Quando a gente passa por situações que demandam muito estresse, angústia
e desilusão, é muito comum se perguntar qual o sentido da vida. Qual o sentido
da vida? Eu tenho uma resposta boa e uma ruim para essa pergunta. A ruim é que
a vida não tem um sentido. O que faz a vida ter sentido é viver. A boa é que,
na medida em que vivemos, a vida vai ganhando novos contornos a partir das
relações que construímos.
Não acho legal ficar procurando o sentido da vida, até porque o bom da
vida está ligado às coisas que construímos e que sonhamos. Perguntar pelo
sentido da vida é levantar a questão antiga da filosofia sobre a existência.
Ela tem a ver com a nossa realidade individual concreta, que não dá para ser
explicada ou demonstrada, mas que pode ser descrita e a partir da qual podemos
estabelecer juízos de valor.
Aristóteles já dizia que a existência é um atributo do ser. É o fato de
que você é aquilo que é. O problema é que a existência está vinculada
imediatamente a uma essência. Ou seja, você é o que é na medida de suas
circunstâncias.
A Modernidade procurou relacionar o sentido da existência à racionalidade.
Descartes afirmou “Penso, logo existo” como se a existência dependesse do
pensamento ou como se a base para se compreender a existência dependesse da
razão. Espinosa, crítico de Descartes, disse que a existência implica um
esforço. O que chamou de conatus ou o
esforço de existir é uma característica do próprio ser. Hegel, de novo, tentou
demonstrar que tudo o que é real é racional e tudo o que é racional é real. Mas
ficaram de fora os aspectos imponderáveis de nossa existência.
Foi Kierkegaard quem se revoltou contra essa crença moderna de que a
razão pode dar conta de todos os aspectos relacionados à vida, sejam eles
morais, religiosos, políticos ou estéticos. Para Kierkegaard, a existência
humana é marcada por três estágios que envolvem uma tentativa de resgatar a
integridade do ser humano como uma pessoa que é capaz de fazer escolhas, que se
angustia e que também se desespera. O primeiro estágio é o estético, aquele que
é orientado pela aparência e pelo desejo numa busca de uma afirmação de si. O
segundo estágio é o ético, que é orientado pelo valor e pela moral, procurando
encontrar seu lugar na vida social. Porém, esses estágios não são suficientes
para dar conta de nossa própria condição, resultando em um vazio. Para dar
conta desse vazio, Kierkegaard propõe o salto da fé, que é assumir o que se é
diante de Deus. É em meio a esse vazio que o homem encontra formas de rever
seus valores e suas relações. Quando chega a esse ponto, encontra-se no estágio
que Kierkegaard chama de religioso, que é aquele em que se torna possível
reconhecer o valor de sua própria existência.
Heidegger, já no começo do século XX, entendeu que a existência é
marcada por uma busca de sentido, um problema que nunca foi resolvido na
filosofia. Ele construiu a noção do ser-aí, que é conhecido pela palavra alemã
“dasein”. Embora o ser não possa ser definido em sua essência, é possível
compreendê-lo a partir de sua relação recíproca como ser-no-mundo. Nesse
sentido, a existência humana é dotada de um certo privilégio, pois é cercada
por um senso de responsabilidade e de liberdade. A existência humana é marcada
pela nossa mundanidade, pela nossa capacidade de transcendência, pela nossa
temporalidade e pela nossa finitude. O ser humano está sempre diante da
possibilidade de tornar-se algo, de projetar-se para além do que é, de
encontrar vínculos entre o que já foi e o que ainda será, e de realização em
meio à sua própria incompletude.
Por essa razão, Sartre afirmará que a existência precede e determina a
essência. É, portanto, a nossa realidade que não dá para ser reduzida a uma
mera explicação causal, mas que dá para ser percebida e analisada a partir de
suas situações concretas. Nós nunca encerramos em nós mesmos a totalidade, mas
estamos sempre abertos a novas possibilidades. Como disse o filósofo
existencialista cristão Gabriel Marcel: “Existir é coexistir”.
O salmista se depara com esse dilema e registra: “Quando contemplo os
teus céus, obra dos teus dedos, a lua e as estrelas que ali firmaste, pergunto:
Que é o homem, para que com ele te importes? E o filho do homem, para que com
ele te preocupes?” (Salmos 8.3,4). Não há uma razão lógica para
isso. Está acima de todas as razões, como diria Miguel de Unamuno. Para o
filósofo espanhol, enquanto houver vida em nós, se quisermos que ela possa
valer a pena, não devemos procurar justificação alguma para nosso estado de
luta interior, de incerteza e de anseio: “é um fato e basta”.
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