Uma família é
muito mais que a soma de individualidades. É o espaço para vivermos nossa
condição de pessoas em meio a outras pessoas. Por conta disso, é lugar de
tensões que provocam conflitos de toda ordem. Quem nunca se perguntou: Por que
a minha família é desse jeito? Ou: Por que a minha família é diferente das
outras? Ou ainda: Por que a minha família não é normal?
O fato é que
toda família está sujeita a situações que causam estresse, mudanças, rupturas
ou perdas em algum momento, mas isso não faz de nenhuma família imperfeita. Porém,
podemos afirmar que a família perfeita não existe como modelo a ser imitado, ao
mesmo tempo em que podemos afirmar que a normalidade da família é exatamente o enfrentamento
das suas condições de organização e existência.
Recentemente,
estudiosos têm desenvolvido o conceito de família disfuncional, que é aquela em
que seus membros encontram formas de tratarem as situações de conflito, de
conduta e até de abusos que acontecem de forma continuada na vida familiar. A
família é compreendida como um sistema que abriga em si vários subsistemas. No
seu funcionamento, ela integra influências internas e externas, com a
capacidade de se auto-organizar e de desenvolver relações dinâmicas, coerentes
e consistentes entre seus membros. O termo deriva do conceito funcionalista de
família, como parte do todo social.
Como se forma
a família disfuncional? Normalmente, no histórico da família disfuncional podem
ocorrer transtornos de ordem psicológica, problema com vícios e compulsões,
abuso de poder, comportamento controlador, ciúmes, falta de responsabilidade, falta
de limites, distanciamento, falta de afetuosidade, abusos, maus tratos,
dificuldades de comunicação, falta de confiança, baixa autoestima, expectativas
equivocadas e até excesso de exigências por parte de algum membro da família.
São conflitos
que estão alojados em nosso inconsciente e que afloram constantemente
provocando crises e repetições que afetam nossas relações. Como pessoas,
estamos envolvidos numa rede de relações, que implicam uma gama enorme de
estruturas e sistemas integrados, que acabam influenciando diretamente nossa
ação. Ao mesmo tempo, somos movidos por atitudes conscientes e inconscientes. Par
amplia a percepção de nossa realidade, precisamos levar em conta que cada
família tem suas próprias regras para funcionar corretamente que, se não forem
respeitas, provocará situações complexas e dolorosas que demandará cuidado.
A família é
lugar de enfrentamento de seus medos, carências emocionais, traumas, relações
problemáticas e tensões que têm sua origem no nosso próprio histórico familiar.
Para tratar dessa questão, o psicoterapeuta alemão Bert Hellinger desenvolveu um
conjunto de práticas que envolvem o que chamou de “As ordens de amor”, que são
três.
a) A ordem do
pertencimento – todos os membros da família têm direito a pertencer ao sistema
familiar. Se alguém for excluído, outro ocupará o seu lugar.
b) A ordem da
hierarquia – os que chegaram antes estão acima dos que chegam depois. O casal,
por exemplo, chegou antes dos filhos.
c) A ordem do
equilíbrio – só podemos oferecer aquilo que recebemos. A relação saudável da
família está na garantia de dar e receber em condições de igualdade.
Uma família
saudável é aquela em que seus membros colaboram com uma consciência livre. Num
contexto familiar, que Hellinger chamou de comunidade de destino, as pessoas
possuem vínculos entre si, em que todos estão ligados a todos. Os vínculos mais
fortes são aqueles que ligam pais filhos, irmãs e parceiros entre si. São esses
vínculos que alimentam expectativas, esperanças e temores diante das situações
enfrentadas, sejam elas de estresse, mudanças ou até mesmo perdas.
No seu livro Ordens do amor, Hellinger assim se expressa:
“Na comunidade de destino, constituída pela família e pelo grupo familiar,
reina, portanto, em razão do vínculo e do amor que lhe corresponde, uma
necessidade irresistível de compensação entre a vantagem de uns e a desvantagem
de outros, entre a inocência e a sorte de uns e a culpa e a desgraça de outros,
entre a saúde de uns e a doença de outros, e entre a vida de uns e a morte de
outros. Em razão dessa necessidade, se uma pessoa foi infeliz, uma outra também
quer ser infeliz; se uma ficou doente ou se sente culpada, uma outra, saudável
ou inocente, também fica doente ou se sente culpada; e se uma morreu, outra,
próxima a ela, também deseja morrer”.
O papel da
família é manter um sistema familiar completo, preservar a integridade e
assegurar a inclusão da totalidade de seus membros. Uma família saudável é, portanto,
aquela que tem uma consciência mais ampla e que, por isso mesmo, se torna capaz
de inclusão, integração e reconciliação dos diferentes componentes da família.
Não que ela seja perfeita, mas porque se torna um espaço terapêutico para lidar
com o que causa tensão.
Para que a
família se transforme num espaço terapêutico, é preciso que seus membros abandonem
velhos paradigmas e desenvolvam um espírito aberto para novas experiências. É
preciso ter coragem para encarar sua própria história com respeito e aceitação,
com gratidão por pertencer a esse sistema que é sua própria família. É preciso
levar em conta que a família se reveste do sagrado, visto que é nela tivemos
acesso ao direito à vida.
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