Mais uma vez assistimos a uma
tragédia humana. Não, não foi uma tragédia ambiental, mas uma tragédia humana
provocada pelo crime cometido contra o meio ambiente. Tragédias ambientais são
provocadas por fenômenos naturais. O que aconteceu em Brumadinho no começo da
tarde de 25 de janeiro de 2019 foi provocado pela ação humana. Dois dias depois
do rompimento da barragem dos rejeitos da mineradora privatizada Vale, a contabilização
dos mortos cresce cada vez mais, o drama dos parentes dos desaparecidos aumenta
e os sinais de degradação da vida pela invasão da lama tóxica vão aparecendo de
forma dramática. Se compararmos com o acidente de proporções semelhantes de
Mariana em 2015, podemos dizer que se trata de uma tragédia anunciada.
A todo tempo, pela mídia e pelas redes
sociais, vão sendo apontados os possíveis culpados: uns dizem que são os
governos atuais que prometeram afrouxar as fiscalizações ambientais; outros
dizem que foram os governos anteriores que fizeram vistas grossas para a falta
de cuidado com as barragens. Sem tirar a razão dessas críticas, é preciso
voltar os olhos para outro ator. A verdadeira e única
culpada da tragédia de Brumadinho – que também o foi de Mariana em 2015 – é a
privatizada Vale, cujos acionistas e executivos financiam lobbies para cooptar
políticos, juízes e procuradores a fim de que estes facilitem a exploração do
homem e da natureza.
O crime ambiental tem sempre o mesmo
viés: é resultado de uma visão capitalista de produção, que é voltado para a
exploração da natureza visando a obtenção de lucro. A lógica capitalista obriga
a que empresas aumentem sua lucratividade reduzindo custos de exploração da mão
de obra para a extração da matéria prima da natureza logo no começo da cadeia
produtiva. Incentiva o uso de técnicas predatórias, isso para não falar do
emprego de venenos que destroem a natureza e comprometem a qualidade dos
alimentos.
Para essa ação, empresas nunca atuam
sozinhas. Contam com a falta de políticas públicas de preservação da natureza e
cuidado com a terra, com uma legislação frágil de regulação e de fiscalização das
atividades econômicas ligadas à vida e ainda com instituições reguladoras e fiscalizadoras
tomadas por pessoas comprometidas com interesses do capital. Esse cenário forma
um círculo vicioso que não permite punir o verdadeiro culpado. Numa sociedade
séria, os principais executivos da empresa responsável deveriam estar presos
preventivamente.
A extensão do estrago deveria ser, por
si só, motivo de punição: o Rio Paraopeba – que deságua no Rio São Francisco
que deságua no mar dos estados de Alagoas e Sergipe – teve suas águas
contaminadas num trecho de cerca de 220 quilômetros; a produção agropastoril da
região foi devastada por onde a lama passou afetando diretamente a economia;
áreas de preservação ambiental foram invadidas. Isso sem contar com o mais
trágico: vidas soterradas, a maioria de trabalhadores da mineradora em questão.
Fazendo mau uso do trocadilho, a vida não vale nada para a Vale.
Não são poucos os estudiosos de várias
áreas que alertam para o risco que a humanidade enfrenta. Pela primeira vez na
história humana, estamos diante da ameaça de extinção da humanidade em que o
principal responsável é o próprio ser humano. O episódio de Brumadinho, como o
de Mariana e outros crimes ambientais em diversas partes do planeta, é um sinal
de que o alerta precisa ser levado a sério. Ou mudamos a forma como lidamos com
a natureza ou a humanidade sofrerá danos irreversíveis.
(Foto: Folha de São Paulo)
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