemos a vencer as tentações. É ali que aprendemos a viver.

domingo, 23 de setembro de 2007

Espiritualidade pós-moderna / Spirituality post-modern / Espiritualidad posmoderna

A compreensão de Deus na modernidade envolvia um processo que vai desde a redução do Absoluto a um processo de secularização até a afirmação da morte de Deus. Isso implica que, na modernidade, a abertura para o Outro é comprometida, de tal modo que o Outro se desfaz para dar lugar ao eu solipicista e narcisista. A pós-modernidade, porém, com a afirmação da desconstrução e do fragmento, incorpora o pressuposto do totalmente Outro e permite estabelecer novamente o diálogo entre fé e razão, agora marcado pela carência de certezas absolutas. Angel Castiñeira, em A experiência de Deus na pós-modernidade (1997, p. 147) vê nisso uma autêntica dialética da “iluminação” que reconhece, “em nome da razão, a auto-incapacidade de iluminar ou de anunciar todos os aspectos da dimensão humana e, portanto, deveria deixar espaço para a busca daquilo que como alteridade radical se nos apresenta como inefável ou ‘inapreensível’, aquilo que se sustém no âmbito limitado da razão”.
Deus pode ser conhecido como aquele que não pode ser expresso com a palavra, não mais de um modo conceitual e provável. Quando se tenta estabelecer o conhecimento de Deus a partir do conceito, tal como na modernidade, corre-se o risco de ter uma idéia de Deus como um ídolo, de acordo com os limites da própria razão, e não em sua essência de Deus. Nisso consiste a história do ateísmo da modernidade, que é um ateísmo também conceitual, decorrente do erro de se ter pretendido, a partir da metafísica (e de uma teologia fundada em um saber metafísico), estabelecer princípios absolutos para o conhecimento de Deus de modo objetivo por meio dos conceitos. A experiência de Deus na pós-modernidade, segundo Castiñeira (1997, p. 149), implica em um modo diferente de ver, “em que Deus já não se oferece como objeto de visão, mas como o sujeito de um olhar que, silenciosa e discretamente, vê-nos na face”.
Isso, de forma alguma, não aponta para uma teologia da contemplação ou para uma teologia antimoderna, mas uma teologia que esteja “atenta em distinguir o conteúdo inefável da fé e o mesmo fato comunicável da fé” (CASTIÑEIRA, 1997, p. 150). Hans-Georg Gadamer, em Verdade e método (1998), por sua vez, elabora uma compreensão da linguagem humana em que a palavra é um puro acontecer, tomando como ponto de partida a idéia do “verbo de Deus” no prólogo do Evangelho de João. “A singularidade do acontecimento da redenção leva à introdução da essência histórica no pensamento ocidental e permite também que o fenômeno da linguagem emerja de sua imersão na idealidade do sentido e se ofereça à reflexão filosófica” (GADAMER, 1998, p. 609).
Para Gadamer (1998), a palavra é criadora e salvadora. Da mesma forma com que Deus se fez carne, a palavra se torna som, ou seja, emerge e se manifesta em sua exteriorização como palavra. Enquanto a palavra de Deus é uma unidade perfeita que expressa o todo do divino, a palavra humana precisa ser sempre atualizada, porque é como espelho que reflete a expressão do que uma coisa é. A palavra humana, além disso, é palavra imperfeita porque não pode expressar o nosso espírito de maneira perfeita. Por causa das limitações do intelecto, precisamos de uma multiplicidade de palavras. A palavra também é acidente do espírito, uma vez que, como se dirige para a coisa, não pode contê-la em si como um todo. Gadamer vê nessa distinção entre palavra de Deus, que é una, e palavra humana, que é multiplicidade, uma relação puramente dialética que se aplica à proclamação da mensagem cristã.
A proclamação da salvação, o conteúdo da mensagem cristã, é, por sua vez, um acontecer de natureza própria no sacramento e na prédica, e tão-somente expressa aquilo que ocorreu no ato redentor de Cristo. Nessa medida, continua sendo uma única palavra, a que sempre de novo se proclama na prédica. É evidente que no seu caráter de mensagem, existe já uma alusão à multiplicidade de sua proclamação. O sentido da palavra não pode separar-se do acontecer dessa proclamação. O caráter de acontecer faz parte, antes, do próprio sentido. É como uma maldição, que evidentemente não se pode separar do fato de que é dita por alguém contra alguém. O que se pode compreender nela não é, em caso algum, um sentido lógico do enunciado, passível de ser abstraído, mas a maldição que nela tem lugar. O mesmo ocorre com a unidade e a multiplicidade da palavra que a Igreja anuncia. A morte na cruz e a ressurreição de Cristo são o conteúdo da mensagem da salvação que é pregada em todo sermão. O Cristo ressuscitado e o Cristo da prédica é um e o mesmo (GADAMER, 1998, 621).
A pós-modernidade reclama um discurso teológico capaz de despertar ainda o desejo de Deus que mantenha o essencial do cristianismo, que é o testemunho do Cristo mesmo, o Deus impregnado do humano, sem menosprezar a situação histórica que reinterpreta constantemente essa tradição. Uma teologia que assume uma hermenêutica atualizadora da palavra de Deus, que tenha em conta a distância e a diferença, que reclame um sujeito da maioridade que reafirme sua identidade diante do outro, que não tema apresentar o impensável Deus ausente. Castiñeira (1997, p. 153-154) afirma que “só um discurso teológico que tenha em conta os sujeitos sofredores da história, só um cabedal teológico cultivado a partir de uma comunidade de comunicação plural que entenda a Igreja como um espaço culturalmente policêntrico pode hoje triunfar”.
(Extraído de minha dissertação de mestrado em filosofia: Ética protestante e pós-modernidade)

