domingo, 17 de janeiro de 2016

Uma igreja para hoje / A church for today / Una iglesia para hoy

Fiel é Deus, o qual os chamou à comunhão com seu Filho Jesus Cristo, nosso Senhor.” 1 Coríntios 1.9 
A pergunta que quero deixar como orientação para está série de reflexões é: se fôssemos os últimos cristãos da história, que legado a igreja de hoje deixaria? Qual seria a contribuição mais significativa para as pessoas de nosso tempo? Tomemos como princípio o fato de que a igreja primitiva de Corinto é o arquétipo para a igreja de hoje. As condições de vida em sociedade, as dificuldades de relacionamento entre os cristãos, os problemas de compreensão da fé e até os conflitos entre princípios de liderança lembram bem algumas das situações vividas pela igreja na contemporaneidade.
Paulo endereça sua primeira carta aos coríntios da seguinte maneira: “à igreja de Deus que está em Corinto [...]” (1 Coríntios 1.2). A ideia é de que a igreja não pertence ao lugar, mas que se encontra ali presente, com uma missão específica. Paulo tinha uma visão missionária. A igreja é aquela instituição que está situada em um lugar, mas com sua visão voltada para o mundo.
Corinto era uma cidade grega importante estrategicamente. Era uma metrópole, um centro de irradiação política, econômica e intelectual. Por causa de sua localização, tornou-se um importante centro comercial, com dois portos que atendiam toda a Europa, Ásia e Norte da África. Era também um importante centro cultural. Ali tanto estavam presentes os valores elementares da cultura greco-romana, com seus lugares de adoração, reflexão e produção de saberes, como também tinha uma convivência harmoniosa com as diversas expressões culturais dos povos com quem se relacionavam. Corinto atraía gente do mundo inteiro que ali se relacionavam, interagiam e compartilhavam suas experiências.
A igreja em Corinto foi organizada pelo apóstolo Paulo em sua segunda viagem missionária, logo após sua saída de Atenas (Atos 18). Juntamente com Áquila e Priscila, Paulo anunciou o Evangelho aos coríntios. A eles se juntaram Silas e Timóteo, logo depois. Dali, Paulo partiu para Éfeso, retornando assim a Jerusalém. Há poucos relatos sobre a vida da igreja de Corinto, mas sabe-se que, de Éfeso, Paulo enviou Apolo para lá com uma carta de recomendação.
À essa igreja, Paulo destinou pelo menos quatro cartas, das quais conhecemos apenas duas, que são as que fazem parte do cânon do Novo Testamento. Até mesmo a que chamamos de Primeira Carta aos Coríntios na verdade foi a segunda. Houve uma anterior que suscitou diversos questionamentos e problemas, os quais foram enviados a Paulo sob a forma de perguntas.
No final do século I, Clemente de Roma, considerado o quarto bispo de Roma, escreve uma carta aos coríntios, na qual se dirige da seguinte forma: “A Igreja de Deus estabelecida transitoriamente em Roma à Igreja de Deus estabelecida transitoriamente em Corinto [...]”. O termo grego empregado para se referir à igreja como uma comunidade “estabelecida transitoriamente” é paroikia que, no Novo Testamento – especialmente em 1 Pedro –, quer dizer “em peregrinação”. Lembra que a condição da igreja está mais para a de um estrangeiro ou alguém no exílio, do que alguém que pertence ao lugar como um cidadão.
Clemente de Roma recomenda a que os cristãos de Corinto leiam novamente a primeira carta que Paulo havia escrito. Os problemas enfrentados por aquela igreja havia repercutido em todas as demais igrejas do Ocidente. “Uma vergonha, meus caros, uma vergonha muito grande e indigna de uma conduta em Cristo ouvir-se que a igreja dos coríntios, tão inabalável e antiga, se rebele contra os presbíteros por causa de uma ou duas pessoas” (47.6), disse Clemente de Roma.
O tempo exerce um domínio sobre a vida. As relações podem se tornar cristalizadas, conceitos podem ser esvaziados, valores podem ser mudados e até palavras podem mudar sentido. Atualizar a linguagem, rever os conceitos e valores e até desenvolver novas relações passam, então, a serem exercícios permanentes para quem deseja ser relevante para seu tempo, para quem tem uma mensagem a ser proclamada e para quem deseja exercitar uma dinâmica de vida contextualizada, que faça sentido para hoje.
Para se tornar uma igreja relevante para este tempo, a igreja precisa sair da defensiva para exercer uma postura mais criativa historicamente. Isso implica que precisamos abandonar o que nos prende a um passado do qual ainda temos saudade, para nos voltarmos para as necessidades atuais.
A igreja de hoje tem sido marcada por tendências que remontam a um estilo de vida mais rural que urbano, a uma moralidade mais medieval que pós-moderna e a um discurso mais apologético que comunicativo. Esta realidade reafirma uma relação dualista, que divide o mundo em profano e sagrado, aqui e além, dentro e fora, incluído e excluído. Essa característica provoca toda forma de distorção, quer seja no campo teológico-doutrinal, quer seja no campo litúrgico ou mesmo nas relações morais.
A igreja para hoje, no entanto, precisa ser identificada como a comunidade daqueles que são chamados para a comunhão com Jesus Cristo. Precisa assumir o fato de que é a nova humanidade formada por aqueles em quem Jesus Cristo toma forma e se faz presente na história. Os cristãos para hoje são aqueles que tornam a mensagem e a vida de Jesus compreensível para os que vivem conosco neste tempo. E essa deve ser a nossa missão.

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