O salmista declara que há uma voz que vem sendo silenciada que emerge do meio da Criação: “Sem discurso nem palavras, não se ouve a sua voz” (Salmos 19.3). É uma voz sufocada que vem de todas as criaturas que apontam para o Criador. Essa voz que vem da Criação é a voz do próprio Criador que clama pelo cuidado com os que sofrem com o avanço da degradação da vida no planeta e do aumento da desigualdade social.
É preciso que todas e todos se
unam para fazer ressoar essa voz “por
toda a terra, e as suas palavras, até os confins do mundo” (Salmos 19.4). A
Criação é a primeira e mais eloquente forma de Deus se revelar. Quando ouvimos
essa voz que vem da Criação, compreendemos quem somos, onde estamos e qual é o
nosso compromisso como cooperadores de Deus.
É urgente unir as vozes de
cristãs e de cristãos de todo o mundo em um clamor pela proteção de nossa casa
comum, em defesa dos pobres e dos que são excluídos. A oração em favor de toda
a criação Corresponde a um despertar em defesa da vida como proclamadores das Boas
Novas para toda a Terra.
De todas as partes, de todos os
povos, de todas as nações e em todas as línguas, é possível ouvir o grito de
cada pessoa, de cada comunidade, de cada bioma, de cada espécie que tem sido
silenciado pela exploração provocada pela ganância e pelo consumo desenfreado.
São vidas que estão ameaçadas pela perda das condições mínimas de sobrevivência
por causa das mudanças climáticas.
Escutar a voz da Criação exige um
tipo de escuta que envolve nossa sensibilidade em ouvir os modos em que Deus
fala conosco. Santo Agostinho escreveu que a Criação “é a página divina que
você deve escutar; é o livro do universo que você deve observar. As páginas da
Escritura só podem ser lidas por aqueles que sabem ler e escrever, enquanto
todos, mesmo os analfabetos, podem ler o livro do universo” (apud Tempo da Criação: Guia de celebração
2022, p. 7). Martinho Lutero também pregou que o Evangelho não foi apenas escrito
em livros “mas também em árvores e outras criaturas” (idem).
Através desse exercício de
escuta, é possível desenvolver uma nova espiritualidade que implica a percepção
da verdade, a virtude da bondade e as expressões de beleza presentes na vida do
outro, das relações comunitárias e da natureza. Somos também conduzidos a
experiência de tomada de consciência de quem Deus é e como ele vem a nós, como
Trindade santa, na qual todas as coisas existem e se movem. Como afirmou o teólogo
alemão Jürgen Moltmann: “Deus cria, reconcilia e redime sua criação por meio do
Filho. Na força de Espírito, Deus está presente na sua criação, na
reconciliação e na redenção da criação” (Dios
en la creación, p. 29).
A Bíblia nos diz que toda a
natureza geme. “Sabemos que toda a
natureza criada geme até agora [...]” (Romanos 8.22). É possível ouvir nos
dias atuais o clamor que nos interpela a refletir a respeito dos modos como
conduzimos nossa própria vida. Algo precisa ser feito para mudar o rumo de
nossa história, que aponta para um fim trágico. Cuidamos da natureza e uns dos
outros porque amamos ao Deus da Criação.
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