sábado, 22 de setembro de 2007

Ética pós-moderna / Ethics post-modern / Ética posmoderna

A ética pós-moderna aponta para deslocamentos que resultam na formulação de uma nova identidade que é definida por uma ideologia de consumo, segundo a qual a “imagem” domina a realidade. Gilles Lipovetsky, em A sociedade pós moralista (2005), considera que aquilo que é visto define o que deve ser, de tal modo que quase ninguém mais se importa com o que é “realidade”. A imagem pública passa a ser objeto de culto e de desejo. A busca de gratificação, do prazer e realização individual é o ideal supremo. A diversidade e a fragmentação possibilitam uma multiplicidade de valores com opções individuais, mas nenhuma delas autêntica. Ao mesmo tempo, os meios de comunicação de massa e informação formam a opinião pública e prescrevem as normas de consumo e comportamento, substituindo a interpretação religiosa e a ética com informação precisa, instantânea, direta e objetiva. Ela valoriza o que parece real acima dos conceitos de bem e mal.
Vivemos uma época que nega o dever absoluto da ética. Em seu lugar, toma forma uma ética que proclama o direito individual à autonomia, felicidade e satisfação pessoal. O pós-modernismo pode ser visto como uma época de pós-moralidade porque despreza valores incondicionais mais elevados, tais como o serviço em favor do outro e o voluntarismo.
O pós-modernismo, por conseguinte, não propõe um caos moral, mas redireciona as preocupações éticas mediante um comprometimento de poucas bases com valores que não interferem na liberdade individual. Trata-se de uma ética neo-hedonista que mistura dever e negação do dever, uma vez que o individualismo absoluto destruiria as condições necessárias para facilitar a busca de prazer e realização individual. A preocupação moral pós-moderna não expressa apego a valores, mas contestação contra qualquer tentativa de limitações à liberdade individual. O objetivo não é a afirmação da virtude, mas a obtenção do respeito à dignidade humana. Essa nova moralidade está condizente com os padrões determinados pelo consumismo, pela necessidade de prazer e de busca de realização pessoal.
Segundo Lipovetsky (2005), essa nova moralidade, no entanto, é ambígua. Ao mesmo tempo em que temos, de um lado, um individualismo sem regras, temos, por outro, um espírito de vigilância ultramoralista, pronto a denunciar todo atentado à liberdade humana e ao direito à autonomia individualista. Nesse contexto, a moralidade neo-hedonista da vida pós-moderna se traduz em exigências que percorrem duas direções opostas, uma que estabelece regras e outra que promove o prazer e a exoneração da responsabilidade moral, a exaltação do consumo, a preocupação com a imagem e a valorização do corpo. Temos diante dos olhos a emergência de uma cultura inédita, que divulga mais propriamente as normas do bem-estar do que as obrigações supremas do ideal. Assim, a exigência da ética é mostrada em toda parte, enquanto que se despreza o estímulo a sacrificar os próprios interesses por causa de outros. O que se vê, na verdade, é que os valores não desaparecem, mas transformam-se.
Para muitos, o pós-modernismo trouxe a emancipação dos padrões morais, libertou do dever e desarticulou a moral da responsabilidade. Para Zygmunt Bauman, em Ética pós-moderna (1997), os grandes temas da ética não perderam a sua força. Eles precisam ser revistos e tratados de um modo inteiramente novo. A era pós-moderna, sugere ele, pode ainda representar uma alvorada e não um entardecer para a ética. Para Bauman, a pós-modernidade é uma modernidade sem ilusões, emancipada da falsa consciência, das aspirações irreais e dos objetivos irrealizáveis. Bauman caracteriza essa nova época como um reencantamento do mundo, devolvendo dignidade às emoções e legitimidade ao inexplicável. Livres da prisão da modernidade, pode-se agora se confrontar com a capacidade ética da humanidade sem ilusões. Embora tudo isso não torne a vida moral mais fácil, diz Bauman, pode-se ao menos sonhar em torná-la um pouco mais ética.
(Extraído de minha dissertação de mestrado em filosofia: Ética protestante e pós-modernidade)

