Giorgio Agamben já tem falado
sobre como o paradigma do estado de exceção tornou-se uma técnica normal de
governo, ultimamente, dentro das sociedades democráticas. O desfecho do caso
Lula no TRF-4, no último dia 24 de janeiro de 2018, é um exemplo disso. A
decisão em si não é uma surpresa. O que é surpreendente foi a forma dura com
que as penas foram tratadas. A análise jurídica do fato acompanhou o
entendimento do juízo de primeira instância e do Ministério Público, a despeito
de todos os comentários contrários de juristas respeitáveis, e ainda majorou a
pena a 12 anos e 1 mês
A condenação de Lula em segunda
instância e o agravamento da pena tem um recado claro para a sociedade
brasileira: quando a senzala ocupa a casa grande, os senhores de engenho agem
com mão de ferro. A condenação é
parte de um esquema oligárquico para evitar que políticos como Lula cheguem ao
poder. Não há vitoriosos nisso. Não há o que comemorar. É mais uma página
triste da história do Brasil.
Trata-se
de uma ação orquestrada das forças conservadores contra os segmentos mais progressistas.
Quem está coordenando essa ação contra as forças de esquerda são os que
representam os verdadeiros corruptos, que carregam malas de dinheiro, que têm
conta nos paraísos fiscais e que se perpetuam nos cargos públicos. E as
ilicitudes de quem está ocupando os cargos públicos atualmente não recebem o
mesmo tratamento. O judiciário, fazendo uso de suas atribuições, acendeu um
perigoso estopim, de consequências imprevisíveis.
A ação do judiciário tem sido a
base para sustentar a tese de que o maior esquema de corrupção aconteceu
durante os governos do PT e que Lula foi o grande articulador de todo o esquema
para isso. A luta contra a corrupção se tornou uma cortina de fumaça para encobrir
as ações que retiram direitos dos trabalhadores, aumentam a desigualdade social
e ameaçam a previdência.
A decisão interfere diretamente
no cenário eleitoral deste ano. O objetivo é de neutralizar as futuras
tentativas da esquerda, especialmente do PT, de retornar ao poder pelas vias
democráticas. E a razão está nas políticas sociais implementadas quando a
esquerda foi governo, que contrariavam os interesses políticos e econômicos
daqueles que detém o controle dos meios de produção de riqueza.
É inequívoca a relação entre os
acontecimentos no cenário político nos últimos quatro anos: o início da
operação Lava Jato focalizando contratos com a maior empresa do país em ano
eleitoral, com a incriminação de apenas um partido político; a tentativa de impedir
o reconhecimento da vitória desse partido nas eleições de 2014 por parte do
candidato derrotado; a eleição de Eduardo Cunha para a presidência da Câmara
dos Deputados que coordenou uma ação manipuladora para inviabilizar a direção
econômica do país (a chamada “pauta bomba”); o processo de impeachment da presidente eleita por alegados crimes fiscais que
restaram não comprovados; e agora a condenação do fundador do PT e
ex-presidente do país por um conjunto probatório típico dos regimes de exceção.
A mesma justiça que interfere nos
rumos da esquerda, se torna complacente com os atos da direita. A maneira como ela
vem lidando com evidências de malas de dinheiro, contas em paraísos fiscais,
compra de votos no Parlamento e aparelhamento de órgãos de investigação
evidencia que a Justiça brasileira tem lado e está atenta a defender a manutenção
dos interesses de uma oligarquia dominante.
A condenação de Lula não é um
caso isolado. É parte de uma tendência histórica do judiciário: garantir a
manutenção no poder um segmento que sempre viveu à sombra do Estado. Isso foi
feito na Inconfidência Mineira, na repressão aos movimentos contrários ao modo
como se deu a independência, na resistência à proclamação da república oligárquica,
na condução do golpe de 1964 e da retomada democrática, no modo como o STF se
posicionou ao lado do impeachment de
2016.
A
mão pesada da justiça, quando aplicada de forma desigual, demonstra que ela tem
lado – o mesmo lado de quem oprime. Excesso de justiça também é injustiça. Justiça
com espetacularização é inquisição. Justiça que tem lado é ditadura. Justiça
que culpabiliza em nome de um conservadorismo é exceção.
O
paradigma do estado de exceção a que Agamben se refere, e que mencionamos no
início, não é uma ruptura com a ordem democrática e constitucional, mas o uso
de mecanismos de segurança e proteção que direcionam a sociedade a um regime
totalitário. A história vai mostrar o equívoco que se comete no Brasil de hoje.
Como já está mostrando no caso do impeachment,
em que uma quadrilha tomou o poder para retirar direitos dos trabalhadores e
entregar o país aos estrangeiros. Apesar dos evidentes casos de
corrupção, continua mantida em seus cargos.
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