A fé e a política são concepções
distintas, mas que estão inter-relacionadas e são complementares
uma a outra. A fé, para ser validada, precisa ser expressa em termos
de ações concretas na direção do outro, de tal modo que, sem
isso, não passa de um exercício vazio de significado. As atitudes
humanas vinculadas à fé se tornam mais significativas quando
realizadas em meio à dinâmica da vida social.
Trata-se de duas ações humanas que
se destinam a um mesmo propósito, que é o de trabalhar pela
realização humana. Ambas, quando estão interligadas, têm a ver
com a tentativa de tornar visível o modo como Deus está presente e
ativo ha história. Apesar disso, elas não são da mesma natureza.
Enquanto a fé é a busca pelo entendimento que liberta, a política
é a construção de caminhos para se chegar ao entendimento. Fé e
política, desse modo, se completam na medida em que visam a
superação do engano e o tratamento dos conflitos que envolvem a
construção da dignidade humana.
A fé, portanto, é um exercício
político. Optar por uma vida de fé é, em certa medida, fazer uma
opção política, visto que ela tanto pode validar um modo de
compreender que oprime quanto pode orientar o entendimento para a
busca de libertação. E desvincular a fé da política é uma
tentativa de aniquilar a própria natureza da missão. Por causa
dessa separação, pessoas sem qualquer temor ou caráter chegam ao
poder, e a religião se transforma em um território dominado por
falsos profetas.
A fé envolve tanto um esforço
individual para se inserir na vida comunitária quanto confere
identidade para a comunidade daqueles que partilham da mesma vivência
de fé. Vincular a fé e a política é uma necessidade que exige um
aprendizado a partir de uma escuta atenta do que afeta a vida do
outro e a vida comunitária, bem como de saber ouvir o chamado divino
para uma ação transformadora no mundo.
Uma vivência de fé que esteja
indiferente às formas de opressão, de exploração e de cerceamento
da liberdade acaba se tornando um instrumento de perpetuação e de
consolidação das estruturas que sustentam aquilo que oprime, que
explora e que cerceia a liberdade. Isso implica compreender suas
causas históricas, identificar os processos que as desencadeiam e
perceber os modos como elas se realizam de forma concreta na
sociedade.
A política não está desvinculada
da fé. Ela se sustenta por um sistema de crenças, valores e
princípios que visam dar direção às práticas e ações públicas
que estão voltadas para a promoção do bem comum. A relação entre fé e política
diz respeito a uma dialética que permite vivenciar historicamente
aquilo que só conseguimos visualizar espiritualmente. Via de regra,
achamos que a fé é própria do contexto religioso e que se limita a
ele, enquanto que a política está mais relacionada com a atividade
de instituições partidárias, de organismos cooperativistas e de
movimentos populares. Mas tanto no ambiente onde se vivencia a fé
quanto nos contextos das ações coletivas, fé e política se fazem
presente de forma inequívoca.
No contexto religioso, a fé precisa
estar comprometida com o projeto divino de salvar e libertar o humano
de forma integral de tudo o que o afasta e de tudo que distorce os
valores do Reino de Deus. Ela confirma esse seu comprometimento
através da celebração, do anúncio e da reflexão à luz dos
textos sagrados. Uma fé comprometida com o humano de forma integral
assume o papel profético de declarar o propósito divino para toda a
humanidade e de cumprir a missão divina de convocar e acolher a todo
aquele que atende ao convite amoroso do Pai para seguir os seus
ensinos. Da mesma forma, ela encoraja cada homem e mulher para serem
agentes de sua própria transformação e das mudanças que precisam
acontecer na vida social.
Isso, porém, não quer dizer que a
comunidade de fé tenha que interferir nas práticas que competem às
instituições políticas e nem que líderes religiosos tenham que
emitir pareceres sobre os segmentos da sociedade a partir de um juízo
de valor. Mas ele têm o dever de contribuir para a formação de
pessoas mais conscientes de sua cidadania e que sejam capazes de
superar todas as formas de alienação, a fim de que elas
protagonizem atitudes que promovam o bem comum, o bom senso e a
equidade.
A fé milita com valores que
norteiam a ação política, tais como a justiça, a liberdade e o
direito de cada pessoa viver dignamente. Sem isso, a fé não passa
de “ópio do povo”. Quando a fé e vivenciada em meio aos valores
que primam por uma sociedade mais justa, pelo exercício da liberdade
e pela defesa dos Direitos Humanos, ela se aproxima daquilo que
encontramos Jesus Cristo propor nos evangelhos.
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