sexta-feira, 21 de setembro de 2007

Trajetória de Sucesso / Path to Success

“Não teve por usurpação ser igual a Deus. Mas aniquilou-se a si mesmo...” (Filipenses 2.6-7)

Jesus foi um grande mestre de espiritualidade. O maior que já viveu. Além de praticar o que ensinou, teve um modo de vida comprometido com o seu tempo. Por isso, convido você a pensar um pouco nisso.
Quem olhou para aquele berço onde Jesus nasceu, não poderia imaginar que ali estava alguém destinado ao sucesso. Uma pessoa que nasceu em um meio tão rude, de uma forma tão cercada de circunstâncias difíceis, não seria bem sucedida no curso de sua vida. Jesus nasceu de um modo muito difícil de se começar a vida. E ainda era da descendência de um Rei em um reino dominado.
Quem se encontrou com Jesus e com ele caminhou durante o seu ministério, diria que não tinha chance de alcançar sucesso em seu empreendimento. Abandonou a sua carreira profissional cedo, não tinha um patrimônio sólido nem renda fixa. Sua agenda de trabalho era imprevisível, não dava muita atenção aos relacionamentos mais fortes, como família e amigos mais chegados. Além disso, bateu de frente com a classe dominante, aqueles que poderiam garantir uma oportunidade de emprego e de estabilidade financeira.
Quem viu Jesus orar no Getsêmani e sentir a agonia da morte, não poderia dizer que ali estava um homem de sucesso. Sua opção de vida fora um fracasso. Escolheu doze homens para a sua equipe de trabalho de origem humilde, todos inexperientes e incapazes para a tarefa. Além disso, a maioria das pessoas estava contra ele. Naquele instante de oração, era como se estivesse dando um toque final, como se soubesse que tinha escolhido o pior caminho.
Quem olhou para a cruz e viu Jesus morrer só e humilhado entre dois ladrões, certamente não diria que ali estava uma pessoa que tinha alcançado o sucesso. Dificilmente alguém diria naquele instante doloroso que Jesus era um vencedor.
Mas a trajetória de Jesus desde o céu até a cruz, incluindo a manjedoura e o Calvário, foi uma trajetória de sucesso. Era necessário que ele padecesse como homem e como servo, para que eu recebesse a graça salvadora e pudesse me aproximar de Deus de forma livre. Nesse sentido, Ele cumpriu um propósito específico, consciente de que essa era a sua missão.
Por isso, o conselho que vem logo no início da narrativa bíblica é: “... haja em vós o mesmo sentimento que houve também em Cristo Jesus” (Fp 2.5). Pode ser que a sua trajetória também não esteja sendo de sucesso. Mas se você está focado naquilo para o qual é a tua missão de fato, não importam as circunstâncias. A marca do sucesso aparecerá afinal, por ter feito tudo aquilo que Deus gostaria que você fizesse.

