segunda-feira, 29 de outubro de 2018

O golpe consolidado: eleição da extrema direita / The consolidation of the coup: election of the far right / El golpe consolidado: elección de la extrema derecha


O Brasil tem um novo presidente eleito. Jair Messias Bolsonaro é o 38° presidente da República, o oitavo desde o fim da ditadura, por ter conquistado 55,13% dos votos válidos, que corresponde a 47% dos votos totais numa eleição com recorde de ausências e votos brancos e nulos. Ele é militar da reserva, com a patente de capitão, e compôs a sua chapa com outro militar, o General da reserva Hamilton Mourão, seu vice-presidente. Curiosamente, é o 16° presidente militar do Brasil, sendo o terceiro eleito pelo voto direto e o primeiro após o fim da ditadura militar, regime pelo qual demonstra simpatia.
Sua eleição, no entanto, deve ser vista dentro de um espectro maior do que a evidente vitória nas urnas. Trata-se da eleição de um representante da extrema direita que faz parte de um processo de retomada do poder das forças oligárquicas que atuam no país. Sua chegada ao posto de mandatário da nação interrompe uma sucessão de quatro vitórias das forças progressistas e o avanço de ideias conservadoras que estão vinculadas a outros movimentos ultradireitistas que ocorrem no mundo.
A eleição de uma chapa militar em pleno exercício da democracia consolida o golpe engendrado pela elite para impedir a realização de uma proposta política voltada para os interesses das camadas menos favorecidas e das minorias. Pela primeira vez, assistimos a eleição de um candidato que obteve menos votos das pessoas de baixa renda e que recebeu críticas veementes de pessoas mais esclarecidas no Brasil e no mundo.
Veja alguns aspectos a serem ressaltados a respeito da vitória da extrema direita:
1. O avanço da extrema direita não é um fenômeno brasileiro, mas uma tendência mundial que vem preocupando lideranças e todas as partes, sobretudo nas grandes democracias.
2. Um novo modo de fazer política ganha projeção. A ausência de debate e discussão de projetos para o país, o apego a uma pauta moralista conservadora sem reflexão crítica e a afirmação de um inimigo comum foram as marcas da campanha eleitoral. A atitude acusatória, o moralismo e o antipetismo foram decisivos. Não se votou a favor de um projeto, mas contra um mal identificado, contra a ameaça do diferente e contra o partido que venceu as últimas eleições. Outro aspecto importante da campanha eleitoral foi o uso de redes sociais pela internet, com a disseminação das chamadas “fake news”, como estratégia.
3. A campanha eleitoral foi tensa, mas a eleição em si ocorreu em clima pacífico e ordeiro. O povo foi às urnas de forma consciente buscando votar naquilo que foi construído como alternativa para a solução dos problemas que mais lhe afligem diretamente.
4. O Partido dos Trabalhadores se confirmou como oposição. Era para o PT sair dessa eleição reduzido a pó. O golpe de 2016 tinha o objetivo de varrê-lo do mapa. Mas conseguiu formar a maior bancada da Câmara de Deputados, elegeu quatro governadores próprios e ainda cinco governadores aliados. Além disso, conseguiu um feito que a maioria achava impossível, que é reunir as forças de esquerda em torno de um projeto democrático.
5. A democracia se encontra profundamente ameaçada. Para se manter no poder após o golpe de 2016, a direita e o neoliberalismo se aliaram a um segmento ultradireitista e flertaram com um discurso extremista e radical, cuja inclinação aponta para o que historicamente identifica o fascismo.
Esses aspectos que ressalto aqui fazem com que a eleição 2018 represente um apelo para que a luta pelo Estado Democrático de Direito não esmoreça. A extrema direita e a direita não devem ver a eleição de Bolsonaro como uma conquista ufanista. Eles estão diante de duas missões impossíveis. A primeira, a de colocar em prática tudo aquilo que Bolsonaro disse que faria na campanha. A segunda é de atender a todas as demandas daqueles que o elegeram. Se ele não der conta dos seus desafios, perderá rapidamente a credibilidade que alcançou. Mas se partir para o endurecimento e para o regime de exceção anunciado em sua campanha, enfrentará dura oposição e resistência.
O papel da oposição também é difícil, que é o de oferecer o contraditório e o da resistência. Mas nem por isso é uma derrota, e sim uma nova maneira de encarar os desafios. Na eleição, a gente escolhe quem vai ser governo e quem vai ser oposição. A democracia não vive sem essas duas forças. Governo sem oposição é tirania. O Brasil vive de forma muito recente a sua maior experiência democrática. Há pouco mais de 30 anos, reconquistamos essa condição. Isso nos lembra que a luta por direitos, liberdade e justiça social é interminável. Só os que têm coragem e que desenvolvem esperança são capazes de enfrentá-la. Estamos começando uma nova etapa dessa caminhada e, para tanto, é preciso aproximar pessoas que tenham a capacidade de enfrentar corajosamente grandes desafios e de sonhar com uma nação mais justa. Não vamos nos afastar de nossa luta. Essa hora é de unirmos forças para sermos uma oposição consciente e responsável a tudo o que está por vir. Que Deus nos proteja e nos dê força para lutar. Vamos em frente.

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