domingo, 18 de abril de 2021

Jesus e as sinagogas / Jesus and the synagogues / Jesús y las sinagogas

 

Ensinava nas sinagogas, e todos o elogiavam” (Lucas 4.15).

Jesus usou os espaços religiosos de seu tempo para `compartilhar a sua mensagem. Ele o fez como um cidadão, como um religioso e como o Messias. Jesus participava de uma comunidade e praticava uma religião. Ele era da região da Galileia, da pequena cidade de Nazaré, e era um judeu.

Embora os evangelhos façam menção diretamente às sinagogas de Cafarnaum e Nazaré, duas cidades da região da Galileia, Jesus estava familiarizado com a frequência a esse espaço de devoção do judaísmo.

As sinagogas são espaços de devoção e de espiritualidade dos judeus até os dias atuais. Elas foram criadas provavelmente após a destruição do primeiro templo, por volta do ano 586 a.C., para ser um espaço de oração e de leitura das Escrituras. No tempo de Jesus, era o segundo lugar mais importante para o exercício da espiritualidade judaica, ficando atrás apenas do templo. Por essa razão, muitas vezes foi chamada de pequeno santuário.

No tempo de Jesus devia haver centenas delas espalhada por todo o território de Israel. Estima-se que só em Jerusalém houvesse cerca de 400 sinagogas. Para que surgisse uma sinagoga, era necessária a presença de pelo menos dez homens da fé judaica. Com a diáspora, esse costume também se espalhou nos lugares em que os judeus estabeleciam suas comunidades.

As sinagogas deveriam possuir três elementos essenciais: a urna para conter os livros sagrados, uma lâmpada acesa permanentemente como símbolo da instrução das Escrituras e o púlpito onde as Escrituras eram lidas. Os oradores da sinagoga eram rabinos que possuíam experiência no exercício de interpretação das Escrituras, que consistia nos livros da Torah (os livros da lei), nos livros poéticos (especialmente o de Salmos) e nos profetas.

As reuniões das sinagogas começavam com a recitação do shema: que é a referência a Deuteronômio 6.4: “Ouça, ó Israel: O Senhor, o nosso Deus, é o único Senhor”. A espiritualidade judaica compreendia que ali era o lugar do encontro com o sagrado, para ouvir o que Deus tem a falar.

Jesus demonstrou familiaridade com os hábitos das sinagogas e era tratado como rabi ou rabino, um mestre que podia falar durante os atos cerimoniais. Jesus também demonstrou que era uma pessoa letrada, conhecedora do idioma hebraico, que tinha condições de fazer leituras públicas a partir de traduções orais dos textos bíblicos, conhecidas como targuns. E que tinha autoridade para interpretar as Escrituras.

Isso nos leva a compreender que Jesus não rejeitou a religião, mas a ressignificou. A religião não é apenas um sistema de controle e de domínio, como uma estratégia de poder, embora ela tenha sido usada pelas estruturas de poder ao longo dos tempos – inclusive nos dias atuais. Ela é uma experiência humana de encontro consigo, que estimula a transcendência e a descoberta de si. Jesus tratou os espaços religiosos não mais como espaços de interdição, mas de transformação, de libertação e de construção de nossa humanidade.

Por essa razão, Jesus não se identifica com o homo religiosus de Mircea Eliade, mas com o humano, demasiadamente humano (conforme o título da obra de Nietzsche), como aquele que compreende que a vida toda é sagrada, que o humano está acima dos rituais e que a história é o tempo de construção de nossa existência.

Os evangelhos registram quatro momentos de Jesus discursando nas sinagogas: Marcos 1.21-27, correlato com Lucas 4.31-37; Marcos 3.1-6, correlato com Mateus 12.9-13; Lucas 4.16-22, correlato com Marcos 6.16 e Mateus 13.53-58; João 6.51-59. Em cada uma dessas ocasiões ele aproveitou para pregar sobre temas que estavam ligados à vivência humana, valorizando sempre a dignidade da pessoa, em detrimento do cerimonial.

A intimidade de Jesus com a sinagoga pode ser percebida em outras situações narradas nos evangelhos, como a cura da filha de Jairo, o chefe da sinagoga, em Marcos 5.21-43, Mateus 9.18-26 e Lucas 8.40-56. Para Jesus, a sinagoga era espaço de compartilhamento da boa notícia do amor de Deus (Mateus 4.23, Mateus 9.35, João 18.20), de cura para as dores humanas (Lucas 13.10-17), de construção de nossa identidade (Lucas 7.4-50), de confrontação com a religiosidade hipócrita (Mateus 6.2 e 5, João 12.42), de enfrentamento das formas de dominação (Marcos 12.39, Mateus 23.6, Lucas 11.43, Lucas 20.46, João 9.22) e de espaço de testemunho e martírio (Marcos 13.9, Mateus 10.17, Mateus 23.34, Lucas 4.24-30, Lucas 12.11, Lucas 21.12, João 16.2).

As comunidades cristãs primitivas procuraram reproduzir a experiência das sinagogas. Muitas vezes, igrejas cristãs nasceram a partir dos ensinos de Paulo nas sinagogas espalhadas pelo mundo greco-romano. Refletir sobre a experiência cristã nos espaços religiosos nos remete ao diálogo necessário entre religião e espiritualidade, vida religiosa e vida intramundana. Esse foi o exemplo deixado por Jesus.

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