quinta-feira, 20 de setembro de 2007

Espiritualidade e secularidade / Spirituality and secularity / Espiritualidad y el secularismo

A despeito do que muitos dizem sobre a crescente influência do secularismo, Peter Berger, em seu livro Um rumor de anjos, verifica que a espiritualidade nunca esteve tão presente na sociedade contemporânea. Ele chama a atenção para as marcas de transcendência presentes nas ações humanas. A análise desse fenômeno interessa para a formulação de uma teologia de características antropológicas.
Um ponto de partida que se mostrou viável para a teologia foi a compreensão de que os fenômenos religiosos são projeções humanas, produtos da história, construídas pelo homem. Esse ponto de partida não pode deixar de considerar que essas projeções humanas existem e são indicadoras de uma realidade verdadeiramente outra, que a imaginação humana reflete. Esse ponto de partida é antropológico, um empreendimento filosófico que se fundamenta na pergunta: “O que é o homem?”
Se as projeções religiosas do homem correspondem a uma realidade que é sobre-humana e sobrenatural, então parece lógico procurar vestígios desta realidade no próprio projetor. Não é para propor uma teologia empírica – o que seria logicamente impossível – mas antes uma teologia de sensibilidade empírica muito aguda que buscasse correlacionar suas proposições com o que pode ser empiricamente conhecido. Na medida em que seu ponto de partida for antropológico, uma tal teologia voltará a algumas das preocupações fundamentais do liberalismo protestante – sem, espera-se, a condescendência com os “eruditos desdenhadores da religião” e seus vários utopismos (BERGER, 1973, p. 69).
Peter Berger sugere, então, que o pensamento teológico procure descobrir o que ele chama de sinais de transcendência no âmbito da condição humana, compreendidos como fenômenos que se encontram no domínio da realidade natural, cotidiana, que apontam para além da realidade. Ele sugere que há “gestos humanos prototípicos” que podem constituir tais sinais, tal como a propensão para a ordem, de tal modo que, no centro do processo de tornar-se plenamente humano, podemos encontrar uma experiência de confiança na ordem da realidade. Outro sinal é o argumento da esperança, que consiste na orientação da existência humana para o futuro, na concretização de projetos. Um terceiro sinal é o argumento do humor, que reconhece a contraditória condição humana como cômica e, por isso, relativizadora.
Esses sinais de transcendência de nossa época são rumores de que o sentimento religioso não está ausente. Antes, a redescoberta do sobrenatural consiste em uma reconquista da abertura na percepção da realidade.
O benefício moral principal da religião é que ela permite uma confrontação com a época em que se vive numa perspectiva que transcende à época e assim a coloca em proporção. [...] Encontrar coragem para fazer o que se tem que fazer num dado momento não é o único bem moral. É também um grande bem moral que este mesmo momento não se torna o momento absoluto e final da existência, que, em aceitando suas exigências, não perde a capacidade de rir e brincar (BERGER, 1973, p. 126).

quarta-feira, 19 de setembro de 2007

Intolerância e fundamentalismo / Intolerance and fundamentalism / La intolerancia y el fundamentalismo

