“Então os judeus lhe perguntaram: ‘Que sinal miraculoso o senhor pode
mostrar-nos como prova da sua autoridade para fazer tudo isso?’” (João 2.18).
O evangelho de
João usa a palavra grega semeion para
se referir aos milagres realizados por Jesus. Normalmente, essa palavra é
traduzida como sinal, mas pode também significar um signo ou um símbolo. Como
sinal, corresponde a uma ocorrência dentro do fluxo natural das coisas, algo
que foge à normalidade para fazer com que as coisas voltem a seguir seu curso
em direção a um determinado propósito. Como signo, é uma marca, um registro ou
mesmo uma expressão que faz com que uma coisa ganhe repercussão, que possa se
distinguir de outras coisas. E como símbolo, é uma representação ou mesmo uma
demonstração de algo que é real, mas que não pode ser percebido e sua
totalidade.
Para os gregos
antigos, semeion poderia ser uma
marca que fazia com que algo se tornasse conhecido. Poderia ser também uma
comunicação divina, como um presságio. E ainda poderia ser relativo a gestos e
indicadores para uma determinada ação, tal como o começo de uma corrida ou
orientações para a batalha.
No evangelho
de João, no entanto, o uso dessa palavra se destina a responder duas grandes
perguntas feitas por quem quer conhecer Jesus. A primeira é: o que Jesus fez
para que ele se tornasse tão importante? A segunda é: por que Jesus realizou
esses sinais?
Em todo o
evangelho são relatados apenas sete desses sinais. São eles:
1. A transformação da água em vinho, em Caná,
João 2.1-10. (2)
2. A cura do filho do funcionário do rei,
João 4.46-54.
3. A cura do enfermo (paralítico) em Betesda,
João 5.1-9.
4. A multiplicação de pães e peixes, João
6.1-13.
5. Jesus caminhando sobre o mar da Galileia,
João 6.16-21.
6. A cura do cego de nascença, João 9.
7. A ressurreição de Lázaro, João 11, 1-46.
João
reconheceu que Jesus havia realizado muitas outras maravilhas e milagres, mas
os que foram relatados em seu evangelho seriam suficientes para que as pessoas
compreendessem quem era Jesus, sua missão e mensagem. Ele registrou: “Jesus realizou na presença dos seus
discípulos muitos outros sinais miraculosos, que não estão registrados neste
livro. Mas estes foram escritos para que vocês creiam que Jesus é o Cristo, o
Filho de Deus e, crendo, tenham vida em seu nome” (João 20.30-31). E disse mais: “Jesus fez também muitas outras coisas. Se
cada uma delas fosse escrita, penso que nem mesmo no mundo inteiro haveria
espaço suficiente para os livros que seriam escritos” (João 21.25).
O uso da expressão semeion por João revela uma preocupação teológica, visto que um
determinado sinal só pode ser entendido à luz de um sistema de significações.
Ferdinand de Saussure, por exemplo, ao referir-se ao signo linguístico, afirma
que um semeion está relacionado a um
significante e a um significado. Ou seja, possui uma representação, uma forma
material, que remete a uma compreensão, a uma ideia. Tem a função de comunicar
algo, constituindo-se numa realidade discursiva que precisa ser interpretada e
compreendida.
Esses sinais não acontecem aleatoriamente,
de forma desordenada, ao sabor das contingências da vida. Antes, eles se
inserem numa dinâmica maior, que culmina no sinal mais expressivo, que é o
relato da crucificação e ressurreição de Jesus. Quando Jesus apareceu
ressurreto aos seus discípulos mostrou-lhes os sinais em seu próprio corpo: “Tendo dito isso, mostrou-lhes as mãos e
o lado. Os discípulos alegraram-se quando viram o Senhor” (João 20.20).
Por essa razão, o evangelho de João pode ser
dividido em duas partes: o que podemos chamar de livro dos sinais, onde estão
relatados os milagres realizados por Jesus, acompanhados dos ensinamentos que
estão vinculados a eles; e o que podemos chamar de livro da paixão, com os relatos
da crucificação e ressurreição de Jesus.
Para João, se alguém quer conhecer Jesus,
deve observar a maneira como ele sinalizou sua graça entre os homens e a
maneira como ele consumou sua missão no mundo, assumindo todos os riscos até o
fim. Jesus encarnou a missão de tal modo que é na imagem do crucificado e do
ressuscitado que podemos ter acesso à graça divina, na qual toda a trindade
está implicada.
O fato de Jesus ter realizado sinais não
significava que ele seria aceito com facilidade nem que seu ensino seria melhor
compreendido. Jesus sempre esteve aberto à crítica, à avaliação e até à
rejeição. Seus ensinos e milagres apontam para a graça, mas crer ou não em
Jesus, acolher ou não a Jesus são atitudes que dependem de cada pessoa em sua
liberdade de escolha.
As pessoas não crerão em Jesus por causa de
um milagre, mas certamente serão notificadas de que a graça de Deus se
manifestou de alguma forma na vida. Jesus sinaliza ainda hoje sua presença
entre nós por meio dos atos de misericórdia e compaixão daqueles que já o
acolheram. Jesus chama seus seguidores para que sejam sinais de sua presença no
mundo, a fim de que as pessoas saibam que há esperança para o fim das aflições,
das injustiças e de todas as dores que angustiam a humanidade.
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