A
eleição de Donald Trump para a presidência da principal potência econômica
mundial é a vitória de uma tendência que pode ser verificada em várias partes
do mundo: a construção de um discurso populista de direita que rejeita as transformações
sociais e econômicas que o mundo vem experimentando. É a vitória de alguém que
tem desafiado os novos valores que vêm sendo construídos para dar conta de um mundo
mais solidário e plural. O discurso reacionário de ódio encontrou ressonância
em uma camada da população que teme sofrer perdas econômicas e de identidade com
tais mudanças.
A
sombra da tragédia de 11/9 desencadeou a explosão eleitoral do 9/11. O medo das
incertezas falou mais alto. Isso não é o fim do mundo. Mas sãos os sinais do
fim do mundo tal como o conhecemos até agora. O levantamento das forças de
extrema direita e conservadoras no mundo inteiro é uma consequência de algo
maior, que tem a ver com a crise pela qual o capitalismo global passa.
Uma
nova classe média que luta para sobreviver se sente ameaçada pelas mudanças de
valores e crescente transferências dos centros de poder. O que mais importou
nessas eleições não foi o programa de governo, mas o resgate da dignidade
perdida e a reafirmação dos valores tradicionais que estão ameaçados. A
campanha foi marcada por pronunciamentos inflamados, em que predominou o ódio e o descontentamento com ações mais à esquerda que vinham desagradando a um setor
da população pouco ouvido: a tal classe média.
O
eleitor de Trump é branco, de classe média e evangélico/protestante. Quem votou
em Trump tinha uma certa intencionalidade, que é de demonstrar que a maneira
como as mudanças vêm acontecendo provoca medo e insegurança. É preferível
aliar-se a alguém que tenha um discurso voltado pela defesa de valores
tradicionais e resgate da identidade nacional do que em alguém que simbolize
aquilo que provoca as incertezas deste tempo. Mesmo que seja alguém deplorável.
E foi o que aconteceu nas eleições norte-americanas: o eleitor conservador
votou em Trump, com seu discurso reacionário, e rejeitou Hillary, com seu
discurso da política do sistema vigente. Só a história julgará se esse ato foi
acertado.
Em
sintonia com os resultados da eleição norte-americana, acontecem outros
movimentos no mundo: a vitória da direita na Argentina, a resistência de
direita na Venezuela, o golpe jurídico-parlamentar no Brasil, a vitória do “não”
no referendo do acordo de paz na Colômbia, a crise dos refugiados, o fenômeno
do Brexit, o enfraquecimento da liderança de centro-esquerda na Alemanha, os
ataques terroristas na Europa, para citar alguns.
A
crise do capitalismo é global, mas os seus efeitos são localizados. O
capitalismo demonstra sinais de fracasso com o crescimento das desigualdades
sociais no mundo e a consequente concentração de renda. Daí as políticas internacionais
penderem entre o livre comércio e as práticas protecionistas, entre a garantia
do direito das minorias e o fortalecimento das ideias liberais, entre o
atendimento da necessidade dos mais vulneráveis e a construção de barreiras
para impedir o acesso aos centros de poder.
A
sociedade construída sob a égide do capitalismo vai ruindo aos poucos. O
conceito de estado nacional também vai demonstrando seu caráter autenticamente burguês e
liberal. O mundo é um grande navio à deriva em mar desconhecido. Os
instrumentos para retomar o rumo são complexos e as manobras para reorientar a
navegação são trabalhosas. E a gente vai descobrir logo, logo que isso não é
tarefa para um só. Porém, ainda vai levar um tempo para a tripulação entender
que estamos todos no mesmo barco, que o resgate dele depende do empenho e da
consciência de cada um (Foto: Larry Smith/EPA).
Gostei muito do texto, professor!
ResponderExcluirGostei muito do texto, professor!
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