O fundamentalista religioso é aquela pessoa que acha que pode fazer aquelas coisas que ele por si mesmo pensa que Deus faria se estivesse em seu lugar. Geralmente, tem uma compreensão de um deus que é justo e sem misericórdia, irado e sem amor, onipotente e sem compaixão, onisciente e sem tolerância.
Por causa de sua forma de pensar, o texto sagrado que adota não tem entrelinhas. A língua morta em que o texto foi revelado por inspiração divina direta é o único fator relevante para a interpretação e aplicação literal e legalista para hoje e agora, a verdade absoluta e imutável. Não há espaço para análise crítica, para a contextualização, para a compreensão das verdades divinas à luz do contemporâneo.
O sonho do fundamentalista é implantar uma cidade de seu deus aqui na terra, um território santo e protegido contra as muitas artimanhas do inimigo. Um reino de paz e prosperidade para que os fiéis pratiquem livremente sua devoção, com leis e estruturas nacionais que se misturam com a religião oficial, verdadeiro oásis de tranqüilidade. Uma terra santa que tem por dever se expandir através da conquista de outros territórios dominados pelas trevas espirituais.
O deus do fundamentalista exige adoração absoluta, normas rígidas de conduta, veneração, obediência cega à voz de seus porta-vozes iluminados. Os que se dão de corpo e alma por esse deus tem lugar especial garantido no céu. Porém, quem não se submete a esse deus iracundo será alvo de sua eterna insatisfação. E os que a isso se opõem são condenados ao castigo reservado aos inimigos e, se possível, deveriam experimentar do furor desse deus já nessa vida aqui, para que pereçam em seus atos pecaminosos desde agora até a vida futura.
Quem se identifica com essa condição de fé não consegue tolerar outra verdade. A intolerância gera o preconceito, o preconceito gera a agressão até gerar o combate e todas as formas de guerras para se exterminar o suposto mal, sempre com inúmeras vítimas inocentes.
E pensar que o termo “fundamentalista” foi usado pela primeira vez por grupos evangélicos que queriam ser fiéis aos ensinos das Escrituras! Como conviver com isso? Adotando um exercício crítico de nossa fé. É preciso dar um basta na idéia da fé cega de faca amolada. É preciso compreender que o Deus vivo e verdadeiro se manifesta em meio a diversidade e a adversidade. “Mas Deus escolheu as coisas loucas deste mundo para confundir as sábias; e Deus escolheu as coisas fracas deste mundo para confundir as fortes. E Deus escolheu as coisas vis deste mundo, e as desprezíveis, e as que não são para aniquilar as que são” (1Co 1.27-28).
(Um texto antigo, da época do atentado de 11 de setembro. Parte das idéias aqui expostas estão no meu livro O que é religião, publicado pela MK em 2005.)

terça-feira, 18 de setembro de 2007

Religiosidade e pós-modernidade / Religiosities and post-modernity

Em seu O mal estar da pós-modernidade, Bauman identifica que a pós-modernidade é marcada por um surto de aconselhamento em função da insegurança existencial centrada na identidade individual. É a era dos especialistas em identificar problemas, daqueles que propõem soluções para a restauração da personalidade, dos que apresentam guias infalíveis para relacionamentos saudáveis, dos autores de livros de auto-ajuda.
Os homens e mulheres pós-modernos realmente precisam do alquimista que possa, ou sustente que possa, transformar a incerteza de base em preciosa auto-segurança, e a autoridade da aprovação (em nome do conhecimento superior ou do acesso à sabedoria fechado aos outros) é a pedra filosofal que os alquimistas se gabam de possuir (BAUMAN, 1998, p. 227).
Essa incerteza não gera a procura pela religião, mas a procura de especialistas de identidade. Os homens não precisa mais de pregadores que lhes apontem suas fraquezas e insuficiências humanas. “Eles precisam da reafirmação de que podem fazê-lo – e de um resumo a respeito de como fazê-lo” (BAUMAN, 1998, p. 222). Em lugar de promover a experiência vivida pelos “aristocratas” da tradição religiosa, a pós-modernidade coloca ao alcance de cada indivíduo uma perspectiva de auto-aprendizado dessa experiência religiosa. Em lugar de celebrar a fraqueza humana, a concepção pós-moderna pressupõe a capacidade infinita de realização humana. A versão religiosa da pós-modernidade visa à reconciliação do fiel a uma vida de prosperidade e de sucesso organizada em torno do dever de um consumo devotado e contínuo, ao contrário da experiência anterior, notadamente pietista, que visava à reconciliação do fiel com uma vida de privações e de ideal ascético.
Os exemplos e profetas da versão pós-moderna da experiência máxima são recrutados da aristocracia do consumismo – aqueles que conseguiram transformar a vida numa obra de arte da acumulação e intensificação das sensações, graças a consumir mais do que os que procuram comumente a experiência máxima, consumir produtos mais refinados e consumi-los de um modo mais requintado (BAUMAN, 1998, p. 224).
Das contradições da vida pós-moderna, surge uma forma de religiosidade que se caracteriza como uma oferta de racionalidade alternativa aos problemas gerados pela insegurança das escolhas. O fundamentalismo consiste na promessa de uma autoridade, de um olhar orientador, que dá consistência às decisões da vida que devem ser tomadas. Num mundo de fragmentações e diversidade, o fundamentalista tem coragem de dizer a maneira como se deve decidir de maneira que essa decisão encontre uma justificação segura. O fundamentalismo religioso faz parte de um conjunto de soluções totalitárias oferecidas como alternativa à desilusão da liberdade individual excessiva da pós-modernidade. “O fundamentalismo é um remédio radical contra esse veneno da sociedade de consumo conduzida pelo mercado e pós-moderna – a liberdade contaminada pelo risco (um remédio que cura a infecção amputando o órgão infeccionado – abolindo a liberdade como tal, na medida em que não há nenhuma liberdade livre de riscos)” (BAUMAN, 1998, p. 228).
(Extraído de minha dissertação de mestrado em filosofia)

segunda-feira, 17 de setembro de 2007

O que é espiritualidade? / What is spirituality? / ¿Qué es la espiritualidad?

O tema é recente. Mas nem tanto assim. Já foi tratado como religiosidade. Já esteve ligado ao esoterismo. Já foi coisa de fanático. Hoje, está relacionado a tudo o que diz respeito às formas do cuidado de si, ao modo como o sujeito se constitui.
Não é um tema que fascina ao cristianismo, por assim dizer. Tanto que pouco se fala em uma espiritualidade cristã. Mas, se há uma religião que pode tratar da questão da espiritualidade, é o cristianismo. Em outra época, esse tema era chamado entre os cristãos de santidade, discipulado, maturidade. Termos não muito aplicados a uma sociedade a-religiosa, pra usar um termo de Bonhoeffer.
Para a filosofia contemporânea, o ser humano é autotranscendente e expressa essa condição através de formas simbólicas. A religião é resultado disso. Para pôr ordem o modo de entender o mundo, o dividimos em dois: o sagrado e o profano. A maneira como nos relacionamos com o sagrado são da esfera da espiritualidade.
Mas você pode argumentar: a sociedade atual abriu mão do sobrenatural e se caracteriza hoje como uma sociedade secularizada. Pare para pensar sobre o modo como tratamos determinados assuntos. A maneira como organizamos e atribuimos valor nas nossas relações entre o público e o privado, a maneira como sacralizamos a nossa privacidade ou os nossos relacionamentos mais íntimos, o modo como tratamos com bom humor os obstáculos e barreiras que se apresentam em nossa carreira, o valor que atribuímos à noção de verdade, justiça, dignidade.
A verdade é que a espiritualidade contemporânea aponta para uma ética. Diria até que essa ética está relacionada a uma estética da existência, à maneira como manifesto o meu modo de ser para os outros.
Por isso que o tema da espiritualidade é tão relevante para hoje, porque diz respeito ao modo como nos constituímos como pessoas, ao modo como pensamos a nossa realidade, ao modo como atribuímos valor às coisas com as quais nos relacionamos.
Espiritualidade é, portanto, uma expressão humana, é uma atitude frente aos conflitos inerentes à própria condição humana. E está mais presente em nosso dia-a-dia do que podemos imaginar. Esse foi um assunto que interessou a Jesus Cristo. Ele deixou ensinamentos sobre como pôr em ordem o nosso mundo interior e como encarar o conflito da condição humana de maneira inovadora, que valem para hoje.
Para finalizar, diria que a espiritualidade tem a ver com a necessidade que sentimos de ser feliz, de encontrar o sucesso e a realização plena. Se é isso que você procura, continue essa caminhada com a gente.

domingo, 16 de setembro de 2007

O que é filosofia? / What is philosophy?

Se vamos ter uma caminhanda em que a filosofia é o foco de nossa reflexão, a pergunta é: o que é filosofia? Embora você possa ter uma idéia formada sobre esse assunto, quero adiantar que não é uma pergunta fácil de ser respondida. Aliás, ninguém, em quase 2.800 anos de história da filosofia conseguiu respondê-la satisfatoriamente.
Gilles Deleuse tentou responder a esta pergunta. Mas ele tentou responder apenas num momento em que se achava experiementado o suficiente para o fazer. Não é isso que quero fazer aqui. Esta não é uma questão que se responda de pronto. Não há uma resposta objetiva para ela. Desde Pitágoras, para quem o filósofo era um amante da sabedoria, esta pergunta tem sido feita ao lado ou acompanhado de uma outra: pra que serve a filosofia?
Filosofia é o pensamento que se pensa. Esta é uma idéia clássica para um início de conversa. Para Platão, é a alma pensando em si mesma; pra Heidegger, filosofia é pensamento. Quando meus alunos me perguntam sobre o que é filosofia, tenho até uma resposta pronta: é uma inquietante pergunta pela vida.
E meus alunos, já filósofos de plantão, reagem com outra questão: mas o que é a vida? Aí, lembro de Dominico de Masi que, ao receber essa mesma indagação, responde: é caminhar na direção do outro.
Embora essa questão não possa ser respondida satisfatoriamente, dá pra se saber, pelo menos, o que não é filosofia: não são elocubrações, não são generalizações, não são sistemas de pensamento, não é estilo de vida, não são doutrinas.
Dá pra se saber também pra que serve a filosofia: para exercer uma reflexão crítica da realidade.
Dá pra se perceber ainda que a filosofia é uma atitude em que o pensamento analisa radicalmente a complexidade da realidade, numa busca incessante pela verdade.
Dessa forma, a filosofia é uma atitude que diz respeito à minha condição humana. É próprio do homem filosofar, embora seja doloroso. Vista assim, a filosofia passa a ser uma necessidade, uma vez que todos nos deparamos com o grande motivador dessa atitude: a finitude. Pela maneira como reagimos a isso, à finitude, definimos ações, modos de pensar, visão de mundo, relacionamentos. Por isso o princípio socrático de que filosofar é aprender a morrer.
Bem, essa é uma questão que precisaremos voltar. Um dia.

sábado, 15 de setembro de 2007

O que significa ser fundamentalista / What is fundamentalism?

Desde o começo de minha vida cristã tenho ouvido falar de "fundamentalistas". Acho que ainda não me deparei com nenhum deles. Pelo menos não que eu saiba. Outro dia mesmo andei interessado em achar um. Até que andei procurando, mas ninguém soube me dizer onde eles estão exatamente. Podem estar em qualquer lugar. Podem dar em árvore. Podem nascer de repente e podem ir embora da mesma forma.
Eu já ando meio desconfiado que fundamentalista não existe entre os cristãos. Ou os que ainda possam existir sorrateiramente estão como espécie em extinção. Os únicos exemplares que conseguiram me mostrar, nessa busca por um fundamentalista típico, eram oriundos de religiões como islamismo, budismo, hinduísmo. O cara que detonou a bomba que estava presa a seu corpo no meio da pizzaria de Jerusalém é um exemplo de fundamentalista. O sujeito que soltou aquele gás no trem japonês. Aquele pessoal de uma religião estranha lá na China. A milícia talibã no Afeganistão. Tudo isso é fundamentalismo em profusão.
Teve até uns fundamentalistas cristãos que morreram. Jim Jones e alguns grupos que promoveram suicídio coletivo. Isso me faz desconfiar que não há muito espaço para o fundamentalismo no meio cristão. O nosso solo não é muito próprio para esse tipo de semente. Logo ela se autodestrói.
Sendo assim, cheguei à conclusão que, aquilo que chamam de fundamentalismo cristão, deve ser algo assim parecido com zelo exagerado, uma certa dose de auto-afirmação, uma ponta de fanatismo ou mesmo uma vontade de acertar remando contra a maré. O que me deixa triste é que ainda tem gente que tem pose de fundamentalista, parece com fundamentalista, cheira a fundamentalista, mas se nega a ser um deles. É bom que se diga que o uso do termo começou entre cristãos piedosos que se afirmaram fundamentalistas. Eram os fundamentalista de carteirinha.
Bem, seja lá o que for, o negócio é que se trata de um rótulo a mais que não cai bem dentro do cristianismo. Aliás, o nome "cristão" é tão completo e profundo que não cabe nenhum sobrenome do tipo conservador, renovado, tradicional, moderado, nominal, carismático, ortodoxo, avançado, autêntico, liberal, retrógrado, contemporâneo ou mesmo fundamentalista.
Até mesmo uma tentativa de sair por aí caçando quem é fundamentalista passa a ser também uma espécie de fundamentalismo. Como se tornou o mal do século - ou da virada de milênio - o fundamentalismo passou a ser uma expressão de crer. Tem até ateu fundamentalista!
Portanto,

sexta-feira, 14 de setembro de 2007

Por que Filosofia? Por que Espiritualidade? / Why philosophy? Why Spirituality? / Filosofía y espiritualidad

Tenho me dedicado há cerca de cinco anos aos estudos filosóficos propriamente dito. Minhas leituras, meus estudos, todos estão relacionados aos temas que mais diretmente tocam o campo da reflexão filosófica. Mais especificamente, me interessa o campo da ética e sua relação com a produção de sentido. Meus estudos de pós-graduação dizem respeito à formulação de uma reflexão ética dentro do contexto da pós-modernidade e da teologia protestante.
Talvez você possa até perguntar sobre o que uma coisa tem a ver com a outra. Mas, depois de me dedicar por 20 anos aos estudos teológicos e ao ministério pastoral, chego à conclusão de que meus primeiros questionamentos se tornaram urgentes em tempo de crise ética. Desde o começo de minha caminhada teológica, tenho me deparado com uma crise que cerca a vida religiosa e que me aponta para uma necessidade de reflexão. Tenho para mim que a crise pela qual o cristianismo passa é uma crise ética, que está ligada ao ao m odo como os cristãos desse tempo afirmam sua fé e tornam o seu modo de ser visível para o outro.
Vivemos em uma sociedade que tem se acostomudo a conviver com a hipótese de um Deus ausente. O ateismo tem sido ensinado como uma crença, associada a uma nova moralidade caracterizada pelo hedonismo e por uma atitude narcisista. E aquilo que serviu de base para a fé, tem sido ministrado dentro de princípios fundamentalista por líderes religiosos cada vez mais destituídos de caráter e compromisso com aquilo que eles mesmos professam.
Neste espaço, espero compartilhar com vocês minhas impressões e preocupações e receber críticas e sugestões de caminhos para uma reflexão saudável sobre esse tema. Convido você para essa caminhada.

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